Reportagem: Caminhos do Ferro 2018 – Domingo (22/04/2018)

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Após o dia culturalmente rico e poético de sábado, as atividades diurnas do Caminhos do Ferro no domingo, dia 22 de abril, foram mais dedicadas às famílias e às crianças.

Começamos a vida a baloiçar. Mesmo antes de existirmos, baloiçamos… Na imaginação dos nossos pais. É com esta premissa que surge, em palco, a simbolização de uma mulher grávida, que carrega em si o mais belo milagre da vida. Estamos em plena oficina de música e movimento para bebés “Baloiçar”, numa pequena encenação para bebés entre os 4 e os 36 meses, criado pela Associação Cultural Quinto Palco.

Duas mulheres – mãe e filha – dançam e expressam-se em palco de forma harmoniosa, percorrendo juntas as primeiras fases da vida, numa simbiose perfeita e num processo de descoberta mútua e em conjunto – afinal, os pais também aprendem muito com os filhos!

Descoberta é a palavra de ordem nos primeiros anos das nossas vidas. Ainda assim, mesmo quando queres partir à descoberta e até à aventura, a proteção e colo da mãe vão estar sempre ali, para te baloiçar. Parte à descoberta do mar, das florestas, do mundo, da vida, mas “nunca vais deixar de baloiçar” – é esta a mensagem reconfortante que é passada com este espetáculo, ao qual os bebés, (a mais doce e ternurenta audiência!) estiveram sempre muito atentos, com aquele olhar só deles, com aquela inocência e entusiasmo de quem está a observar e desvendar o mundo pela primeira vez, numa beleza irrepetível que só a inocência de quem é criança consegue expressar. Afinal, quem disse que os bebés só comem, dormem e choram? Muito pelo contrário, são exímios em responder aos mais variados estímulos, e disso tivemos prova viva com a envolvência destes bebés ao longo desta viagem.

No final da peça, as mães foram convidadas a colocar os seus rebentos em cavalos de madeira e… baloiçar.

Caminhos de Ferro Echo Boomer 10

O almoço fez-se novamente n’Os Pezinhos no Rio. A ementa mudou, mas o atendimento, o ambiente e a paisagem voltaram a ser fantásticos – num verdadeiro dia de verão, em que o sol nos brindou com os seus raios de sol esplendorosos.

À tarde, a casa do povo de Montalvo recebeu a companhia Teatro Praga, com um cenário muito pouco convencional – uma mesa com ingredientes para fazer um bolo, ainda que a peça anunciada se chamasse “Romeu e Julieta”. Mas, afinal, o que tem uma história tão trágica a ver com um bolo?!

A pensar no público dos mais pequenos – mas pertinente tanto para miúdos como para graúdos – Cláudia Jardim e Diogo Bento (atores) recontam a clássica e trágica peça de William Shakespeare, “Romeu e Julieta”, em moldes mais leves e pejados de ironia e humor. Com recurso a ingredientes tão básicos como manteiga, açúcar, bolachas, ovos, cada um representando uma personagem, assim se foi contando a história e fazendo um bolo – uma tragédia transformada em comédia. Mas não foi pelo facto de aligeirar um drama que foi descurada a componente educativa. Ao longo de toda a peça, foi transmitida de forma consistente uma mensagem de inclusão, essencial para libertar as mentes dos mais pequenos em relação a preconceitos de género e de igualdade. Só o facto de Cláudia estar vestida de azul e Diogo vestido de cor-de-rosa veio desafiar o status quo e a ideia de que existem cores próprias para cada género. Porque é que as meninas têm de usar rosa e os meninos têm de usar azul? Enquanto contavam a história de Romeu e Julieta ao preparar um bolo, os atores estiverem sempre a interagir com as crianças, a puxar por elas, questionando-as, obrigando-as a refletir.

Em entrevista ao Echo Boomer, Cláudia refere que a ideia de incluir estas mensagens de tolerância surgiu do facto da história original ser imprópria para crianças – tais como duas crianças que se casam e acabam por se suicidar. Para além disto, Julieta é retratada como sendo um objeto, um “joguete”, havendo lugar (e como era típico da época) a uma apropriação da mulher. Os atores viram aqui uma oportunidade para abordar temas tão pertinentes como a igualdade e identidade de género – pelas próprias palavras de Cláudia, “afinal, o que é isso de ser homem, ou mulher, ou qualquer coisa no meio, e todos estes preconceitos que se criam com a ideia de que o cor-de-rosa é para as meninas, e que os rapazes brincam com carros (…) que é uma coisa que, para nós, não faz sentido”. A provocação é propositada, sendo que, num dos espetáculos anteriores, uma mãe chegou mesmo a interromper o decorrer da cena, questionando “mas vocês estão a pôr em causa tudo o que está estabelecido desde o tempo de Adão e Eva?”. Cláudia e Diogo confessam que gostam deste tipo de reação, provocando-as deliberadamente, não tendo qualquer tipo de receio das mesmas, visto que o objetivo é mesmo falar abertamente sobre estes temas, para que cause debate e reflexão.

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E se ainda estão a perguntar o que, afinal, tem um bolo a ver com uma peça de teatro com uma história dramática com um final infeliz, aconselha-se a visualização da mesma (datas no site oficial) – é daqueles casos que só ver para crer (e compreender). Ao contrário do final da história original, o final deste espetáculo teve um final bem mais feliz (e doce), com a conclusão de dois bolos cheesecake homónimos da história, “Romeu e Julieta”, bem como com a oferta uma fatia para cada espetador!

Uma tarde que se fazia sentir de verão convidou-nos a apreciar o movimento tranquilo da Praça Central de Tomar, seguido de jantar no restaurante O Jardim. Uma vez mais – como Castello Branco tem razão! – nada deixou a desejar em termos de qualidade e quantidade gastronómica. Afinal, gastronomia também é uma forma de arte!

E para terminar esta caminhada tão especial, a última paragem foi mesmo em frente a um palco ao qual subiram os Gaiteiros de Lisboa.

Vindos de Lisboa, pertencem a Portugal inteiro, numa onda de reciclagem da música tradicional portuguesa. Vão ainda além-fronteiras, levando a sua sonoridade única para o mundo inteiro, num projeto que é já internacional. Foi na cidade templária que, em plena Praça da República, os Caminhos do Ferro receberam este grupo, que proporcionou ao seu público um concerto irreverente e enérgico. A riqueza harmónica é uma constante nas atuações dos Gaiteiros de Lisboa, e esta não foi exceção – com recurso a variados instrumentos, tais como o crótalo, a trompa, a sanfona e a gaita-de-foles, entre outros instrumentos de repercursão. “Chamateia”, “Chama Rita”, “Sapateia”, ou “Romance Da Lhoba / Romance da Loba” (interpretado em mirandês) foram alguns dos destaques deste concerto, não descurando um dos mais reconhecidos temas, “Roncos do Diabo”.

E foi assim que nos despedimos desta viagem, que tantos passageiros juntou, de todas as gerações – e que certamente os fez voltar para as suas casas com um sorriso no coração e vontade de repetir!


 

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