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O remake de Resident Evil 4 não reinventa a roda, mantendo-se uma re-imaginação segura que nos relembra que a série é bem mais recheada de ação do que de horror.

Ainda não passaram bem 20 anos desde 2005, mas para lá caminhamos, e a verdade é que a minha memória de Resident Evil 4 original não é a melhor. Acrescentando ainda o facto de nunca ter tido propriamente curiosidade de o revisitar, receber um remake de Resident Evil 4 em 2023 foi uma experiência muito semelhante à que tive com o remake de Resident Evil 2 e 3, ou seja: um experiência de estreia.

Vou, por isso, poupar-vos de comparações ou análises profundas do que fez de diferente e do que poderia ter feito de igual, mas não vou afastar as minhas expectativas e alguns sentimentos porque, apesar de tudo, guardo alguma nostalgia e até saudades de um jogo que, noutra vida, joguei à vez com um amigo com quem fui partilhando um save guardado num cartão da PlayStation 2, que viajava nas nossas mochilas sempre que nos juntávamos após as aulas.

A ideia que tinha de Resident Evil 4 é que era um jogo muito assustador. As memórias do Regenetators sempre me assombraram como AS criaturas mais medonhas que encontrei num videojogo. E todo o primeiro ato do jogo, com Las Plagas a controlarem uma vila remota, criando um culto, eram mais ingredientes para material de pesadelos. Estas eram as duas coisas que mais me recordava de Resident Evil 4 original. Em cima disso, os dois remakes de RE2 e 3 (que apesar de tudo são jogos bastante sólidos no que toca ao horror) e RE7 e RE:Village fizeram-me largar os comandos por mais vezes do que quero admitir. A cama estava assim feita, para que tivesse de ganhar alguma coragem para ultrapassar os desafios do remake de Resident Evil 4. No entanto, contra algumas destas expectativas, não foi necessário estar assim tão ansioso, porque encontrei um jogo menos assustador, porém mais divertido do que estava à espera.


A história de Resident Evil 4 acompanha Leon, que conhecemos em Resident Evil 2, agora tornado agente especial, que é enviado para uma zona rural em Espanha para resgatar a filha do presidente dos Estados Unidos da América. Ao chegar, depara-se que esta não é uma simples missão de resgate – é também uma missão de investigação de uma seita misteriosa, onde todos os habitantes da região estão infetados com uma nova mutação do T-Vírus, responsável pelo início de um Apocalipse em Racoon City (os eventos de Resident Evil 2 e 3).

Com uma campanha bem sólida e com uma longevidade muito maior que a dos dois remakes anteriores, Resident Evil 4 é um jogo bastante satisfatório e variado, apesar de ser consistentemente o mesmo jogo do início ao fim – um TPS de ação, exploração e sobrevivência. Se procuram um jogo com o mesmo impacto na indústria dos videojogos como o original teve, não é neste remake que vão encontrar isso. Vão, no entanto, encontrar uma excelente modernização, com um jogo que, para todos os efeitos, se sente bastante atual, graças a um incrível uso do RE:Engine da Capcom, ao reproduzir personagens e ambientes com um detalhe fantástico, suportado por um trabalho – também ele fantástico – da direção artística do jogo.

Ao longo de 16 capítulos, visitamos vilas, pântanos e lagos parados no tempo habitados por populações com forquilhas e foices; castelos góticos controlados por um pequeno ditador e o seu culto de infetados; laboratórios com medonhas experiências e soldados ainda mais infetados; minas com insetos e complexos militares/científicos… Variedade de ambientes não falta para cativar a nossa vontade de continuar a jogar ou a re-explorar cada uma das áreas em busca de tesouros deixados para trás, entre atalhos e caminhos posteriormente desbloqueados que, por vezes, se populam novamente com inimigos.

Já no que toca à variedade de inimigos, esta parece ser mais comedida, em particular nas personagens humanoides, que, apesar dos seus trajes e características visuais, acabam por ser praticamente todos do mesmo tipo, ou acabam por requerer o mesmo tipo de estratégia de combate, seja a velhinha da vila com a foice ou o soldado atrás de uma torreta. No entanto, é em número, e quando misturados com outros inimigos, que a nossa estratégia ganha profundidade, obrigando-nos a pensar rápido, gerindo os recursos que temos com cuidado e explorando o cenário, por vezes enquanto fugimos, em busca de pontos de vantagem ou recursos escondidos.

A jogabilidade de Resident Evil 4 é uma natural, mas muito subtil, evolução do que encontrámos nos remakes de Resident Evil 2 e 3. Para trás ficaram os tank controls do original, agora com um Leon mais ágil, capaz de disparar e recarregar enquanto se move, de defletir ataques e de fazer incríveis takedowns. É uma jogabilidade bem mais modernizada e fluída, adaptada às sensibilidades atuais, mas também à componente de “survival” e ao design deste capitulo.

Se, em RE:2 e RE:3, os jogos giravam muito à volta da resolução de puzzles e desbloqueio de atalhos por vezes aos círculos, com itens, armas e outros elementos em quantidades muito limitadas e contadas, em Resident Evil 4 – porque é um jogo mais expansivo e até linear -, munições e outros recursos não são só mais abundantes, como a sua aparição é mais aleatória, algo que podemos até definir com acessórios que nos dão a probabilidade de encontrar X% mais munições ou ervas nas nossas aventuras, com diferentes graus de prioridade. O que se mantém limitado e nos incentiva à exploração são os itens chave, tesouros e joias que nos permitem trocar por créditos e acessórios para desbloquear, num sistema que se torna num sub-jogo por si só, ao obrigar o jogador a decidir o que quer vender ou quando quer vender, para poder aumentar e/ou atualizar o seu arsenal ao longo de todo o jogo.

A qualidade de jogo de horror, com tensão e o constante medo de “perder”, e a qualidade de jogo de ação, entrando a matar, são definidas pela qualidade de “jogo de sobrevivência” de Resident Evil 4. Isto é, quanto mais recursos temos ao nosso dispor, menor acaba por ser o risco. E nesse aspeto, Resident Evil 4 é um jogo, na minha opinião, bem mais inclinado para a segunda definição, especialmente a partir de meio. Sinto que o jogo foi-me bastante generoso em recursos, deixando-me confortável na exploração e ao regressar a pontos anteriores de um mapa interligado, combatendo contra mais inimigos reposicionados. Aumentando a dificuldade, essa componente equilibra-se com inimigos mais rijos (na prática, mais esponja-de-balas) e recursos mais escassos para o tipo de jogador que sou, com um nível de diversão relativamente mais baixo. Ao todo, existem quatro dificuldades, Assisted, Standard, Hardcore e Professional – desbloqueada no fim da primeira vez que se completa o jogo), tornando o jogo acessível e desafiante para qualquer tipo de jogador.


Outro elemento que torna Resident Evil 4 num jogo mais a tender para a ação é o seu tom e a direção, com Leon e outras personagens a comportarem-se como super-pessoas, a citarem dezenas de one-liners, com clichés atrás de clichés e muita leveza nas interações de personagens, apesar do estado de melancolia e de terror das situações propostas. Tudo isto acrescenta charme ao jogo, não se deixando levar muito a sério, mantendo o tom característico de algo saído do início dos anos 2000 (quando os videojogos não se pareciam tanto com live-actions) e não caindo na tentação de um “gritty remake”.

Tecnicamente, Resident Evil 4 não é um show-off geracional nem causa o mesmo impacto que, se calhar, os dois jogos anteriores o fizeram na PlayStation 4 e Xbox One, mas, como indiquei em cima, é extremamente sólido e polido. Tive a oportunidade de jogar a versão da Xbox Series X, onde o jogo apresenta diferentes opções: Resolução e Desempenho, com ambas a oferecerem a possibilidade de ligar o Ray-Tracing, que habilita o uso de reflexos realistas em algumas superfícies refletoras, como corpos de água. Ao longo da minha aventura, optei por jogar em Desempenho com Ray-Tracing ligado, e a minha experiência foi ótima, com um jogo que, apesar de não atingir os “doces” 60FPS, nunca me fez pensar em quebras de fluidez.

No entanto, as primeiras horas foram de luta e habituação com os controlos. Comparando com a versão Demo da PlayStation 5, na Xbox Series X o jogo apresentou-se um pouco mais pesado, com a nossa personagem e câmara a reagirem apenas com movimentos mais agressivos dos analógicos, pela existência de uma “deadzone”. Isto resulta num sistema de mira menos preciso e mais caótico, que me impediram/tornou difícil cumprir alguns desafios, como as provas de tiro. Felizmente, com háqbito e bem imerso na experiência do jogo, essa sensação de peso acabou por não se manter tão observável, apesar de continuar nesta versão do jogo.

Resident Evil 4 é, na soma das suas partes, um jogo extremamente divertido e muito sólido. Para além da história principal, com uma duração de cerca de 10-12 horas, não faltam razões para o revisitar, desbloqueando o arsenal, apostando nas atividades secundárias ou experimentando com diferentes níveis de dificuldade que oferecem uma “replayability” bem mais interessante, para mim, que speed-runs em títulos anteriores.

Após mais uma sólida, mas segura, re-imaginação de um Resident Evil, aguardo com entusiasmo em revisitar o 5, que foi o meu contacto mais a sério com a série, ou até do infame 6 – onde vamos perceber se estava mesmo nos planos da Capcom tornar Resident Evil numa franquia tresloucada e de origens modestas como é, por exemplo, um Fast and Furious.

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Cópia para análise (versão Xbox Series X) cedida pela Ecoplay.

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