Marte parece ser o destino paradísico deste março atípico. Depois de uma viagem por Memories of Mars, é a vez de descobrirmos os segredos e horrores de Moons of Madness, que acaba de chegar às consolas. Ao contrário do foco na sobrevivência e na experiência totalmente online de Memories of Mars, o jogo da Rock Pocket Games aposta na narrativa, no terror e numa aventura mais linear que nos transporta para uma Marte onde nada é o que parece – a não ser a sua estória previsível.
Moons of Madness fez-me pensar pela primeira vez que estou saturado de adaptações e homenagens à obra de H.P. Lovecraft. Senti, depois de seis horas de campanha, que precisamos de algo novo e inesperado no género de terror, algo capaz de ir além dos monstros e deuses interdimensionais, da loucura, dos jogos de sombra e das conspirações. Fico triste ao dizê-lo, mas Lovecraft precisa de descansar e Moons of Madness revela o quão gasto está este mundo de adaptações mal desenvolvidas.
A estória perde, na minha opinião, por ter esta aproximação a Lovecraft. O início é forte, muito banhado no seu estilo sci-fi, colocando-nos numa estação marciana onde somos encarregues de manter o seu funcionamento. Por comunicador, conhecemos os colegas de Shane, o nosso protagonista, e traçamos esta vida marciana que está prestes a ser virada do avesso. Moons of Madness, mesmo com o seu presságio inicial – sob a forma de um prólogo pouco apetecível –, cativou-me pelo seu foco no quotidiano, na vida de Shane e na manutenção da base.
A ausência dos colegas, sempre em locais diferentes, parecia antever um mistério mais forte e mais humano, mas rapidamente caímos nos sonhos, nas assombrações, nas visões de futuros apocalíticos e de seres viscosos e extra-humanos que irrompem por uma narrativa que se queria misteriosa e muito mais assente nas suas raízes de ficção científica do que no horror cósmico.
Moons of Madness não consegue aguentar o peso do mistério que quer criar e há um enorme desequilíbrio no seu ritmo, forçando uma mudança de tom quase radical durante as primeiras horas de jogo. Parecem ser dois jogos em luta um contra o outro, onde o horror acaba por ganhar e forçar-se sobre a narrativa. A partir do momento em que Moons of Madness abandona a ficção científica, o meu interesse desmoronou, caindo a cada nova revelação e a cada nova camada desinteressante numa estória que ganharia mais em ser simples. Mas não é.
Quer ser tudo e acaba por ser um cliché andante sem grande valor para além da sua determinação em ser, quase sempre, um jogo narrativo. Há que louvar a determinação.
Mesmo como jogo de terror, não fascina. Moons of Madness relega o seu horror cósmico a cenários pouco interessantes e a uma aposta desnecessária em sustos fáceis, com gritos, sons e aparições repentinas a marcarem a campanha. Na verdade, o jogo está tão determinado em ser assustador que mal sabe conter o seu entusiasmo e apresentar os momentos mais tensos com ponderação, existindo várias situações onde não vi sequer o que me deveria estar a assustar. A personagem reage, a música aumenta, mas eu não vi nada.
As sequências de perseguição conseguem construir alguma tensão, mas fora desses momentos, pouco há de assustador nesta Marte estéril. Pedia-se mais, mas a Rock Pocket Games parece ter apostado apenas nas obras de Lovecraft para criar os momentos mais surreais e assustadores.
A nível mecânico, Moons of Madness apresenta-se como um jogo de aventuras na primeira pessoa com um foco na resolução de quebra-cabeças. A campanha é linear, muito assente na sua narrativa – existindo a possibilidade de encontrarmos documentos e e-mails que nos dão mais informações sobre o mundo e as suas personagens – e a exploração é limitada a uma mão-cheia de locais, com a ação a focar-se maioritariamente na base marciana. A aposta em tecnologia mais realista é cimentada pela necessidade de resolvermos pequenos problemas pela base, com cada ação a ser desconstruída em prol deste realismo.
Por exemplo, para sairmos da base, precisamos de vestir o fato, colocar o capacete, descomprimir a sala e só depois abrir a porta para o exterior. Não é muito, mas são estas trivialidades que me fizeram gostar das primeiras horas de Moons of Madness, esta aposta em mecânicas que me relembraram um point and click mais simplificado, onde cada ação é importante e necessária.
Fora dos puzzles e dos pequenos trechos de exploração, Moons of Madness é muito linear. A deslocação é simples e existem poucas opções de interatividade fora do estritamente necessário, o que é uma pena. Com um mundo tão detalhado, dá vontade de revirar e remexer em tudo o que encontramos, de abrir cada gaveta e de nos deixarmos levar pelos cenários coloridos e futuristas. Mas Moons of Madness segue por um caminho mais tradicional, algo que não critico, e que pouco ou nada se diferencia dos restantes títulos do género.
Apesar de se concentrar em cenários mais contidos, Moons of Madness não consegue evitar alguns problemas de performance, onde registei slowdowns, popups e uma queda de frames nos momentos mais intensos. Não surpreende a nível visual, especialmente nas suas texturas sem grande relevo, ainda que a direção de arte seja competente. Até nos momentos mais assustadores e surreais, onde a realidade é deturpada, Moons of Madness é apenas competente, não se destacando em nada. Parece que não existir imaginação por detrás destes cenários monstruosos.
Moons of Madness é um jogo com boas ideias que precisava de uma narrativa mais estruturada para justificar a sua aposta num universo que tenta ser mais profundo do que realmente é. Se gostam de terror e são fãs de H.P. Lovecraft, irão encontrar algo que vos agrade nesta Marte infestada, mas esperava-se mais. Há aqui a base para algo que podia ser muito melhor, mais intenso e assustador, mas Moons of Madness resume-se a um início forte e a um final desapontante.
Moons of Madness
Plataformas: PC, Xbox One, PlayStation 4
Este jogo (versão PlayStation 4) foi cedido para análise pela Funcom.
Um jogo narrativo inspirado nos universos tenebrosos de H.P. Lovecraft que fica aquém do esperado, caindo nos clichés do género sem se conseguir destacar.