House of the Dead: Remake

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Alguém retirou o pó à série da SEGA e decidiu fazer um remake fiel ao original, mas sem metade do seu carisma.

É difícil explicar às gerações mais novas a experiência de um salão de jogos. Entrar numa sala escura, repleta de fumo, cujas luzes e sons dissonantes enchiam o ambiente que se confundia entre corredores de cabines e espaços mais escondidos, parece algo saído da pré-história. Custa a acreditar que o seu desaparecimento aconteceu há apenas 20 anos, talvez 25, quando ainda era possível encontrar nestes salões videojogos que não podíamos jogar nas consolas menos poderosas da época. 20 anos depois, o PC e as consolas reinam acima de tudo – até os smartphones têm o triplo do poder de uma cabine da SEGA ou da Namco.

Mas quem passou pela experiência não esquece os salões de jogos. Se calhar até sente saudades, a memória adocicada pelo tempo, como se fossem os anos dourados dos videojogos em formato puro. Se passaram por um desses salões, de certeza que têm uma mão cheia de história, talvez até um momento favorito entre tantos outros. Como vocês, eu também tenho vários momentos na algibeira, mas foco-me apenas num. Se olharam para o título desta análise, de certeza que já conseguiram depreender que envolve House of the Dead, o jogo de ação “light gun” da SEGA, que marcou os salões em meados dos 90s. Não sei precisar a minha idade, mas era novo. Já nutria um enorme carinho e curiosidade pelo género de terror, mas o medo ainda lá estava. Num dos cantos do salão, conseguia ouvir gritos e o som de tiros que ficavam mais estridentes à medida que me aproximava. A origem dos sons era uma cabine repleta de desenhos de mortos-vivos, monstros, sangue e um aviso: não entres sozinho. Lembro-me de ficar assustado ao ponto de não querer jogar. Assim era House of the Dead.

27 anos depois e House of the Dead é muito diferente daquilo que era na sua estreia. Seguiu-se uma passagem pela SEGA Saturn, várias sequelas e até uma adaptação de Uwe Boll para os cinemas, mas a morte da série não tardou a chegar. Como poderia uma franquia, tão focada na experiência dos salões de jogos e no formato arcade sobreviver no panorama atual? Não podia e não sobreviveu. Depois de House of the Dead: Scarlet Dawn, a série entrou em hibernação, mais uma para o sótão da SEGA. É aqui que entra da Forever Entertainment e a MegaPixel Studio, saídos da remasterização/remake de Panzer Dragoon e com a honesta vontade de revistar House of the Dead à sua glória. Como o monstro de Frankenstein, algo correu mal no processo de ressurreição e o que recebemos hoje é o que parece ser uma imitação barata, em plástico fraco, daquela que já foi uma das séries mais populares da SEGA.

E sabem qual é a ironia? House of the Dead, em formato remake, é praticamente idêntico à sua versão original. Os inimigos são os mesmos, os capítulos são idênticos, os bosses não foram alterados e até encontramos os mesmos atalhos e itens secretos espalhados pelos corredores da mansão repleta de criaturas. Arrisco-me a dizer, apesar de não estar tão familiarizado com o original, que este remake esforçou-se para ser o mais próximo possível ao jogo que jogaram nos salões de jogos, ao ponto de manter a sua campanha curta e assente na dificuldade. Tal como no original, temos acesso a quatro níveis, quatro bosses e vários caminhos alternativos que influenciam a progressão de cada uma das fases, ao ponto de serem um excelente incentivo para repetirmos a campanha curta em busca de todos os itens secretos. Por falar em segredos, também podem contar com três finais que dependem da pontuação que conseguirem no final da campanha.

Ao contrário da minha primeira reação com a sua cabine, House of the Dead não é assustador. A versão original esforça-se para manter um tom mais sério, mas a série sempre abraçou a estética “campy” e as homenagens são um sinal claro disso, com o jogo a apresentar versões de Freddy Krueger, Leatherface e qualquer zombie popularizado por George A. Romero e Tom Savini. Os corpos desfazem-se em vários pedaços de proporções cómicas, de tão exagerados que são, e o “layout” da mansão é um “best-of” dos clichés do género de terror tão grande que se torna enternecedor. Ao menos tentaram, é o que pensamos enquanto passamos por laboratórios impossíveis e sistemas de esgotos que só poderiam existir num filme de terror italiano. As intenções da equipa e o tom de House of the Dead sempre entraram em choque, ao ponto das sequelas deixarem de tentar encontrar um equilíbrio entre o terror e a comédia, mas o remake vai mais longe e abraça por completo as produções de baixo orçamento, ao ponto de nos dar uma das interpretações mais feias e desinteressantes que joguei.

Se não gostaram de Panzer Dragoon Remake, então House of the Dead: Remake será ainda mais penoso. Volto a louvar a determinação da Forever Entertainment e da MegaPixel Studio em recriar fielmente a experiência do original, mas nunca o clássico da SEGA foi tão visualmente desinteressante, opaco, pouco criativo e plástico como o é aqui. As cores fortes e bastante denotadas do original foram retiradas, substituídas por uma tonalidade avermelhada que parece acompanhar a campanha do princípio ao fim. Os modelos das personagens, ainda que inspirados nos originais, são cópias sem alma, como se estivéssemos a ver a adaptação de baixo orçamento do mesmo jogo – aliás, é mesmo isso que temos neste remake. Os cenários também apresentam um aspeto muito barato, demasiado brilhantes e de cores esbatidas, como se a definição fosse reduzida ao máximo. Senti falta do estilo original, dos modelos com cores mais vivas e dos contornos que realçavam os cenários, já que o mesmo não acontece no remake e tudo parece misturar-se com os fundos.

Os problemas seriam ainda mais graves se a jogabilidade não conseguisse emular a experiência clássica do género, mas House of the Dead: Remake mantém-se fiel à campanha light gun que conhecem. Se calhar fiel não é a palavra certa, mas sim “próximo o suficiente” para não ser um problema. Como sempre, House of the Dead: Remake, que pode ser jogado em modo cooperativo, é tão simples como eficaz: disparem contra tudo o que se mexe. Temos a possibilidade de disparar contra as várias partes dos corpos dos mortos vivos – com os disparos na cabeça a valerem mais pontos – e contra elementos decorativos que dão acesso a itens secretos e a maior pontuação. Agora sem o auxílio de uma pistola de plástico, a jogabilidade de House of the Dead: Remake divide-se por dois modos de disparo diferentes: através do analógico da PS5, o clássico substituto da light gun nas versões para consolas, e através do giroscópio do comando. A utilização de controlos por movimento é muito bem-vinda porque tenta emular a experiência clássica dos salões de jogos, ainda que sempre sem acertar totalmente no alvo. Parecem existir alguns problemas de latência e nos tempos de resposta dos disparos e até do recarregamento das armas – existem várias armas à nossa disposição, mas temos de as encontrar pelos níveis -, algo que não se torna incomportável, mas que nos leva a duvidar da nossa própria pontaria em certos momentos. No entanto, admiro a inclusão de uma opção rápida de troca entre os dois modos de disparo e as várias opções de personalização dos controlos.

A Forever Entertainment e a MegaPixel Studio parecem ter uma abordagem muito peculiar ao processo de recriação de um videojogo: alterar muito pouco e adicionar os gráficos mais aborrecidos de sempre. House of the Dead: Remake surge como uma imitação barata, tão familiar, como bizarro, cuja banda sonora chega a ser medonha. Se são fãs da série, de certeza que este regresso deixou-vos felizes e com vontade de ver os restantes títulos da série a receberem também um remake, mas cuidado com o que desejam. House of the Dead: Remake não é um mau jogo e apresenta vários motivos para o continuarem a jogar – como os tradicionais troféus e ainda os modos Original, Horde e Arcade para terminarem -, mas falta alma nesta revisita. As intenções estão lá, mas recebemos o produto mais seguro e banal que poderíamos ter recebido. Mas há uma certeza que fica. Algures num salão fechado, talvez num armazém ou arrecadação, a cabine que me assustou há tantos anos ainda persiste. Contra tudo e contra todos. Assim recordamos House of the Dead.

Cópia para análise (versão PlayStation 5) cedida pela PR Forever Entertainment.

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