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É a versão definitiva de The Last of Us, que para além dos novos visuais e afinações, podia ir ainda mais além.

Após ter concluído The Last of Us Part I, ter voltado um pouco ao Remaster da PS4 e ter começado logo uma nova aventura em The Last of Us Part II (mesmo sem tendo qualquer razão para tal, para além do meu carinho pelo jogo), o que sinto é o seguinte: The Last of Us Part I é um Remaster glorificado de um excelente jogo.

As ambições da Naughty Dog em “refazer de raiz” o seu acarinhado jogo são indiscutíveis. Desde o primeiro minuto de jogo que é fácil perceber que, debaixo do seu capot, se esconde um trabalho monumental de atualização para uma plataforma mais moderna. Part I não surge com um simples clique de um botão et voilà – fica com os gráficos de The Last of Us Part II. É muito mais do que isso, mas, superficialmente, sinto que não chega para fazer justiça às expectativas e ao potencial de um remake com “R” grande.

Já sabemos a história de The Last of Us. Já foi analisado até à exaustão nos últimos nove anos e foi esmiuçado até ao tutano com a expansão do seu mundo na sequela. É um excelente jogo por si só, influente e importante para a indústria. Apesar de não fazer nada de particularmente novo para o que um videojogo enquanto meio interativo possibilita, agarrou-se à sua história e contou-a com uma execução de fazer inveja aos restantes meios em que tanto se inspira – a TV e o cinema, acrescentado ainda uma pitada de visuais revolucionários para a sua era –, o final de vida da PlayStation 3/início da geração da PlayStation 4 com um remaster, garantindo assim o sucesso que hoje todos reconhecemos.

Segundo Neil Druckmann, a ideia deste relançamento surgiu durante o desenvolvimento da sua sequela, quando algumas sequências do final do jogo foram refeitas à altura das capacidades do seu novo motor de jogo, levantando a questão “como é que The Last of Us (o original) ficaria com os visuais e mecânicas do Part II?” Uma questão que qualquer fã ou apaixonado pela sequela faria, uma vez que existe uma enorme distância entre a fidelidade gráfica dos dois jogos e uma ainda maior a nível de level design e mecânicas de jogabilidade, elementos pelas quais Part II tanto me apaixonou.

The Last of Us Part I é um Remaster glorificado de um excelente jogo.

A ambição é alta, a fasquia no alto lá está e para lá se dirigiram as expectativas de muitos jogadores, inclusive a minha. Apesar de muitas fugas de informação, foram as palavras da Naughty Dog que falaram mais alto, numa tentativa de esclarecer com exatidão o que esperar de The Last of Us Part I, para além de chavões como “reconstruido para a PlayStation 5”, “suporte para resoluções 4K, 60FPS, áudio 3D e suporte para o DualSense”, mas que, no fim do dia, são difíceis de quantificar ou de justificar sem realmente colocar as mãos no jogo.

Se estamos a falar de um “remake” para a PlayStation 5, logo, todas estas características são basicamente obrigatórias, como é óbvio, mas para além dos visuais, extras e outras afinações, o que é que poderia The Last of Us Part I entregar para tornar o jogo que já conhecemos em algo novo? Bem, na verdade há várias coisas.

The Last of Us Part I apresenta-se, de facto, de cara lavada. A Naughty Dog converteu o seu jogo para o motor de jogo mais recente do estúdio, o que suportou Part II, e, a partir daí, adaptou-o de forma a oferecer uma maior consistência a quem vier experienciar os dois títulos um a seguir ao outro. Para tal, as cinemáticas que anteriormente eram pré-renderizadas (ficheiros de vídeo gravados) são agora em tempo real, quase todas redirigidas, com planos e movimentos de câmara mais fílmicos, mais bem iluminadas e com todos os modelos de personagens refeitos, assim como os ambientes, mais densos ricos e até com adereços da sua sequela.

O resultado é sublime. Mas nem sempre é imediato. A memória que temos do jogo original e da sua remasterização é embelezada por uma certa nostalgia, romantizada até, o que diz muito sobre as impressões que nos deixou, e é um testamento incrível ao trabalho da Naughty Dog no passado. Esta foi uma das razões pelas quais as primeiras imagens de The Last of Us Part I não me impressionaram logo. Felizmente, em tempo real, o jogo ganha outra profundidade, outra textura e os modelos e cenários refeitos refletem mesmo uma reconstrução cuidada e detalhada. Algo que é ainda mais prevalente quando comparamos a nova versão com a de 2014 para a PlayStation 4.

O jogo “refeito” faz-se sentir tanto em cinemáticas como nas porções jogáveis, com os ambientes mais densos e melhor iluminados, com texturas e geometrias mais complexas, que tornam o jogo verdadeiramente mais atual e próximo da sua sequela, com muitos cenários familiares a ganharem um novo brio, e uma sensação expansiva de espaço que anteriormente era impossível, mesmo quando o level design se mantém virtualmente o mesmo.

Comparativamente a Part II, no geral, The Last of Us Part I aproxima-se bem da sua sequela, mas somente com recurso a uma comparação lado a lado é que se denunciam as verdadeiras diferenças artísticas, especialmente nas cinemáticas e em ambientes do final do jogo, que aqui levaram mais uns claros retoques bem positivos. Relativamente ao resto do jogo, a apresentação, por vezes, está à altura e em alguns casos até mesmo melhor que Part II. Porém, também somos confrontados com momentos em que a apresentação não impressiona tanto como seria de esperar, muito por causa do tom e da direção do jogo original.

A componente audiovisual de The Last of Us Part I é, sem dúvida, a mais forte. É a que se destaca mais facilmente e a que se aproxima mais das ambições dos produtores em atualizar o seu jogo, mas tal revela também a extensão limitada das fundações deste “remake”. Logo a partir do início do jogo, quer a 30FPS ou a 60FPS (duas das três opções disponíveis, pois existe uma terceira para ecrãs com VRR – Variable Refresh Rate), há uma certa sensação de desconforto instalada, um uncanny valley que nunca senti que estivesse presente na sequela. Após algumas horas a refletir sobre isto enquanto jogava – e depois de assistir a um dos vídeos de bastidores, percebi que The Last of Us Part I reusa a captação de movimento do jogo original através de processos que hoje estão mais avançados e são mais precisos. Isto faz com que muitas das animações do jogo, nomeadamente das cinemáticas, tenham tido muito mais mão humana, com expressões e movimentos relativamente mais exagerados e animados, que nem sempre colam bem com a apresentação cinemática e foto-realista do jogo. Felizmente, este efeito foi algo que só causou estranheza no meu primeiro contacto com o jogo, até porque nas cinemáticas de momentos mais importantes, o carinho e o cuidado para elevar o desempenho dos atores é claro e a entrega de realização é sublime.

A componente audiovisual de The Last of Us Part I é, sem dúvida, a mais forte.

Da mesma forma, estes tipos de animações refeitas fazem-se sentir ao longo da jogabilidade, mas não chegam a atingir a fluidez ou a naturalidade de locomoção da sua sequela, algo que foi várias vezes mencionado como uma das ambições e promessas da equipa.

Talvez as minhas expectativas estivessem demasiado altas neste departamento, mas tal como o jogo original e a sua remasterização, a jogabilidade – apesar de retrabalhada – continua um dos aspetos que mais me desagrada em The Last of Us Part I. Era algo que esperava que tivesse sido completamente revisto ou adaptado às sensibilidades modernas estabelecidas pela Part II. Basicamente, Joel controla-se em 2022 como se controlava em 2013 – conta com as mesmas ações, os mesmos movimentos e até o mesmo arsenal. Pouco ou nada muda nas mãos da maioria dos jogadores que revisitam esta aventura. Há afinações feitas, há uma adaptação ao novo comando, temos a inteligência artificial dos inimigos e dos parceiros que é mais realista e imprevisível, mas, no geral, o que foi feito atrás das cortinas faz-se sentir pouco. Fazendo com que os únicos elementos transformativos desta experiência sejam as gimmicks sensoriais do DualSense que, apesar de bem implementadas (e de extrema importância para as novas funções de acessibilidade), não chegam para nos fazer sentir que estamos a jogar um jogo de nova geração.

Elementos mecânicos como prone ou desvio de inimigos, que eram chave para a sobrevivência em The Last of Us Part II, aqui estão simplesmente ausentes até nas sequências com Ellie. Mas em defesa do jogo, o protagonista principal, Joel, é um indivíduo mais lento e o level design do jogo não justifica funções como o prone em ações furtivas. Contudo, a falta daquela fluidez e rapidez da sequela faz-se sentir bastante, e esses avanços seriam muito bem-vindos neste jogo. Da mesma forma, Part I não conta com a mesma verticalidade da sequela, o que faz com que a jogabilidade não seja tão diversa ou expansiva durante os encontros com inimigos, limitando a criatividade do jogador.

Uma vez que estamos perante um remake, com oportunidade de mudar ou acrescentar algo de refrescante, teria sido interessante ver a Naughty Dog a experimentar com mais uma ou outra área nova, abrindo ambientes, ou apresentando novos confrontos.  Em vez disso, a Naughty Dog jogou pelo seguro com uma conversão quase direta do jogo e, quando se preocupou em acrescentar algo de novo à experiência, limitou-se a coisas da sequela como as suas animações hiper-detalhadas de upgrades do nosso arsenal, um elemento giro e imersivo onde podemos ver as armas de forma mais íntima, mas que no fim do dia são um excesso que, depois das primeiras atualizações, tornam-se um inconveniente quando “queremos despachar serviço”.

The Last of Us Part I é estruturalmente o mesmo que o original. Muito cinemático, extremamente emocional, mas linear e sem surpresas para jogadores que estão de regresso. Os níveis são os mesmos, as situações são as mesmas e nem o DLC incluído, Left Behind, foi inserido durante a história, mantendo-se um episódio separado, em jeitos de spin-off, acedido através do menu principal do jogo. No mínimo, uma opção para o efeito teria sido fantástica, até porque, na minha opinião, é uma missão tão pequena que não quebraria o ritmo narrativo e ofereceria uma satisfação maior aos momentos finais do jogo.

Apesar de ser praticamente o mesmo jogo, The Last of Us Part I vem carregado de novidades dignas de mencionar, muitas funcionalidades novas e muitos extras. Os menus unificados são virtualmente os mesmos da sequela; temos imensas opções de acessibilidade extremamente úteis para afinar o jogo à nossa medida, como a incrível opção de apanhar itens de forma automática, ou o modo que permite sentir os diálogos através da vibração da personagem; há novos modificadores de jogo; novos desbloqueáveis como roupas para as personagens cheias de adoráveis easter-eggs para os fãs da PlayStation; novos modos de speedrunning e de permadeath; comentários de realização por parte de Neil Druckmann, Ashley Johnson e Troy baker; e até o modo de fotografia foi melhorado, onde se destaca a adição de luzes dinâmicas, mas aqui deixo uma pequena crítica à forma pouco intuitiva e limitada de como podemos mover a câmara. Enquanto fã deste modo, sinto que a Naughty Dog deu um passo em frente, outro atrás.

Tivesse sido esta a primeira vez que joguei The Last of Us Part I, provavelmente estaria na lua, deslumbrado com esta experiência. No entanto, tendo passado a sua história para aí uma dezena de vezes, esta foi apenas mais uma. Uma viagem mais bonita, sem dúvida, interessante em diferentes momentos após conhecer os eventos de Part II, mas no fim de contas foi apenas mais uma, onde a meio me questionei porque razão este lançamento é exclusivo da PlayStation 5.

Apesar de The Last of Us Part I ter lançamento na PlayStation 5, não se faz sentir suficientemente “next-gen”.

Com o PC no horizonte, espera-se que essa versão tenha um nível de otimização escalável a diferentes hardwares, dos quais nem sempre primam das vantagens existentes da PlayStation 5 e, olhando para a fasquia que The Last of Us Part II levantou e atingiu, não sinto que este remake seja “next-gen” o suficiente para não ter um lançamento na geração anterior. Talvez até seja esse o plano da Sony Entertainment Interactive, mas quando três dos maiores lançamentos novos de 2022 tiveram lançamento de Dia 1 em formato cross-platform (Horizon Forbidden West, Gran Turismo 7 e God of War: Ragnarok), o relançamento exclusivo de The Last of Us Part I na PlayStation 5 pode ser um pouco questionável.

Questionável é também o preço de 79,99€, o valor padrão de novos lançamentos para a consola da Sony, e que foi alvo de duras críticas pelos jogadores. Vale o que vale e é, de facto, elevado, seja para um jogo novo ou para um jogo antigo. Mas no fim do dia, não serei eu a julgar a decisão do jogador. The Last of Us Part I é um produto completamente novo, não há dúvidas disso, e para quem nunca jogou o original, esta será uma experiência nova e moderna. Já para quem está de regresso, o valor pedido é uma fatia de bolo que poderá ser difícil de engolir, pelo que diria para esperarem por uma eventual promoção se quiserem reviver esta aventura.

Admito que estava preparado para defender The Last of Us Part I com unhas e dentes em vez de cair recorrentemente no barco do cinismo, até porque acredito no potencial de remakes e remasters. Estes são uma excelente porta de entrada para novos jogadores e um mimo para os fãs que têm a oportunidade de testemunhar um cenário “e se o meu jogo favorito fosse moderno?” Estes jogos podem até ser importantes para preservação, especialmente quando os ditos títulos não estão disponíveis nas plataformas mais recentes. Mas The Last of Us Part I, (in)felizmente, não é o caso, até porque o remaster pode ser jogado na PlayStation 4 e na PlayStation 5. Contudo, a sua qualidade de apresentar o aclamado jogo a uma nova geração de jogadores mantém-se.

The Last of Us Part I continua inquestionavelmente um excelente jogo e este relançamento pode-se definir como uma versão definitiva desta aventura mais humana, íntima e pessoal da Naughty Dog. Mas no que toca às suas ambições e promessas, não consigo afastar o sentimento de que podia ir mais além, porque apesar do gigante esforço e da dedicação da Naughty Dog em recriar o jogo, nas mãos do jogador corre o risco de se fazer sentir a apenas como um “The Last of Us em 4K”.

The Last of Us Part I tem lançamento exclusivo na PlayStation 5 no próximo dia 2 de setembro e estreia-se nos PCs em breve.

Cópia para análise cedida pela PlayStation Portugal.

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