Franz Ferdinand no Campo Pequeno – Vale a pena fazer álbuns de êxitos

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Afinal, um concerto em modo “greatest hits” tem toda uma razão de ser.

Após minutos de espera a seguir à primeira parte assegurada pelos Medicine Cabinet, jovem banda de Glasgow, cidade dos titulares, e que tem o gosto de fazer rimas com Persol (“Factor 50!”), a multidão do Campo Pequeno foi brindada rigorosamente às 21h30 com um anúncio bizarro em castelhano (fruto com certeza dos últimos concertos), luzes ligadas atrás de um pano à frente do palco, e as guitarradas de “The Dark of the Matinée”, público logo aos saltos, coros de “Find me and follow me through corridors, refectories and files”, antes de pausa para fazer referências à BBC 2 e ao grande Terry Wogan. Os Franz Ferdinand explodiram nas capas físicas e virtuais ao mesmo tempo que várias outras bandas conotadas com um revivalismo de rock de garagem, mas sempre tiveram, além dessa energia primordial, uma carga de referências culturais diferente das outras, desde o nome da banda à estética dos discos, como é no caso da homenagem ao poster do grito de “Livros” do Soviético Alexander Rodchenko, para a capa de You Could Have It So Much Better.

Também por isso, mas não apenas por isso, são os grandes sobreviventes do naipe, com a acusação de banda “arroz” a sempre soar algo bizarra, não obstante a discografia recente mais oscilante. Em especial, pela preocupação desde sempre da banda em criar música que todos pudessem dançar (“music girls can dance to”), mantra tantas vezes dito e tão poucas vezes sentido. O carisma puro de Alex Kapranos, carisma puro com sapato bem bicudo (e joanetes?), camisa azul de tecido brilhante, é também muito responsável por garantir salas deste tamanho cheias quase 20 anos depois de “Darts of Pleasure”, o single que os levou a ser considerados a melhor coisa a sair da pop das ilhas britânicas desde His ‘n’ Hers dos Pulp (diz que voltam em 2023, não é?) – referência a artigo da Blitz circa 2003 ou 2004 com o qual é difícil discordar, e as capas da NME confirmam.

Kapranos tem envelhecido que nem vinho do Porto e, na 4ª vez em que vemos a banda (de memória, 2006 no Super Bock Super Rock ainda no saudoso recinto do Parque Tejo, 2009 já no Campo Pequeno, e 2014 em Paredes de Coura, num vasto lote de atuações em Portugal), este terá sido o espectáculo onde ele teve maior mestria na liderança do público que estava ali para ser agarrado. A península instalada no palco foi solução inteligente que usou várias vezes (às vezes sozinho, às vezes acompanhado) para garantir maior intimismo com os presentes na plateia (os degraus montados no palco que muitas vezes foram usados para ter os quatro guitarristas/baixista ao mesmo tempo em linha), quais Krafwerk com sangue a bombar pelo coração.

Num alinhamento de 18 músicas, à semelhança dos últimos concertos, e de tempo rigorosamente cronometrado (ao fim de uma hora certa fizeram a pausa antes do encore), “Walk Away” foi um dos primeiros pontos altos, depois da mudança de guitarra fora de tom, coro da multidão em uníssono. Depois, “Do You Want To” resulta numa verdadeira bomba atómica, com ruído absurdo (o mais alto do público que ouvimos na praça de touros), a resposta trintona à loucura adolescente por Billie Eilish que ouvimos em 2019 no Altice Arena. “Michael” aguentou a responsabilidade de seguir um mega êxito e “Love Illumination” foi respiração boa antes do regresso aos dois inacreditáveis discos iniciais, best of em si mesmos, com “The Fallen”. Em palco pelos Escoceses, Dino Barbot na guitarra, Julian Corrie nas teclas e da guitarra, e Audrey Tait na bateria juntam-se ao sobrevivente Bob Hardy no baixo. Alinhamento que, nos últimos anos, tem sofrido várias alterações, mas que resulta coeso e não faz recordar com saudade tempos do passado. Noutra nota curiosa, os nomes de cada um estão escritos a letras vermelhas pelas colunas no palco. Têm olho.

“Take Me Out” é outro momento de loucura – mira a ser projetada virtualmente para a galeria – homenagem ao filme “Inimigo às Portas” evidente paras os mais conhecedores, e em consequência a resposta a fazer as paredes de tijolo a abanar. “Outsiders” vai buscar outras referências históricas “I’ve seen some year, But you’re still my Caesar”, enquanto Kapranos faz golpes de judo. A seguir, o já tradicional momento multi baterista, com Audrey Tate a saltar para uma nova enquanto os restantes moços se divertem na grande montada em palco. Pós pausa e, como suposto, mais três: a nova “Billy Goodbye”, “Always Ascending”, e obviamente “This Fire”, a música do vídeo do diamante antes do coro pirómano. Aqui destilada, longa, a fazer render a comunhão com os presentes que sabem que é o fim da festa, e é um grande fim, num espectáculo seco no tmepo mas pleno de emoção.

Antes do concerto discutia-se que o conceito de “greatest hits” não tem grande cabimento, em especial no dias de hoje, em que as vendas físicas não são o bolo da receita dos artistas. Mas se servir de desculpa para concertos com este nível, ninguém quer saber.

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