Crítica – Spider-Man: Across the Spider-Verse

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Spider-Man: Across the Spider-Verse é o epítome de animação incrivelmente detalhada, belissimamente única e inegavelmente épica dentro deste meio.

Independentemente das razões, sempre que perco um novo filme tendo a olhar para a situação de uma perspetiva positiva. Em 2018, por exemplo, não consegui assistir a Spider-Man: Into the Spider-Verse na semana de estreia e, com o decorrer do ano e com a quantidade incessante de novas obras, assim como a “correria” em que o mundo da crítica consiste, acabei por adiar para a altura da inevitável sequela. Pois bem, eis que chegou o dia de Spider-Man: Across the Spider-Verse, a primeira de duas partes que irão completar a jornada de Miles Morales (Shameik Moore).

Tanto um filme como o outro obtiveram uma receção altamente positiva, ao ponto de muitos espetadores colocarem ambos como as melhores adaptações cinematográficas do aranhiço alguma vez vistas. Quaisquer reações extremas à saída do cinema são para se levar com alguma desconfiança – todos nós já passamos por esse momento de entusiasmo elevado para depois, após tempo para processar tudo o que vimos, oferecermos uma opinião mais honesta com aquilo que realmente pensamos e sentimos – mas a verdade é que a saga Spider-Verse merece esse tipo de elogios megalómanos.

Pessoalmente, nunca contestarei quem refira qualquer um destes filmes de animação como o seu filme de Spider-Man favorito, tal como o nunca farei com os dois primeiros de Sam Raimi nem com No Way Home – é o que dá termos tantas adaptações extraordinárias. Mudando agora o foco para a saga de animação em questão, possuo praticamente os mesmos inúmeros elogios e pouquíssimas críticas a ambos os filmes. Dito isto, é impossível não abordar a qualidade incomparavelmente complexa, verdadeiramente deslumbrante e genuinamente impressionante da animação em si.

spider man across the spider verse echo boomer 3

Centenas de artistas visuais e animadores trabalharam juntos para criarem autênticas obras de arte. É difícil escapar à hipérbole, mas todos os segundos de Into the Spider-Verse e Across the Spider-Verse podem ser individualmente emoldurados e colocados num museu exclusivo de pinturas de deixar o queixo caído. São dezenas de milhares de ilustrações belíssimas, com imensos estilos diferentes e tematicamente ricos. A quantidade de informação visual em cada frame é tal que são necessárias múltiplas visualizações para se conseguir apanhar todos os pormenores detalhados nos quatro cantos da imagem.

Sinceramente, chega a ser bastante avassalador, o que para alguns espetadores poderá ser o equivalente de demasiado caos. Se Into the Spider-Verse já pede olhos bem apurados, Across the Spider-Verse quase que obriga a que seja assistido com companhia para se dividir o trabalho de compreensão visual e narrativo. Neste último filme, a complexidade destes dois componentes de storytelling aumenta imenso, possuindo mais personagens, mais enredos secundários essenciais para a narrativa principal, mais universos, mais estilos de animação…

De forma algo milagrosa, Phil Lord & Christopher Miller (The LEGO Movie) e David Callaham (Shang-Chi and the Legend of the Ten Rings) conseguem estruturar o argumento de maneira incrivelmente eficiente, guardando momentos de verdadeira surpresa através de desenvolvimentos de personagem e revelações chocantes, apesar do balanço entre o ritmo energético e a duração épica da sequela não se encontrar tão equilibrado como no original – o segundo ato demora o seu tempo. Visualmente, existem também pequenos momentos difíceis de acompanhar, mas isto já são pormenores que, no fim de tudo, acabam por ter muito pouco impacto na desfrutação da obra.

Outra execução igualmente milagrosa é a capacidade genial dos argumentistas em irem buscar pontos de enredo do original e brilhantemente expandi-los sem criarem inconsistências narrativas nem levantarem questões problemáticas sobre certas personagens. Across the Spider-Verse mergulha bem fundo no multiverso, contendo literalmente centenas de cameos de Spider-Mans, algo que deixará fãs mais conhecedores das bandas desenhadas em êxtase total. A nível de entretenimento e fan-service, esta sequela consegue atingir o balanço exímio entre manter um foco temático interessante simultaneamente com sequências de ação carregadas de adrenalina e referências à fonte original.

O número de camadas narrativas e arcos de personagem profundos é o que separa os dois filmes da saga, sendo que Across the Spider-Verse é incomparavelmente mais complexo que o o original. No entanto, os temas mantêm-se idênticos, sendo que a jornada de auto-descoberta de Miles continua a tomar as rédeas da história global. Tópicos como a parentalidade e destino são abordados, mas é o estudo sobre o que significa ser herói ou vilão que realmente cativou a minha atenção nesta sequela repleta de enredos emocionalmente poderosos.

spider man across the spider verse echo boomer 2

Os realizadores Joaquim Dos Santos (Into the Spider-Verse), Kemp Powers (Soul) e Justin K. Thompson (estreia) jogam com a facilidade com que espetadores espetam rótulos nas personagens mal estas aparecem no ecrã, misturando caraterísticas normalmente associadas a um arquétipo com o oposto ao ponto de, a partir de determinada altura, ser impossível fazer distinção de cada papel. Across the Spider-Verse contém uma panóplia de motivações compreensíveis e relacionáveis para um grupo gigante de personagens importantes, criando uma conexão forte com a audiência que, assim, se sente cativada com todas as cenas ao longo do filme devido ao facto de se importarem com todos.

Pessoalmente, o arco de Gwen Stacy (Hailee Steinfeld) foi o que mais me fascinou, sendo a personagem com maior ligação a todos os temas do filme. Verdade seja dita, o facto de serem todos Spider-Man/Spider-Woman faz com que os eventos essenciais e definidores de personagem sejam comuns entre todos – algo que até se torna num ponto de enredo crucial -, mas tanto o universo de Gwen como os seus conflitos emocionais sobressaem. Miles mantém-se como um protagonista igualmente interessante, seguindo uma história coming-of-age previsível, mas que confronta as ideologias por detrás do conceito de um super-herói.

Existem muitas personagens novas e outras já conhecidas, mas seria difícil falar sobre as mesmas sem recorrer a spoilers menores. No entanto, posso referir que Oscar Isaac (Miguel O’Hara), Jake Johnson (Peter B. Parker), Issa Rae (Jessica Drew) e Daniel Kaluuya (Hobie) destacam-se. Uns através de momentos mais cómicos, outros através das sequências de ação de arregalar os olhos – desafio os espetadores a encontrarem-se uma obra de animação com cores mais vivas que esta -, mas todos com direito a diálogos bem dramáticos. É a primeira parte de duas – conhecimento público prévio, mas a sequela deixa isso claro para os mais distraídos -, logo teremos de esperar por Beyond the Spider-Verse para tirar algumas conclusões.

Tal como referido no início, não tenho grandes problemas com Across the Spider-Verse. Para além dos mencionados ao longo do artigo, o único que sobra é um daqueles aspetos tecnicamente maravilhosos e merecedores de prémios, mas que não consigo negar um fator negativo na desfrutação da obra. Neste caso, o problema prende-se mais com o universo de Gwen, se bem que acontece um pouco por todo o filme. O estilo de animação do mundo da Spider-Woman é visualmente arrebatador, mas altera literalmente tudo no ecrã a cada novo frame. Desde fundos às cores, tanto à volta como nas personagens, a constante mudança torna-se um fator altamente distrativo e desvia a atenção daquilo que realmente é importante.

Elogio final para a banda sonora fantástica de Daniel Pemberton (Enola Holmes 2). Se há aspeto que absolutamente ninguém pode criticar negativamente é a sinfonia do compositor. Desde as escolhas de canções à música de fundo em si, não existem sequências ao longo das 2h20 que não sejam, de alguma forma, elevadas pela banda sonora memoravelmente épica. Os momentos em crescendo transformam build-ups em autênticas montanhas-russas de emoção, especialmente devido à natureza do terceiro ato e do fim do filme.

VEREDITO

Spider-Man: Across the Spider-Verse é o epítome de animação incrivelmente detalhada, belissimamente única e inegavelmente épica dentro deste meio. Não importa a opinião sobre o filme em si, todos os cinéfilos devem fazer uma vénia aos artistas e animadores ridiculamente talentosos por detrás desta pura obra de arte. Dito isto, os atributos e defeitos são praticamente os mesmos do original.

Os vários estilos de animação chegam a ser avassaladoramente deslumbrantes, mas também ao ponto de criarem momentos mais confusos. Gwen Stacy destaca-se do resto do grupo – tanto a personagem como Hailee Steinfeld -, mas todos os que aparecem no grande ecrã são impressionantemente cativantes. Elenco de voz é soberbo de uma ponta à outra. Uma história inacabada – relembrem-se, esta é a primeira de duas partes – sobre o que realmente significa ser um herói. As 2h20 não se sentem propriamente, mas a necessidade de recorrer a cenas de exposição é mais frequente que no filme anterior, apesar da complexidade narrativa o justificar.

Obrigatório ver no cinema! Vão apoiar animação!

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