Análise – Project Zero: Mask of the Lunar Eclipse

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Uma vitória para a preservação de videojogos, mas o capítulo mais seguro e menos entusiasmante da famosa série de terror.

Alguém decidiu sacudir os enxovais da avó e soltar os fantasmas do passado com o regresso da saga Project Zero (Fatal Frame) às consolas. Um regresso há muito esperado que vem ocupar o espaço vazio deixado pela sua experiência imersiva, com foco em folclore japonês e num sistema de combate ainda peculiar no género, onde o melodrama e o terror andam harmoniosamente de mãos dadas. A longevidade de Project Zero não foi, no entanto, tão consistente como a de outras grandes séries de género, com a franquia a saltar gerações, plataformas e até mercados internacionais à medida que moldava a sua jogabilidade devido à exclusividade nas consolas da Nintendo. Um remake, duas sequelas e um spin-off depois, Project Zero entrou em hibernação até ao relançamento de Maiden of Black Water, em 2021, e agora com a estreia de Mask of the Lunar Eclipse no ocidente.

Apesar de ter apreciado Maiden of Black Water, a imagem torna-se mais clara sobre o fim prematuro de Project Zero. Com Mask of the Lunar Eclipse, podemos ver as raízes que viriam a moldar a jogabilidade, a narrativa e a estrutura de Maiden of Black Water, mas numa base muito mais segura e menos experimental do que veríamos em 2015 com o anterior exclusivo da Wii U. A estreia de Mask of the Lunar Eclipse no ocidente, 15 anos depois da sua estreia – agora numa versão remasterizada, ainda que a necessitar de um par de aspas, já que traz alguns extras, mas um trabalho pouco consistente de restauro visual ou mecânico –, revela um jogo mais narrativo, linear e pouco aventureiro do que esperava.

Mesmo com três protagonistas – Misaki Asō, Madoka Tsukimori e o detetive Chōshirō Kirishima -, cada um com a sua própria história e motivações, que se interlaçam ao longo da campanha, Mask of the Lunar Eclipse parece ser tão pequeno e pouco ambicioso com a narrativa que tenta desenvolver. A campanha foca-se maioritariamente na ilha de Rougetsu e no sanatório abandonado, onde, anos antes, Misaki e Madoka foram salvas por Chōshirō. O sanatório é o palco para esta aventura de terror em três partes, um espaço pouco amplo ou com personalidade, composto por corredores e salas que introduzem uma enorme linearidade à série Project Zero. Se a campanha continua a depender da exploração, em busca de itens importantes ou de novas pistas sobre o passado da ilha – tal como os primeiros títulos da séries fizeram anos antes, naquela que é a estrutura tradicional dos jogos de terror de sobrevivência –, a progressão estagna esta aposta clássica ao direcionar constantemente os jogadores para os pontos de interesse. Sejam espetros que surgem em campo, cinemáticas ou indicações no mapa – que podem aparecer, por exemplo, quando encontramos uma chave –, Mask of the Lunar Eclipse não nos quer perdidos ou sem direção, sacrificando a sua ambiência opressiva por uma necessidade desmedida em avançar com a narrativa o mais depressa possível.

Penso que esta decisão nasce não só do foco narrativo, mas também da falta de personalidade em Rougetsu, com as salas e corredores do sanatório a misturarem-se facilmente na nossa mente através da sua paleta de cores frias. Se ponderarmos que Mask of the Lunar Eclipse foi lançado na Wii, com foco no controlo por movimentos, também depreendemos o porquê de termos uma estrutura tão linear, rígida e pouco interessada em deixarmos explorar à nossa vontade. A versão original dava grande destaque à utilização da lanterna para iluminar os cenários e encontrar itens, e para que isso funcionasse, presumo que a Tecmo (agora Koei Tecmo) e a Grasshopper Manufacture decidiram apostar numa perspetiva “over the shoulder” e também em cenários mais claustrofóbicos para criar aquela que consideraram como a solução perfeita para as suas ambições narrativas e dificuldades técnicas. Talvez fosse, em 2008, uma forma nova e refrescante de abordar a série Project, mas 15 anos depois, parece faltar algo dentro desta simplicidade – algo que a remasterização não conseguiu melhorar e muito menos justificar.

Os primeiros Project Zero seguiam os moldes do género de terror de sobrevivência, mas destacaram-se pelo sistema de combate menos convencional, mas no que toca à sua estrutura, eram muito semelhantes. Explorar uma zona, descobrir as portas fechadas, encontrar chaves, resolver puzzles e sobreviver aos confrontos com fantasmas. Uma estrutura que funciona para qualquer jogo de terror, os moldes de proto-metroidvania que ainda hoje podem ser identificados no género. Mask of the Lunar Eclipse não ignora por completo o ADN da série, mas diluí-o ao ponto de se tornar irreconhecível e muito menos empolgante, segurando-nos na mão e eliminando quaisquer motivos que possamos ter para sair do caminho principal e explorarmos à nossa vontade.

Esta linearidade é tão presente e sufocante que me retirou completamente do jogo. Senti-me em piloto automático a ver cinemáticas e a combater quando era necessário, deslocando-me de um ponto do mapa para o outro sem saber o que estava a fazer e porquê. A ilusão quebrou-se num momento muito específico. Depois de ativar o elevador pela primeira vez, no Rogetsu Hall, voltei ao primeiro andar. O jogo parecia querer que eu fosse para a sala de jantar, mesmo ao lado do hall onde estava, mas decidi dar a volta e explorar um pouco mais. Quando cheguei à sala de jantar, não tinha nada à minha espera. Fiquei confuso. Decidi voltar ao hall e reentrar pela mesma porta, o que ativou um dos inúmeros espetros que nos guiam ao longo da campanha. Estava resolvido o mistério e a minha deceção apenas cresceu.

Tal como em Maiden of Black Water e, até certo ponto, The Tormented, Mask of the Lunar Eclipse divide a sua campanha por vários protagonistas, cada um com as suas motivações para visitar a ilha de Rougetsu. O que poderia ser um bom veículo narrativo para uma campanha mais expansiva acaba por ser um sinal do sufoco em torno da estrutura do jogo, com os três protagonistas a passarem constantemente pelos mesmos locais. Esta escolha faz com que a campanha pareça ainda mais pequena e repetitiva do que é, com os cenários a misturarem-se entre si e a transformarem-se em peças desinteressantes no enorme puzzle que a história tenta construir. A velocidade reduzida das personagens, que se movem como se estivessem apenas a passear, é outra agravante à reutilização das zonas da campanha em curtos trechos de tempo. Se existisse uma maior interatividade entre as personagens, como a possibilidade de abrirmos caminhos e a partilha de itens ser mais impactante na dificuldade de cada capítulo, talvez a campanha fosse mais empolgante.

A jogabilidade talvez tenha sido a força motora para todas estas alterações na estrutura de Mask of the Lunar Eclipse, fossem ponderadas ou não, porque nunca a chega a ser totalmente intuitiva ou divertida. Para a nova versão, a Koei Tecmo teve de readaptar os controlos por movimento e relegar o controlo das personagens e da lanterna aos analógicos, criando assim um esquema de comandos que só poderia funcionar em cenários mais lineares e fechados. Isto porque as personagens de Mask of the Lunar Eclipse movem-se como se fossem blocos de madeira que mal se conseguem virar, com o analógico esquerdo a controlar os seus movimentos direcionais – com a possibilidade de fazermos uma volta 180º com o L3 e R3 – e o analógico direito a controlar a rotação da personagem, mas também a câmara e a lanterna. Se a movimentação não levanta grandes problemas, fora a sua rigidez e lentidão, já a utilização da câmara e da lanterna é problemática e até frustrante. Presumo que a lanterna estivesse associada ao Wiimote na versão original, visto que serve para encontrarmos itens escondidos nos cenários, mas na sua conversão para as novas consolas e PC, esta funcionalidade é mais descartável e pode ser facilmente substituída pela câmara. Não conseguem passar a lanterna pelo local onde julgam estar um item escondido? Mudem para a perspetiva na primeira pessoa e utilizem a mira da câmara para encontrarem o que procuram.

De facto, até o sistema de combate foi mais simplificado, pelo menos em comparação com Maiden of Black Water. Temos três protagonistas, duas Camara Obscuras diferentes e uma lanterna, que funciona quase da mesma forma. Entre elas, as diferenças são mínimas e as três podem ser evoluídas se encontrarem gemas azuis, tal como equipadas com novas lentes, também escondidas ao longo da campanha. No entanto, a base é igual para as três opções: foquem a mira num fantasma, esperem que carregue até ao máximo e disparem. Se quiserem causar mais dano, podem utilizar as habilidades das lentes ou então esperar pelo momento certo e ativar o ataque Fatal Frame, que não só causa mais dano como pode dar origem a uma combinação de ataques. Fora isso, não há muito a fazer no sistema de combate, nem a combinação e rotatividade entre tipos de película é tão importante como nos outros jogos, ao ponto de ter conseguido terminar a maioria da campanha com a película mais básica.

Não retiro prazer em criticar Project Zero: Mask of the Lunar Eclipse, mas não consigo esconder o desapontamento que senti ao longo da sua campanha. Talvez seja a magia a dissipar-se, agora que a série regressou, cujos defeitos já não consigo ignorar ou desculpar como o possa ter feito em Maiden of Black Water – mas sublinho que é um melhor jogo do que este quarto capítulo, mesmo com os seus problemas. A aposta na linearidade e numa campanha demasiado guiada, sufocada por um sistema de combate pouco desafiante e uma jogabilidade rígida, estagna o mistério por detrás de Mask of the Lunar Eclipse, cuja narrativa assume-se como o seu maior trunfo. Mas falta algo. Estamos perante um jogo vazio, perdido no tempo, que caiu em 2023 com as graças de marcar a sua estreia no ocidente, depois de tantos anos de espera, e com pouco mais.

Esperemos que a Koei Tecmo continue a relançar a série, mas está na hora de ir às suas origens e à trilogia original. Vamos ver se o enxoval da avó ainda pode ser sacudido mais uma vez.

Cópia para análise (versão PlayStation 5) cedida pela Koei Tecmo.

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