Um roguelike perfeito para os jogadores que procuram algo diferente.
Depois de sobreviver à maré de jogos pós-apocalípticos, apercebo-me de um novo padrão na primeira metade de 2020: a ascensão dos roguelikes. A ideia é absolutamente aliciante, seja para os jogadores ou para os produtores. Imaginem que têm um jogo que não só é focado na dificuldade, como também no recomeço constante, aliado a mapas procedurais que lhe dão uma longevidade acima da média. É uma fórmula vencedora.
No entanto, é um dos géneros mais complexos e arriscados de acertar em cheio, com a experiência, a variedade de mecânicas e o equilíbrio da dificuldade a estarem no centro das atenções. Felizmente, West of Dead, da Upstream Arcade, dá-nos tudo o que precisamos num roguelike, ainda que não seja capaz de surpreender os fãs do género.
Uma coisa é certa: West of Dead é visualmente fenomenal. Transportando-nos para um mundo inspirado pelos westerns clássicos, o título da Upstream Arcade mistura ainda elementos sobrenaturais, com a aventura a decorrer algures entre a vida e a morte, e colocando-nos no papel de um pistoleiro em busca do repouso eterno. Como William Mason, partimos em busca de Preacher, que interrompeu a passagem das almas para o Além, numa campanha dividida por níveis onde o recomeço é uma constante.
Em movimento, West of Dead parece ter saído da mente de Mike Mignola, criador de Hellboy, com as suas cores pastel, repletas de contornos e de sombras pronunciadas. Os modelos são expressivos, tais como as suas animações, e o jogo entre luz e sombras é impressionante à medida que iluminamos as salas e corredores deste limbo. É um estilo visual muito marcado, cheio de personalidade, cell-shaded e com uma longevidade que é, à partida, uma garantia. A nível de comparação, podem pensar em Void Bastards para terem uma ideia do que irão encontrar.
Como disse anteriormente, este western sobrenatural é um roguelike com mecânicas twin-stick shooter. Com uma perspetiva isométrica, West of Dead divide a campanha por níveis, que são compostos por cenários procedurais que se constroem entre corredores, salas de combate e caminhos alternativos. Os níveis estão repletos de segredos, onde poderão encontrar novas armas, habilidades e pontos de evolução, e sempre que forem derrotados voltam ao início do capítulo: assim são os roguelikes.
A diferença é que West of Dead é muito mais ponderado e, diria, mais tático, apostando num sistema de combate mais lento, focado na cobertura e no controlo dos inimigos à distância. Com um leque de armas interessante, desde espingardas até a revolveres assombrados – todos eles com vários níveis de ataque –, é preciso saber combinar ataques e equilibrar a sua utilização com ferramentas e habilidades que encontramos ao longo da campanha.
Os inimigos são implacáveis e basta um erro para voltarmos ao início. O sistema de cobertura é automático, tal como o recarregamento das armas, o que poderá trazer alguns dissabores – existindo momentos onde não consegui, pela perspetiva, perceber que não estava protegido –, mas há um ritmo interessante nos confrontos, onde é preciso equilibrar os disparos à distância com a mobilidade.
As coberturas podem ser destruídas e há a possibilidade de iluminar as salas para atordoar os inimigos. As criaturas são variadas e apresentam designs e habilidades interessantes, com o jogo a esforçar-se para equilibrar cada um dos confrontos. Algumas salas são implacáveis, especialmente pela escuridão – que acaba por condicionar mais a jogabilidade do que a complementar – colocando esqueletos que atacam à distância com demónios canídeos que perseguem Mason, mas não senti que existisse um desequilíbrio proporcionado pelo elemento procedural da jogabilidade.
Se não equilibrarem o vosso poder de ataque com as ferramentas, qualquer desafio poderá parecer injusto, por isso, percam o vosso tempo a explorar e a construir a vossa personagem.
O design dos níveis não é, na sua maioria, inovador. Os corredores e salas nunca evoluem para além da estrutura “pausa-combate-pausa”, mas há uma tentativa em alterar e melhorar o seu layout individual através de novas coberturas e uma maior verticalidade. O posicionamento dos inimigos também dá às arenas alguma variedade, existindo uma certa rotatividade no tipo de confrontos que encontramos e na nossa abordagens aos níveis, com grupos de inimigos focados nos ataques à distância ou em demónios mais agressivos que obrigam à movimentação constante.
Não é surpreendente e a aposta em corredores poderá irritar alguns jogadores, mas fica a ressalva que existe, após eliminarem o primeiro boss, a possibilidade de viajarem entre pontos específicos de cada nível.
West of Dead é um roguelike muito acessível, apesar da sua dificuldade. Apesar de perdermos as armas, ferramentas e ferro – que é utilizado como moeda – quando somos derrotados, o jogo não é cruel ao ponto de retirar qualquer progresso. Quando voltamos ao início, temos a possibilidade de utilizar os pecados (ou Sins) recolhidos pelo Pistoleiro à medida que elimina os seus adversários. Estes pontos de evolução, que podem também ser utilizados entre níveis, desbloqueiam ferramentas e atributos adicionais que nos auxiliam ao longo da campanha. Podemos, por exemplo, desbloquear um recipiente de energia, que nos permite curar, ou um escudo temporário.
As habilidades únicas, como a navegação entre pontos dos níveis, também são permanentes. Até certo ponto, West of Dead é um Dead Cells isométrico.
A banda sonora não é um dos destaques do jogo, mas os efeitos das armas têm impacto suficiente para sublinhar cada bala. As armas têm sons diferentes e as explosões também são marcantes, mas é uma pena as composições não serem mais memoráveis. O que é memorável, no entanto, é a prestação de Ron Pearlman como Mason. A sua voz grave dá intensidade à narração e injeta-lhe uma personalidade contornável, delineando os pensamentos introspetivos do Pistoleiro, que tenta perceber o que lhe aconteceu e o que o espera no Além. O mesmo não pode ser dito das restantes personagens, que estão limitadas a um punhado de falas.
Se gostam de roguelikes e querem algo ligeiramente diferente, com foco num combate mais ponderado, West of Dead é uma aposta sólida. Com um estilo visual muito forte, o jogo da Upstream Arcade só peca pela sua jogabilidade lenta e pela falta de uma maior variedade de armas, mas é desculpável se tivermos em conta o foco na estória. O design dos inimigos é memorável e há muito amor neste western sobrenatural que acaba de chegar ao PC e consolas.
Plataformas: PC, PlayStation 4, Xbox One e Nintendo Switch
Este jogo (versão Xbox One) foi cedido para análise pela Raw Fury.