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Uma abordagem diferente e interessante ao género roguelike que poderá influenciar novos projetos no futuro.

Talvez seja uma forma muito cruel de ver o estado atual dos videojogos quando digo que lançamentos como Loot River só terão impacto anos depois da sua estreia. Não é a minha intenção ir contra a receção positiva do título da straka.studio, que se mantém atualmente numa nota num positiva nos vários agregadores digitais, mas sim analisar a forma como estes projetos, que se arriscam a enfrentar as convenções do género, acabam por ficar longe de um público que virá, anos depois, a enaltecê-los como pioneiros de novas experiências nos videojogos. Loot River não é um jogo perfeito, mas é o primeiro de uma onda crescente que se predispõe a tornar o familiar em estranho e em questionar mecânicas e funcionalidades tão enraizadas na nossa forma de pensar e jogar, como a própria movimentação num videojogo.

Loot River é um roguelike, joga-se como um roguelike, assemelha-se a um roguelike e até arrisco-me a dizer que soa a um roguelike. Existem aproximações ao género soulslike, mas a sua experiência assente no recomeço e na progressão temporária estão demasiado presentes para vermos Loot River como um simples RPG de ação com foco na exploração. A aventura divide-se por zonas distintas, que dão vida a este mundo construído sobre um rio eterno – que se pinta em pixel art e numa mescla de estilos visuais -, onde temos de navegar níveis repletos de inimigos intimidantes e bosses que procuram colocar um ponto final à nossa viagem. Durante a campanha, temos acesso a novos equipamentos, magias e outras vantagens que encontramos em Sanctuary, a nossa base, que podemos visitar entre zonas ou quando somos derrotados.

Como seria de esperar, a progressão é dividida em duas partes: a temporária, onde podemos evoluir os níveis da nossa personagem e colecionar novas armas ao longo da campanha, e a passiva, onde podemos desbloquear magias e equipamentos que ficarão disponíveis nas próximas tentativas. Sanctuary cresce ao longo da campanha, novas personagens e lojas surgem à medida que perdemos e retomamos à estaca zero, com as novas opções a surgirem como indispensáveis à nossa vitória. Como tudo reverte a éter, é preciso aproveitar as visitas entre zonas para desbloquearmos novo armamento e habilidades ativas para a personagem. É uma corrida constante pelas próximas tentativas, que nos ajudarão a chegar cada vez mais longe. Como disse, Loot River não podia ser mais roguelike do que já é e posso ainda apontar para o combate lento, assente na distância e no controlo de inimigos, e para o design procedural das zonas que visitamos.

Tal como ScourgeBringer, que analisei recentemente, Loot River não quis apenas seguir os moldes do género, mas sim desafiá-los. Neste caso, encontramos uma nova forma de movimentação em jogo, que se divide entre o controlo da nossa personagem e a possibilidade de movermos as plataformas que encontramos nos níveis. Como o mundo se constrói sobre um longo rio, o nosso método de movimentação resume-se a estas plataformas, que podem ser de madeira ou até de pedra, com vários padrões e utilidades que precisamos de conciliar para criar caminhos que nos levem até ao final de cada etapa. As plataformas podem ser movimentadas em qualquer direção desde que exista espaço para passarem, o que significa que podemos iniciar um combate e mover-nos rapidamente noutra direção se o confronto for demasiado para nós, tal como descobrir novos caminhos para um tesouro escondido ou surpreendermos os nossos adversários pelo flanco.

O período de habituação é muito mais curto do que possam estar à espera e torna-se quase natural movimentar as plataformas com o analógico direito, à medida que controlamos a personagem com o esquerdo. O que é preciso aprenderem não é a mecânica em si, mas sim todo o seu potencial dentro e fora de combate. A straka.studio fez um excelente trabalho de progressão e implementação dos vários elementos associados ao controlo das plataformas, com cada zona a adicionar uma nova funcionalidade que podemos explorar livremente e conhecer melhor. Se na primeira zona temos à nossa disposição plataformas de madeira, na segunda, encontramos objetos de pedra, muros e portas – que limitam a nossa passagem entre plataformas, o que nos obriga a pensar melhor no seu posicionamento em campo -, mas também escadas e plataformas elevadas que exigem um pensamento mais tridimensional para conseguirmos progredirmos. É um mundo tão visceral, como mental, no sentido em que encontramos zonas onde é essencial dominar a movimentação das plataformas para conseguirmos criar caminhos seguros, mas também estratégias mais vantajosas para a nossa personagem.

Loot River não se fica pela adição de tipos diferentes de plataformas e abraça a sua jogabilidade emergente ao longo dos vários cenários de combate e exploração que apresenta. Falo em jogabilidade emergente porque dá aos jogadores todos os utensílios necessários para jogarem à sua maneira e descobrirem novas táticas e mecânicas sem grandes imposições. Por exemplo, Loot River apresenta funcionalidades sistémicas ao permitir que uma plataforma de madeira arda quando ativamos uma armadilha de fogo, obrigando-nos a recuar e a procurar um local seguro. No entanto, o fogo propaga-se se estiverem em contacto com a plataforma afetada e é necessário isolarmos a zona afetada se quisermos parar o fogo que se alastra. Outro exemplo, ainda que mais simples, é a forma como podemos abordar os combates e as hordas de inimigos. Com as plataformas temos a possibilidade de dividir os grupos de inimigos e transportá-los para diferentes partes do cenário ou então enfrentá-los numa plataforma mais curta, mas sem a distração de outros inimigos. Com novas armas, como lanças – que têm um maior alcance – e até magias, estes sistemas ganham vida e tornam-se mais presente à medida que o jogo nos desafia com elementos inesperados, mas igualmente emergentes.

Como se trata de um projeto que procura inovar, não é de estranhar que existam ainda problemas que precisam de ser resolvidos – talvez pela straka.studio, talvez por outra produtora que assuma a missão de continuar esta busca por novas mecânicas nos roguelikes. O combate acaba por ser o elemento mais desinteressante de Loot River, nomeadamente pela sua velocidade lenta e combinações básicas, que contrastam demasiado com a IA muito limitada dos inimigos – cuja estratégia resume-se a seguirem os jogadores e a repetirem os mesmos ataques sem grande discernimento. Os níveis procedurais também podem ser complicados de gerir porque nem sempre são interessantes no seu design e nas suas abordagens. Loot River tem um sistema de movimentação tão empolgante que fico a pensar se não seria mais intrigante ter níveis curados e desenhados à mão do que deixar o seu design dependente da aleatoriedade, até porque encontrei momentos onde bugs não me permitiam movimentar plataformas ou ficava sem solução para os puzzles ambientais.

Neste momento, Loot River está disponível no Xbox Game Pass, naquele que é o serviço de subscrição mais acessível e popular da indústria dos videojogos, mas a discussão parece estar a passar ao lado deste curioso roguelike. Estamos a falar de uma época onde não existem novidades de peso ou lançamentos AAA que consomem a atenção da indústria e dos jogadores. Ainda assim, num cenário perfeito, meses depois de Elden Ring abrir o apetite de um público mais aberto a experiências assentes na dificuldade, Loot River parece ficar à parte dos lançamentos das últimas semanas. É uma infelicidade, mas também um sinal do que ainda está por vir.

Apesar dos seus problemas, deixo-vos com uma previsão, que se tornará real com a justiça que só a indústria dos videojogos é capaz de proporcionar em retrospetiva: Loot River será enaltecido como um jogo de culto, algures entre vídeos de YouTube e artigos de críticos e jornalistas que encontrarão finalmente este curioso roguelike. Assim é a vida de quem ousa contestar as regras do jogo.

Cópia para análise (versão Xbox Series X) cedida pela Plan of Attack.

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