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Azrael é marcado pela ausência de diálogos e pela narrativa visual densa, desafiando os espetadores a interpretar cada detalhe.

O estúdio A24 tem-se tornado exponencialmente popular ao longo da última década, nomeadamente dentro do género de horror, ao oferecer oportunidades a cineastas inexperientes para se aventurarem no meio com histórias originais e pouco acessíveis ao público mais mainstream. Mas, antes da A24, já existia IFC Films e a sua marca secundária IFC Midnight que, algo injustamente, parece nunca receber a mesma atenção e elogios por parte dos mesmos fãs cinéfilos. Azrael é a obra mais recente do estúdio, realizada por E. L. Katz (Cheap Thrills), com argumento de Simon Barrett (Godzilla x Kong: The New Empire) e protagonizada por Samara Weaving (Ready or Not).

Num mundo onde ninguém fala, uma comunidade devota e misteriosa tenta encontrar uma fugitiva chamada Azrael (Weaving). Ao ser recapturada por líderes sem misericórdia, a jovem mulher encontra-se destinada a servir de sacrifício para criaturas que residem dentro da floresta selvagem, mas Azrael não desiste de lutar pela sua liberdade e sobrevivência. Um conto de horror gerado a partir de uma parábola crua e violenta sobre sacrifício, vingança e salvação sem qualquer diálogo, assim como muito simbolismo e ambiguidade narrativa onde a lenga-lenga do “show, don’t tell” é cumprida com o máximo rigor.

Um rápido estudo online permite descobrir que Azrael significa “anjo da morte” em tradições islâmicas e, até, em mitologia judaica, o que faz sentido com o ambiente religioso do culto de onde a personagem de Weaving consegue escapar. Apesar da maioria de eventuais referências religiosas me passarem ao lado – principalmente se estas forem oriundas das religiões mencionadas -, Katz constrói uma atmosfera estranha e, sem dúvidas, misteriosa em torno desta comunidade que leva uma marca de queimadura na frente do pescoço.

Azrael é uma obra com imenso valor artístico e tecnicamente surpreendente, mas contém elementos de entretenimento comum para agradar a qualquer tipo de público. Desde violência macabra a sequências longas de luta e perseguição – várias com planos ininterruptos -, Katz aproveita muito bem a cinematografia em local de Mart Taniel (Captain Volkonogov Escaped). Com um uso inteligente da escuridão e luzes provenientes de fogo ou lanternas, Taniel ajuda a criar um ambiente imersivo que só não é mais assustador devido às “criaturas” visualmente pouco chocantes – pois parecem meramente humanos queimados sem grande componente física extraordinária.

A maioria dos momentos de horror são executados na perfeição, sendo que algumas sequências deixam a desejar uma montagem menos agitada, assim como uma utilização mais cuidada de câmara tremida. Com um foco particular na quantidade pesada de sangue e gore geral, Katz não mostra qualquer receio em colocar a câmara em cima do acontecimento, por mais desconfortável e nojento de assistir que seja. Ficam também na retina alguns planos deslumbrantes de Taniel com a silhueta de personagens a embelezar um fundo iluminado por fogo.

Voltando ao argumento de Barrett, Azrael tenta o seu melhor para ser uma lição de como não entregar exposição forçada. Naturalmente, não havendo falas, qualquer informação a nível do mundo apocalíptico, personagens e enredo principal chega ao espetador exclusivamente através de meios visuais, obrigando o público a manter-se atento e a interpretar todas as expressões faciais dos atores, assim como as decorações dos vários locais de filmagem. Filmes ambíguos não são propriamente “apetecíveis” para o público geral, principalmente para os que não têm paciência para pensar em respostas para as perguntas que a obra coloca.

Dito isto, Azrael deixa, de facto, várias questões narrativas sem conclusão óbvia ou simplesmente abertas a muitas interpretações diferentes, o que pode levar a uma confusão final desagradável para alguns espetadores, pois também não existem pistas claras para uma potencial teoria geral aceite por uma maioria. Apesar dos temas sobre sobrevivência, vingança e sacrifício serem evidentes, não se sente o impacto temático que uma obra deste estilo normalmente transmite. Na verdade, sem a performance central cativante, o filme de Katz não alcançaria sucesso.

Weaving é, sem dúvidas, uma das atrizes mais subvalorizadas da indústria cinematográfica atual. Desde The Babysitter a Ready or Not, não esquecendo Guns Akimbo ou Scream VI, a atriz australiana fica sempre na memória dos espetadores devido à sua expressividade variada e intensa, tal como um gosto particular em levar banhos de sangue falso. Em Azrael, o seu casting é perfeito, pois uma obra sem diálogos requer uma protagonista que seja capaz de se expressar facilmente, caraterística que é marca registada de Weaving. A sua personagem é extremamente capaz, corajosa e persistente, lutando primeiro pela sua sobrevivência – com quantidade q.b. de plot armor – e, depois, colocando em prática um plano de vingança bastante violento e até demoníaco.

VEREDITO

Azrael é marcado pela ausência de diálogos e pela narrativa visual densa, desafiando os espetadores a interpretar cada detalhe. A realização de E. L. Katz, aliada à bela cinematografia de Mart Taniel, cria um ambiente misterioso e envolvente, embora nem sempre consiga equilibrar a ambiguidade da história com a necessidade de impacto emocional. No entanto, a performance magnética de Samara Weaving é o verdadeiro pilar que sustenta o filme, tornando o mesmo numa experiência cativante com vários momentos de horror e violência memoráveis, mesmo quando alguns dos seus elementos mais abstratos possam frustrar parte do público. Uma obra artsy audaciosa, mas com valor de entretenimento suficiente para agradar à audiência comum.

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