RoboCop: Rogue City

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Apesar dos seus problemas de desempenho e de alguma falta de polimento, Robocop: Rogue City é uma delícia para os fãs e um bom jogo de ação para quem procura apenas uma experiência violenta e envolta em humor negro.

Mais do que uma sátira ao consumismo desenfreado e à influência desconcertante das grandes corporações na vida política, RoboCop (Paul Verhoeven, 1987) é uma história sobre humanismo. Podemos parafrasear o seu humor negro e identificar a forma como Ed Neumeier e Michael Miner conseguiram prever o futuro corporativo e permanentemente digital em que vivemos atualmente, mas a sua maior vitória está na forma como desenvolveram a história sobre um homem sem corpo. Entre a ação sangrenta e cultura yuppie da década de 1980, encontramos um homem aprisionado a uma máquina, reprogramado, sem memórias e transformado num produto. Mas mesmo sem corpo, sem passado ou livre arbítrio, o homem suplanta a máquina e renasce como um novo ser – metade homem, metade máquina, mas vivo.

Foi a dicotomia entre homem e máquina que elevou RoboCop a filme de culto, suplantando as suas raízes no cinema de série B, com a sua ação visceral e temas futuristas, para se transformar numa franquia que já se expandiu por várias sequelas, spin offs e adaptações para videojogos e banda desenhada. Em 36 anos, Alex Murphy e RoboCop foram convertidos em ícones da cultura pop e defendo que isso seria impossível sem esta luta entre o homem e a máquina. Se começamos por vibrar com a ação e a violência do filme, dirigidas pelo olhar meticuloso e frenético de Paul Verhoeven, terminamos a sentir uma enorme ligação à luta interior de Murphy enquanto este recupera a sua humanidade. Acompanhamos a sua ressurreição enquanto as memórias surgem através de sonhos e pintam o retrato da sua vida pré-transformação, onde conhecemos vagamente o antigo polícia e pai de família por detrás do capacete de metal. Começamos a montar as pistas enquanto RoboCop, ainda sem compreender que já foi Alex Murphy, revisita a sua casa, agora abandonada, e vê ecos do passado, como o seu filho a pedir para tirarem uma fotografia de família e a sua mulher a dizer-lhe o quanto o ama. E, por fim, sentimos a frustração na personagem, que não consegue ainda compreender as memórias que está a redescobrir, com o homem a surgir através do desconforto que vemos na excelente representação de Peter Weller. Um soco no monitor da imobiliária: uma reação humana.

O primeiro filme, lançado em 1987, termina com RoboCop a responder a uma questão. Depois de eliminar Dick Jones no duelo final, o CEO da OCP, sempre identificado como Old Man, elogia o polícia ciborgue pelo seu desempenho e pergunta-lhe qual é o seu nome. Sem pensar duas vezes e com um sorriso na cara – agora sem o seu capacete icónico -, o antigo polícia não hesita e responde: “Murphy”. O processo de ressurreição estava terminado, o seu arco concluído. Um final tão forte como problemático para as sequelas que tentariam expandir o universo de RoboCop. A primeira sequela, realizada por Irvin Kershner e escrita pelo infame Frank Miller, tentou expandir a realidade de Detroit e aprofundar a construção de Delta City, o grande projeto da OCP para a cidade norte-americana. O guião de Miller, famosamente cortado e readaptado devido aos seus excessos, é ainda mais cruel no seu retrato de Detroit, agora repleta de gangues e de ruas contaminada por uma nova droga altamente viciante: Nuke. Entre personagens mal desenvolvidas e pontos narrativos mal explorados, a sequela tenta enriquecer o crescimento de Murphy enquanto homem preso a uma máquina, recuperando a família do polícia numa tentativa de adicionar algum desafio à sua nova existência – mas sem sucesso.

Apesar de ser a sequela mais fraca, ao ponto de considerar a mini-série para televisão superior – intitulada RoboCop: Prime Directives, lançada em 2001 -, RoboCop 3 mantém o foco em Alex Murphy e consegue desenvolver a sua personalidade através das suas diretrizes principais: “serve the public trust, protect the innocent, uphold the law“. Com a OCP na bancarrota e à procura de comprador, o desenvolvimento da Delta City é agora uma prioridade. Isto significa que milhares de pessoas ficarão sem casa à medida que a mega-corporação se apodera de bairros inteiros para despejar os seus moradores. A polícia é ineficaz neste processo, também ela controlada pela OCP, e é um grupo de mercenários que comanda os despejos e o processo de reabilitação dos moradores de Detroit. RoboCop é um produto da OCP, dividido entre o seu dever enquanto polícia e as suas diretrizes, incapaz de se revoltar contra a corporação que o criou (a diretriz 4 assim o garante), mas também movido pelo seu sentido de justiça. Com a morte de Lewis, a sua parceira, e deixado às portas da morte, RoboCop é reprogramado e passa a agir nas margens da lei contra a OCP numa tentativa de parar o desenvolvimento de Delta City. Um mau filme que desenvolve RoboCop enquanto homem, polícia e membro de uma comunidade, reafirmando a sua humanidade.

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30 anos depois, RoboCop: Rogue City encontra o mesmo desafio: como dar continuidade à história de Alex Murphy sem cair nos erros das sequelas? Para a Teyon, a resposta está em abraçar a personagem sem tentar desmistificá-la, encontrando um meio-termo interessante entre a honestidade do primeiro filme e os exageros das sequelas. Desta forma, o tempo volta atrás, com a história a ignorar o terceiro filme e a decorrer algures depois dos acontecimentos de RoboCop 2. Existem referências constantes à droga Nuke e até a Cain, o vilão do segundo filme – também ele transformado num ciborgue na reta final da sequela –, mas RoboCop: Rogue City abraça apenas as referências para se assumir corajosamente como a continuação para o final do filme de Verhoeven. Os gangues continuam a povoar as ruas, o humor mantém-se mordaz e negro, mas as ruas de Detroit recuperam o seu realismo cru, com prédios abandonados e decrépitos; sem abrigos que tentam sobreviver; vândalos que expressam as suas frustrações através de graffitis e uma enorme sensação de perigo entre o fumo que sai das sarjetas e os becos mal iluminados da cidade à beira da falência.

Em RoboCop: Rogue City, reencontramos o homem por detrás da máquina, mas sentimo-lo mais seguro na sua identidade enquanto Alex Murphy. A OCP relembra-o constantemente que é uma máquina, mas Murphy sabe que é muito mais do que isso, agora ainda mais experiente e seguro com a sua nova existência, equilibrando as suas funcionalidades cibernéticas com o livre arbítrio restaurado, onde até o seu sentido de humor parece ter voltado à vida. Mas esta segurança não é reflexo de um equilíbrio emocional e Murphy é novamente assombrado pelas suas memórias. Há um novo vilão na cidade de Detroit que está a tentar unir os gangues e a causar o caos, um vilão diferente, mais meticuloso e mesquinho do que Clarence Boddicker e Cain – talvez algo mais próximo a Dick Jones, sem entrar em spoilers –, e é na busca por respostas que Murphy é assaltado por memórias que não controla. A realidade e o sonho misturam-se na sua mente, ao ponto de ficar incapacitado e sem resposta. Depois de tantos anos, o homem parece estar a prejudicar a máquina. Estará RoboCop obsoleto?

Apesar de não existirem surpresas fortes na campanha de RoboCop: Rogue City – isto se não quisermos contar com todas as referências que os fãs irão encontrar e que farão as delícias de todos aqueles que conhecem os dois primeiros filmes –, a narrativa destaca-se pela forma como combina a dualidade de Murphy enquanto RoboCop com a busca pelo novo vilão. Ao contrário de outras adaptações, RoboCop: Rogue City traz um maior foco na investigação e em Murphy enquanto polícia, com a história a levar-nos numa sequência de missões onde temos de investigar locais de crime, encontrar pistas e resolver um mistério que se expande além das ruas de Detroit. É refrescante ver esta abordagem que procura ir além da ação e da violência que caraterizam a série – ainda que estejam presentes, claro, já que o videojogo é bastante violento e sangrento no seu combate, ao ponto de deixar um sorriso sádico no rosto de Verhoeven –, construindo uma jogabilidade mais variada através de missões secundárias que desenvolvem a cidade e a personagem através deste foco no processo policial.

A adição de escolhas narrativas, por vezes meramente contextuais e sem impacto, ajuda a criar a ilusão que estamos a moldar Murphy à nossa vontade, mas também a dar-lhe voz sobre as pistas que encontra e sobre as personagens com quem interage ao longo da campanha. Não são sistemas profundos que requerem um número intenso de mecânicas e sistemas para funcionarem, mas servem a narrativa de RoboCop: Rogue City e procuram dar alguma vida e variedade a uma personagem pouco ou nada desenvolvida ao longo dos seus filmes e adaptações. No entanto, existem momentos em que as nossas escolhas têm algum impacto. Podemos, por exemplo, multar ou perdoar um jovem que faz graffitis. Se decidirmos multá-lo, iremos encontrar um graffiti pejorativo na reta final da campanha, com o jovem a demonstrar a sua raiva por RoboCop. O mesmo é sentido na forma como lidamos com Pickles, um criminoso e informador que nos acompanha ao longo de várias missões, o qual podemos ajudar a superar o seu vício. Quando RoboCop: Rogue City tenta ir além destas pequenas decisões, como a nomeação do próximo presidente de Detroit, as escolhas são mais inconsistentes e nem sempre claras. Um primeiro sinal da ambição da Teyon.

A campanha divide-se por vários hubs principais. O primeiro é a esquadra de Detroit, que funciona como base de operações para Murphy, o local onde regressamos no final de cada missão. Na esquadra, temos a oportunidade de interagir com personagens saídas diretamente dos filmes, como o Capitão Reed e os agentes Chessman, Ramirez, Estevez, entre outros. Os cenários são retratados com uma fidelidade impressionante e não tenho problemas em admitir que fiquei com o coração cheio ao reconhecer a layout da esquadra e todos os seus locais de destaque – ainda que existam algumas omissões, como seria de esperar. A carreira de tiro, a cela de RoboCop, a entrada da esquadra – onde Murphy apanha as chaves do carro pela primeira vez e entrega Boddicker depois da incrível sequência na fábrica de droga no primeiro filme –, a sala dos servidores (talvez a secção que foi mais prejudica nesta adaptação, aqui mais pequena em comparação) e até a garagem: é possível perdermos uma hora inteira a absorver todos os pormenores e a compararmos diretamente com o filme.

A esquadra surge como a segunda casa de Murphy, onde todos os seus colegas, conhecidos dos filmes ou introduzido em Rogue City, seguem as suas rotinas e interagem com o polícia ciborgue como se fosse um deles. Conseguimos sentir a camaradagem entre os polícias e penso que seja isso que desculpa a falta de criatividade em algumas das missões, ainda que RoboCop: Rogue City consiga sempre surpreender através do seu humor. Numa das missões, por exemplo, temos a possibilidade de ajudar um colega a resolver queixas dos habitantes de Detroit. Uma dessas queixas envolve um criminoso que se quer entregar para ficar com a recompensa. Outras missões requerem algo mais básico, como transportar um bêbado para a sua cela. No entanto, Rogue City não fecha os olhos à realidade e existem momentos mais dramáticos e pessoais, onde temos de recolher os bens de um colega que foi morto em serviço: o mesmo que aconteceu a Murphy anos antes. A combinação entre diferentes tons nem sempre resulta, mas sentimos que a Teyon compreende o que move a personagem.

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O destaque vai, no entanto, para a forma como a Teyon aproveitou a esquadra para desenvolver Murphy enquanto personagem. As suas falhas estão a prejudicar o seu desempenho e a OCP não pode permitir que o seu produto mais valioso não funcione a 100% – nem que seja para evitar possíveis escândalos e má publicidade. Para garantir que Murphy continua a cumprir o seu trabalho sem percalços, a OCP exige a análise do seu desempenho no final de cada missão, introduzindo um sistema de pontuação que influencia o número de pontos de experiência que arrecadamos. Mais importante, a OCP contratou uma psicóloga, a Dra. Blanche, para ajudar Murphy a compreender os seus sonhos e a tentar superar as falhas que prejudicam o seu sistema. Em pontos específicos da campanha, temos a oportunidade de analisar os acontecimentos que vivemos até então e a repensá-los através da perspetiva de Muryphy, incluindo as suas memórias passadas. São momentos marcados por algumas escolhas narrativas que precisavam de maior impacto na jogabilidade e no desenvolvimento da campanha, mas são um passo na direção certa porque tratam a personagem com respeito.

Isto porque a Teyon parece compreender o que torna Murphy num protagonista tão trágico, como interessante. Para a Teyon, esta é a resposta para a problemática narrativa da série: assumir Murphy enquanto um homem preso numa máquina, seguro da sua identidade, mas para sempre assombrado pelo seu passado. Não é um passo em frente, mas antes um reforçar dos elementos que as sequelas parecem ter ignorado em prol de outros pontos que não expandiram Murphy enquanto personagem. A Teyon recusa o ruído e o excesso para se focar no homem. Mesmo com os seus problemas, é uma aposta mais positiva do que negativa em todos os sentidos.

O segundo hub é uma secção extensa da cidade de Detroit. RoboCop: Rogue City não é um mundo aberto, mas Detroit funciona como um microcosmo que consegue captar o melhor e o pior da cidade nesta realidade futurística. As missões secundárias convidam-nos a explorar todos os recantos dos quarteirões, mas o design intuitivo e muito equilibrado da cidade – com bom feedback visual onde sabemos sempre onde estamos devido à utilização de monumentos que nos guiam ao longo da cidade – é enaltecido pela estética retro futurista apresentada no primeiro filme. Os cinzentos contrastam com o néon dos placards, as poças de água refletem as estruturas sujas e decrépitas dos complexos de apartamentos, e os efeitos volumétricos adicionam algum mistério e até melancolia à cidade desgraçada. Entre as ruas sujas, encontramos algumas zonas de interesse, como um salão de jogos e um clube de vídeo repleto de referências. São os pormenores que dão vida a uma Detroit que é mais do que apenas um momento de passagem na campanha.

O que achei mais impressionante foi a forma como Detroit evoluiu ao longo da campanha. Se começamos com uma primeira visita noturna, à procura de Soot e do seu gangue, depressa reencontramos Detroit durante a manhã e a tarde. A iluminação diurna transforma a cidade e dá-lhe mais vida, reforçando não só a sujidade das suas ruas, mas também o dia a dia dos seus habitantes. Acima de tudo, Detroit não é uma cidade estática e foi isso que me surpreendeu em RoboCop: Rogue City. Não se trata apenas de diferentes momentos do dia, temos também o decorrer da campanha eleitoral, com a cidade a ficar progressivamente mais decorada, ou então momentos mais inesperados, como a limpeza do banco após uma missão secundária. Para um jogo com tantos problemas de desempenho, RoboCop: Rogue City compensa nestes elementos visuais e narrativos.

Detroit pode ser o destaque, mas a campanha constrói-se entre os cenários mais expansivos e momentos mais lineares e centrados na ação. O foco na investigação e nas mecânicas RPG, como a inclusão de missões secundárias, acabam por limitar o level design de RoboCop: Rogue City quando a ação ganha finalmente destaque, mas é um problema que só é sentido se tiverem expetativas erradas. RoboCop: Rogue City não é um revivalismo do género e muito menos segue a estrutura totalmente linear que popularizaram os mais recentes FPS – e muito menos é semelhante ao jogo anterior, produzido pela Titus e lançado em 2023 -, mas são funcionais na sua combinação entre arenas de combate – com alguma verticalidade, como plataformas ou andares superiores que temos de navegar – e os momentos de investigação. Existem ainda alguns puzzles ambientais para resolvermos, tal como colecionáveis, mas arrisco-me a dizer que RoboCop: Rogue City é mais contemplativo do que se esperaria e existe alguma catarse em navegar as zonas silenciosas e abandonadas após as sequências de ação.

RoboCop: Rogue City abraça a nostalgia e não tem quaisquer problemas em dar aos fãs o que eles querem, na medida em que as suas referências e a reutilização de zonas icónicas da séries façam sentido dentro da campanha do jogo. Um desses cenários é o Steel Mill, o complexo industrial onde Alex Murphy foi assassinado. A zona é construída por trechos exteriores e edifícios que expandem a ação e a exploração para níveis um pouco mais labirínticos. Os momentos de combate também ganham alguma complexidade necessária através da apresentação de motoqueiros, cujas motos podem ser destruídas, e de snipers que atacam de longe, tal como sequências com campos de mina que mudam a forma como nos movimentamos pelos cenários que pensávamos já conhecer. É difícil não louvar a forma como a Teyon expandiu estas zonas que vimos no primeiro filme e adicionou elementos decorativos e narrativos que relembram alguns cenários mais icónicos – como o local onde Murphy é apanhado de surpresa por Boddicker e o seu gangue ou o seu confronto final com o vilão, sobre um manto de água (ainda que possa estar a interpretar mal o que vi no jogo, tal é o meu entusiasmo com o jogo).

Com uma narrativa suficientemente interessante e um bom retrato visual da ambiência do primeiro filme, RoboCop: Rogue City só precisava de se mostrar competente na sua jogabilidade para assumir-se como a melhor adaptação de RoboCop nos videojogos, mas a Teyon traz-nos um sistema de mecânicas bastante limado para o seu baixo orçamento. Como seria de esperar, RoboCop é um monstro. É pesado, lento e sentimos todos os seus movimentos enquanto jogamos. Noutro jogo, isto seria um enorme problema, mas aqui não. Não só Rogue City consegue emular os movimentos e caraterísticas da personagem, como o combate e o level design mais linear – e as suas zonas de combate menos extensas – enaltecem o ritmo de RoboCop e não o oposto. É um caso onde a produtora compreendeu muito bem a franquia e conseguiu adaptá-la a nível mecânico para compreender o que funciona e o que não funciona com RoboCop.

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Fora a movimentação, temos à nossa disposição o sistema de mira clássico de RoboCop. Quando pressionamos o botão L2, temos acesso a um zoom ligeiro, mas também à visão do polícia ciborgue, onde cada inimigo fica identificado por um contorno esverdeado. O sistema de mira utiliza exatamente o mesmo esquema do filme, até os efeitos sonoros, ainda que seja mais um ponto estético do que mecânico – já que a mira real não é aquela que incide sobre os inimigos para os identificar. A Auto-9 podia ter mais impacto visual e sonoro, mas é excelente de utilizar, com a sua movimentação a ser fluída e adaptada para o comando da consola. A arma icónica de RoboCop também pode ser melhorada através de chips que colecionamos ao longo da campanha e é capaz de ficar tão poderosa que suplanta qualquer outra arma disponível no jogo. Mas se quiserem alguma variedade em combate, Rogue City dá-vos a possibilidade de roubarem as armas aos inimigos e utilizarem micro-uzis, AKs, shotguns, lança-granadas, entre outras armas.

Tendo em conta a estrutura da campanha e a presença de missões secundárias, tal como um sistema de pontuação, não é uma surpresa encontrar mecânicas RPG em RoboCop: Rogue City. Ao todo, temos oito atributos que nos permitem evoluir RoboCop à nossa vontade, com cada um desses atributos a dar-nos a possibilidade de desbloquearmos habilidades únicas. RoboCop: Rogue City não é muito surpreendente na forma como introduz as suas habilidades e atributos passivos, mas funcionam bem com a jogabilidade mais pausada do jogo. No que toca a habilidades, temos a possibilidade de desbloquear um dash curto, utilizar uma onda de choque para afastar inimigos, abrandar o tempo ou então outras opções de suporte, como a possibilidade de recuperarmos energia através de outras fontes de energia ou fazer hacking a equipamentos de inimigos. Os atributos passivos influenciam mais a percentagem de dano que podemos receber, a quantidade de balas que fazem ricochete para evitarmos dano, a possibilidade de arrombar cofres sem termos o código, desbloquear a localização de recursos/itens no mapa, entre outros. O suficiente para ser tudo funcional.

RoboCop: Rogue City não é um jogo perfeito, mas é difícil não admirar a dedicação da Teyon em criar uma das adaptações mais interessantes da série. No entanto, é impossível defender alguns dos seus problemas técnicos. Em alguns momentos, RoboCop: Rogue City é impressionante. Os cenários são detalhados, a iluminação é consistente e a sua proximidade aos cenários reais é de louvar, mas o mesmo não pode ser dito dos modelos das personagens. O design de RoboCop é clássico e aqui surge em todo o seu esplendor, sem adições ou redesigns, mas as suas dimensões são estranhas e não tem a presença que deveria ter. Os seus movimentos são pouco fluídos ou naturais para a personagem, como se as pernas não conseguissem acompanhar o ritmo dos passos e o modelo parecesse ser um boneco desfasado.

A direção de cena também não é muito competente, apostando em planos gerais que dão destaque a estes problemas, em vez de optar por algo mais intimista e aproximado para dar outra grandeza às personagens e aos cenários – algo que o primeiro filme fez tão bem através da direção de fotografia de Jost Vacano. Como está, a direção de RoboCop: Rogue City é aborrecida, sem profundidade ou textura. Depois temos os inúmeros bugs, os pop-ins e pop-outs constantes, o stuttering e dithering, o lip-sync arcaico, as personagens sem expressão ou vida e as cutscenes cheia de soluços e que às vezes nem são ativadas no tempo correto – ou então acontecem na ordem errada. Infelizmente, a banda sonora também não é memorável, demasiado ambiente e relegada a composições de fundo que pouco pontuam o tom da campanha. A salvaguarda é a utilização do tema de Basil Poledouris em momentos chave, uma lufada de ar fresco que injeta níveis impossíveis de nostalgia. Precisávamos de mais elementos clássicos ou então de uma banda sonora forte, onde até os efeitos sonoros – como os passos e movimentos de RoboCop – podiam ser melhorados.

É difícil escrever objetivamente sobre RoboCop: Rogue City. Não escondo a minha adoração pelo primeiro filme – talvez o primeiro que gravei em VHS há 32 ou mais anos atrás e que levava comigo para todo o lado como se fosse um dos meus brinquedos – e o quão adoro a personagem. Apesar dos seus problemas, RoboCop: Rogue City é a concretização de algo que julgava ser quase impossível: uma adaptação fiel da série ao mundo dos videojogos, depois de décadas de lançamentos pouco memoráveis ou intemporais. É difícil ficar indiferente a um jogo que jorra tanto carinho e respeito pela série. Um jogo que começa exatamente como o primeiro filme, com o noticiário Media Break e a presença de Casey Wong; cujo title screen, apesar de mal feito, procura emular a apresentação do primeiro filme; como posso ignorar as referências ao jogo Nukem; às armas que Clarence Boddicker e o seu gangue usam no ataque na Steel Mill; ao retrato fiel da casa de Murphy; à reconstrução de sequências do filme; ao regresso de Peter Weller no papel de Murphy, ainda que um pouco diferente daquilo que esperava; até a utilização dos zumbidos eletrónicos que acompanham os movimentos de RoboCop. Podia dedicar vários parágrafos a todas as referências que a Teyon conseguiu introduzir de forma orgânica ao longo da campanha.

Os seus problemas não são desculpáveis, mas diverti-me muito com este regresso a Detroit. As missões secundárias podiam ter mais força, mas desenvolvem as personagens secundárias e expandem o mundo de RoboCop: Rogue City – como a missão em que ajudamos Ulysses, um polícia novato, na sua primeira patrulha; o combate precisava de maior variedade para além das arenas com inimigos parados a dispararem contra nós; as habilidades são interessantes, mas é fácil esquecer-nos que elas existem; a direção de arte é impressionante na forma como capta o estilo do filme original, mas tudo o resto é problemático.

Apesar desta dualidade, tal e qual a dicotomia “homem-máquina” que acompanha a série, RoboCop: Rogue City é um jogo repleto de boas intenções e boas ideias que precisavam de um orçamento à altura. Mas a Teyon tentou, arriscou e conseguiu dar aos fãs de RoboCop um jogo divertido e que respeita o legado da personagem. No fundo, como Murphy diz no final de RoboCop 2, “somos apenas humanos”. Há sempre a possibilidade da Teyon resolver estes problemas numa sequela. Por agora, trouxe-nos um jogo perfeito para os fãs. Uma vitória que parecia ser impossível.

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Cópia para análise (versão PlayStation 5) cedida pela Upload Distribution.

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