Crítica – Leave the World Behind

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Leave the World Behind entrelaça de maneira elaborada a habilidade técnica de Sam Esmail com o instigante material de origem de Rumaan Alam.

Como autêntico fã da narrativa elaborada de Sam Esmail e do seu talento excecional por trás da câmara, a perspetiva de assistir a uma longa-metragem situada num cenário apocalíptico escrita e realizada pelo próprio alimentou o meu entusiasmo. O filme conta uma história de laços familiares testados por uma crise iminente, explorando as profundezas das relações humanas no contexto de um mundo em colapso.

A premissa não foge ao comum dentro do género: Amanda (Julia Roberts) e Clay (Ethan Hawke) levam os seus dois filhos, Rose (Farrah Mackenzie) e Archie (Charlie Evans), para umas férias de família em Long Island, que rapidamente tomam um rumo surreal quando estranhos inesperados, George H. Scott (Mahershala Ali) e a sua filha Ruth (Miha’la), irrompem com notícias de um apagão geral misterioso. As famílias encontram-se assim numa narrativa envolvente, forçadas a confrontar as tensões de um mundo gradualmente sucumbindo ao caos.

A adaptação de Esmail afasta-se parcialmente da fonte original de Alam, transformando Leave the World Behind num thriller apocalíptico mais direto, embora mantenha o seu foco temático. O cineasta introduz várias sequências explícitas explicando o que está a acontecer sem cair na armadilha da exposição preguiçosa ou desrespeito pelo público, contribuindo ultimamente para níveis mais acentuados de intriga e entretenimento. Apesar de alguns desvios entrarem em território cliché e aderirem a fórmulas típicas de “fim do mundo”, Esmail consegue encontrar um equilíbrio louvável. As personagens carregam os temas centrais da história, com a obra a explorar como estas navegam pelas complexidades da dinâmica familiar, questões sociais e as incertezas apresentadas pela crise. Os seus passados, personalidades e decisões servem como veículos para explorar os temas mais amplos do filme.

Portanto, Leave the World Behind é realmente definido pela sua riqueza temática. A exploração de como indivíduos e famílias lidam com o desconhecido torna-se num quadro para ilustrar o impacto profundo do medo e da incerteza no comportamento humano em tempos de emergência. Em essência, é um estudo psicológico, utilizando as personagens como instrumentos para dissecar as formas multifacetadas como o medo pode moldar e definir a condição humana. O ambiente de fundo serve como uma lente através da qual o filme escrutina a força e fragilidade das relações familiares, desnudando as vulnerabilidades dentro dessas afinidades, enfatizando a sua resiliência diante da adversidade, mas também reconhecendo as fissuras que podem surgir sob o peso do que se desconhece.

Leave the World Behind também serve de espelho para a nossa cultura atual. A análise da extrema dependência tecnológica ressoa como um comentário oportuno sobre o seu papel quase omnipresente nas nossas vidas. A dependência das personagens em dispositivos de informação e comunicação não apenas destaca a momentânea da crise, mas também expõe a ansiedade avassaladora que decorre dessa conexão viciante. A desconfiança social é mais uma camada descascada, revelando as fraturas nos laços humanos. Esmail exemplifica perfeitamente a postura reativa com a qual as pessoas lidam com pontos de vista diferentes, destacando a natureza polarizada de qualquer debate no mundo atual. Todos estes temas fundem-se para, de forma conclusiva e surpreendentemente óbvia, transmitir uma mensagem bastante simples e cautelar sobre a fragilidade das conexões humanas quando confrontadas com ameaças existenciais, levando a um mundo que está inevitavelmente destinado a se auto-destruir.

No entanto, o elenco é estupendo de uma ponta à outra. A brilhante Julia Roberts (Ticket to Paradise) e o carismático Mahershala Ali (Moonlight) destacam-se dos restantes, entregando monólogos complexos com uma facilidade tremenda. Ethan Hawke (The Northman) e Miha’la (Bodies Bodies Bodies) são igualmente convincentes. Charlie Evans (Everything’s Gonna be Okay) passa por dificuldades em retratar uma personagem menos desenvolvida, mas, por outro lado, Farrah Mackenzie (Logan Lucky) oferece uma interpretação notável, acrescentando profundidade a uma mensagem subjacente sobre encontrar felicidade nos prazeres mais simples da vida, exemplificado pela dedicação inabalável da sua personagem à famosa sitcom Friends.

A cinematografia de Tod Campbell (Mr. Robot) é indiscutivelmente magnífica e verdadeiramente impressionante, mas às vezes torna-se uma distração frustrante. A inclinação de Esmail por planos não convencionais, transitando entre compartimentos e cenas constantemente através de janelas, portas e paredes, certamente adiciona significado temático a Leave the World Behind – para além de deixar qualquer cinéfilo a coçar a cabeça – mas vai-se tornando cada vez mais num impedimento visual em vez de uma melhoria, especialmente ao usar ângulos tortos em momentos em que os espetadores realmente desejam ver o que está a acontecer sem ter que virar a cabeça. A banda sonora pulsante de Mac Quayle (Mr. Robot) pontua com sucesso a tensão crescente do filme, contribuindo para a experiência imersiva geral.

Pena que alguns problemas de ritmo diluam a sensação de urgência necessária para complementar esta mesma tensão. A narrativa ocasionalmente tropeça em fatores de credibilidade, bem como em algumas sequências repetitivas, especialmente aquelas com os cervos simbólicos, que tendem a prolongar mensagens já bem compreendidas. No geral, é provável que provoque uma divisão na audiência caseira, mas esperançosamente, a maioria conseguirá olhar para lá destes problemas e deixar-se levar pelo estudo psicológico bastante interessante.

VEREDITO

Leave the World Behind entrelaça de maneira elaborada a habilidade técnica de Sam Esmail com o instigante material de origem de Rumaan Alam, proporcionando uma exploração cativante da dinâmica familiar, questões sociais e do impacto do medo e da incerteza no comportamento humano.

Apesar da adaptação de Esmail se inclinar para um thriller apocalíptico mais direto, mantém a profundidade temática, sendo que as personagens complexas, retratadas por um elenco de renome com Julia Roberts e Mahershala Ali como destaques brilhantes, servem como condutores cativantes para estes temas, oferecendo reflexões profundas sobre a sociedade contemporânea.

A cinematografia requintada e uma banda sonora pulsante contribuem para uma experiência tensa e imersiva, apesar do trabalho de câmara ocasionalmente distrativo, alguns problemas de ritmo e elementos narrativos repetitivos.

No fim, é um conto cautelar genuinamente interessante que recomendo assistirem antes do fim do ano.

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3 Comentários

  1. eu ACHEI UMA GRANDE MERDA! A atuação do elenco é muito boa, o tipo de filmagem bem diferente do comum, mas o roteiro, o ritmo e principalmente o FINAL que grande MERDA!

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