Crítica – Captain America: Brave New World

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Captain America: Brave New World pode não alcançar o nível dos seus antecessores diretos, mas está longe de ser um desastre. Anthony Mackie prova, sem margem para dúvidas, que foi a escolha certa para empunhar o escudo e os valores de produção entregam momentos de entretenimento genuíno, apoiado por um elenco carismático e sequências de ação bem conseguidas.

A era pós-Avengers: Endgame do Universo Cinemático da Marvel tem sido inconsistente e marcada por inúmeros problemas de produção, pelo que Captain America: Brave New World, por ser mais uma obra a sofrer com regravações e várias alterações de argumento não é, de todo, surpreendente e apenas demonstra a preocupação geral com o estado da franquia que dominou bilheteiras durante a última década e meia. Pessoalmente, tenho recebido a maioria dos filmes e séries de forma positiva, mas admito a escassez de filmes genuinamente memoráveis que se tornem escolhas comuns em listas de “melhores do ano” e afins.

Captain America: Brave New World é o penúltimo filme da quinta fase deste universo de histórias interligadas e conta com uma equipa de argumentistas extensa – Rob Edwards (Treasure Planet), Malcolm Spellman e Dalan Musson (The Falcon and the Winter Soldier), Julius Onah (The Cloverfield Paradox) e Peter Glanz, sendo que Onah agarra também a função de realizador – e ainda faltam alguns nomes que ajudaram na escrita das tais regravações. A premissa segue, naturalmente, o novo Capitão América, Sam Wilson, interpretado por Anthony Mackie, num reencontro com Thaddeus Ross, interpretado por Harrison Ford, o recém-eleito Presidente dos Estados Unidos da América. Sam encontra-se no meio de um incidente internacional, sendo obrigado a descobrir as razões por detrás de uma conspiração global antes que seja tarde demais e o mundo fique a ver… vermelho.

Afirmar que a trilogia Captain America é a melhor deste universo cinemático é algo bastante comum e, se não é unânime, deve andar perto de tal estatuto. No entanto, esta quarta parte não só apresenta um contexto totalmente diferente às últimas três, como o herói epónimo mudou de nome, personalidade e até certas regras morais e éticas. Quem assistiu à série The Falcon and the Winter Soldier – algo obrigatório para quem queira verdadeiramente sentir-se a par dos eventos atuais e novas personagens – irá reconhecer os temas principais apresentados em Brave New World. Desde a responsabilidade e poder de um cargo simbólico e inspirador, até identidade pessoal, capacidade genuína de redenção e problemas complexos relativos à justiça criminal, não esquecendo os tópicos proeminentes de legado e raça. Captain America: Brave New World toca em todos estes assuntos, mas contrariamente ao seu título, peca por maior coragem e novidade provocante, apostando na segurança com as suas mensagens e explorações básicas dos temas gerados pelos vários pontos de enredo.

Num filme com diversas linhas narrativas marcadas por pesos distintos de política, sociedade e até ativismo, Captain America: Brave New World não consegue esconder os seus problemas conhecidos de produção que levaram a várias regravações que são notórias ao longo do filme, afetando negativamente o seu ritmo, tom e controlo geral da estrutura narrativa que interliga demasiados eventos isolados que nem sempre se relacionam da maneira mais convincente e orgânica. Dito tudo isto, é deveras surpreendente a decência do produto final, em muito devido às prestações de um elenco fantástico, um terceiro ato altamente energético repleto de ação cativante e, por incrível que pareça tendo em conta o atabalhoamento para se conseguir um argumento para o filme, é mesmo o filme que resolve mais “pontas soltas” desta saga cinemática ao longo das suas duras horas de duração.

Se ainda haviam dúvidas sobre Sam Wilson / Anthony Mackie serem as escolhas mais acertadas para pegar no escudo deixado por Steve Rogers / Chris Evans, Captain America: Brave New World destrói quaisquer argumentos contra os primeiros. Mackie comprova que é um ator capaz de liderar um blockbuster importante para a sua franquia, conseguindo impressionar com uma aura simultaneamente semelhante e distinta do seu antecessor, mantendo a essência daquilo que o herói representa, mas trazendo a sua própria maneira de ser e viver. A sua química com Danny Ramirez (Top Gun: Maverick), o novo Falcon, Joaquin Torres, é reminiscente do duo Steve-Bucky / Evans-Stan, mas novamente, ambos trazem a sua dinâmica pessoal para o grande ecrã, separando-se da relação que marcou toda uma era na Marvel.

Harrison Ford substitui o falecido William Hurt como Thaddeus Ross e entrega uma performance respeitosa e digna do trabalho do ator original. Aliás, Ford traz mais emoção do que antecipava, cumprindo com os requerimentos sentimentais do arco mais evolutivo de Captain America: Brave New World que, mesmo assim, peca por maior profundidade e presença de Betty Ross (Liv Tyler) – é estranho ser uma personagem tão importante para o desenvolvimento do enredo e possuir apenas uma cena física.

Um regresso mais bem trabalhado foi o de Tim Blake Nelson como Samuel Sterns, o cientista responsável pela criação da Abomination em The Incredible Hulk, último filme onde o personagem apareceu ao ser contaminado pelo sangue de Bruce Banner que lhe entra pelo cérebro, ganhando inteligência super-humana. Captain America: Brave New World traz de volta o antagonista de forma interessante e aproveita para referenciar e concluir certos eventos do universo como o surgimento do Celestial Tiamut em Eternals ou a situação atual dos Avengers, algo que agradará aos fanáticos que não conseguem passar um mês sem ver algo mencionado no projeto seguinte.

Apesar dos problemas de ritmo e de algum “ecrã verde” notório, especialmente na fase final, Captain America: Brave New World constrói um terceiro ato imersivo onde o trabalho visual no Red Hulk merece elogios, assim como a coreografia envolvida nas sequências de ação subsequentes – se bem que, pessoalmente, considero a set piece junto do Celestial no segundo ato o momento mais climático e de maior entretenimento do filme. O facto do marketing não ter escondido a presença do Red Hulk acaba por não permitir ao mistério central ser tão intrigante como teoricamente devia ser, mas a verdade é que seria difícil publicitar este filme sem, pelo menos, mencionar o mesmo.

A banda sonora de Laura Karpman (The Marvels) é possivelmente o maior destaque técnico ao elevar o tal ato final com os níveis de energia necessários, mas a cinematografia cinética de Kramer Morgenthau (Creed III) também contribui para o fascínio dos espetadores mais ansiosos por ação. Geralmente, Captain America: Brave New World não impressiona – as comparações iniciais com o tom de Captain America: Winter Soldier entendem-se, mas o impacto narrativo e temático encontra-se vários patamares abaixo – mas não merece a divisão excessiva desta sua semana de lançamento.

E é precisamente aqui que vou arriscar um parágrafo extra-crítica. Desde Avengers: Endgame que se tem notado um mudança na receção inicial relativo a novos filmes do universo cinemático. A consistência tem deixado a desejar, é certo, mas parece que existe uma falta de paciência e até uma mentalidade pré-definida para duvidar dos próximos projetos, como se metade da opinião já estivesse formada antes de se entrar na sala de cinema. As razões para tal são infindáveis, mas a verdade é que, em sagas com comunidades de fãs de dimensões consideráveis, cada vez mais se notam “equipas” cuja opinião tem de ser sempre positiva ou sempre negativa. É uma mudança estranha, nomeadamente no mundo da crítica, onde se devem julgar os filmes de forma individual e sem influências externas, mas tendo em conta a evolução do meio com a futilidade das redes sociais, a expetativa é que tais comportamentos aumentem e sejam cada vez piores.

VEREDITO

Captain America: Brave New World pode não alcançar o nível altíssimo dos seus antecessores diretos, mas está longe de ser o desastre que muitos apregoam. Apesar das falhas evidentes de produção, Julius Onah ainda consegue entregar momentos de entretenimento genuíno, apoiado por um elenco carismático e sequências de ação bem conseguidas. Anthony Mackie, cuja interpretação de Sam Wilson prova, sem margem para dúvidas, que foi a escolha certa para empunhar o escudo deixado por Steve Rogers, capta na perfeição a dualidade entre a responsabilidade de ser um símbolo mundial e a humanidade de um homem que ainda procura o seu próprio caminho, trazendo uma abordagem única ao legado do herói epónimo. Não é “Top-Tier MCU”, mas é uma obra merecedora de ser vista no grande ecrã.

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