Duran Duran no Rock in Rio Lisboa – Altamente recomendáveis hoje, depois de muito aceitáveis nos 80s

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Um belíssimo concerto.

Ver os Duran Duran no Parque da Bela Vista é uma experiência bem diferente do concerto épico de 2005 no Coliseu dos Recreios, cheio de fiéis para receber a tournée de promoção de Astronaut a apadrinhar o regresso do filho pródigo John Taylor, baixista poster boy dos anos 80 pintados em tons de acrílico. Raro momento em que voltou o alinhamento original dos Fab Five, alcunha dada pela imprensa numa altura em que eram comparados aos The Beatles e constituiam uma das pontas de lança da segunda British Invasion musical aos EUA, transportados pelo satélite da MTV.

Pouco tempo depois, Andy Taylor, talvez o elemento mais rockeiro e um dos mentores do super-grupo The Power Station, saiu, e é em modo quarteto que se têm apresentado nos últimos anos. E neste concerto será, arriscamos escrever, diminuta a percentagem de espectadores que tem conhecimento da escala do estrelato a que o grupo chegou. Poucos terão noção dos anos desde as origens na pouco sexy Birmingham até ao estrelato global, em que Andy Warhol os ia ver e admirar, e que foram otimamente retratados pelo escritor Neil Gaiman no livro de 123 páginas The First Four Years of the Fab Five.

Também não serão muitos a acompanhar uma última década bem rica de trabalho em estúdio, com os álbuns All You Need Is Now (o filho espiritual de Rio), Paper Gods e o recente Future Past, e que lhes deu estatuto renovado em meios mais eletrónicos. Estatuto que lhes garante, por exemplo, um espetáculo no passado mês de maio no Ushuaïa de Ibiza.

Talvez até por isso, os Duran Duran não são máquina ferrugenta que tenta voltar à estrada para tocar os êxitos e ganhar uns trocos (rigorosamente nada contra, desde que seja feito com competência), mas sim um grupo coeso, na plenitude das capacidades, com maturidade para perceber o ambiente, e se está a jogar em casa ou fora. Como reforços, Simon Willscroft no saxofone, Anna Ross e Rachael O’Connor nos coros, e Dom Brown na guitarra elétrica.

Aqui estamos fora do nosso ambiente caseiro, mas não faz mal. O Palco Mundo é, de facto, fabuloso para concertos de grande escala, e o vocalista Simon Le Bon aproveita-o bem. Tal como em 2005, em que não houve artista de abertura, aqui ataca-se logo com a cavalaria toda. Em vez de “(Reach Up for the) Sunrise”, agora é “The Wild Boys”, em cujo vídeo dirigido por Russell Mulcahy ele ia morrendo submergido, que faz de abertura, com a bateria de Roger Taylor a não vacilar, como seria constante na noite.

De seguida, inserção pelas recentes “Invisible” e “All of You”, até chegar a “A View To a Kill”, escrita para o 007 com o mesmo título. Bandeira absoluta de 1985: Roger Moore como James Bond, Grace Jones, Cristopher Walken, Patrick Macnee dos Vingadores, um médico louco da RDA, videoclipe com carrinha Citroën, efeitos manhosos na Torre Eiffel. Uma delícia, mesmo com alguns pregos pelo meio.

O vocalista pede a little bit of “Notorious”, uma delícia de produção de Nile Rodgers, e anúncio de que os Duran Duran podiam e sabiam alargar o espetro após a saída de Roger Taylor e Andy Taylor, muito por via de Nick Rhodes, o artístico “Controller”, cerebral teclista e único membro permanente.

Le Bon vai de encontro ao cenário que vê à sua frente e diz ao microfone que alguns conhecerão os 40 anos de carreira, outros não, mas muitos conhecerão “Union of the Snake”. “Come Undone”, êxito surpresa do disco conhecido por Wedding Album, de 1993, aproveita o belo dueto de coros femininos, e em conjunto com “Ordinary World” (que aparecerá depois, com direito a bandeira ucraniana), é representante dos anos 90 que garantiram que nunca estiveram demasiado tempo sem sucessos (pena que “Electric Barbarella”, de Medazzaland, e tributo direto à inspiração do nome da banda, seja apenas faixa de culto). A novíssima “Give It All Up”, gravada com Tove Lo, tem aqui O’Connor a fazer as vezes com grande destaque.

Logo a seguir, carrega-se no botão de festa com “Hungry Like The Wolf”, com o saxofonista que acompanha os britânicos em plenos pulmões, e público conquistado a trautear. “Friends of Mine”, com direito a projeção de imagens de Metropolis, de Fritz Lang, e dos filmes de Drácula com Cristopher Lee, mostra que eles são, sempre foram, bem mais do que à partida se lhes pintou. Pouco depois, “Planet Earth”, “Hold Back the Rain” e “The Reflex” mostram que o catálogo new wave dos três fantásticos álbuns iniciais continua bem viçoso.

Após a cover de “White Lies”, escolha curiosa (num alinhamento que deixa de fora, por exemplo “Sound of Thunder” e a hipnótica “The Chauffeur”, dos tempos do Coliseu, ou “Girl Panic!”, para falar de êxitos mais recentes), e que tira bem partido dos músicos em palco, e depois vem o mélange de “Girls on Film”, hino com o seu icónico início de máquina fotográfica em trabalho na passerelle, com “Acceptable in the 80s” de Calvin Harris. Momento de malandrice auto-referencial e uma ótima faixa para se brincar ao vivo.

Pequena pausa antes de regresso para encore, sinal que a banda está em festival mas trata o evento como se fosse concerto em nome próprio. Como nós. Agora com t-shirt com os dizeres “courage est au courant” para manter o tom francófono, Le Bon, que antes tinha frisado que não é francês, lembra de novo a situação de guerra na Ucrânia, e pombas brancas passam nos ecrãs gigantes enquanto se canta “Save a Prayer”.

Por último, cumprindo o ritual máximo nos concertos dos Duran Duran, surge o melhor sorriso das capas de discos, o sorriso pintado por Patrick Nagel que para sempre irá acompanhar a banda e ajuda a explicar o caldeirão de poção de juventude onde os membros caíram: “Rio”. Dos raros casos em que uma música é de facto um modo de estar na vida, mais do que uma simples canção. Cinco minutos e meio que representam mais de 40 anos de trabalho.

Chega o final, já perto da uma da manhã, e todos os artistas em palco vêm agradecer à frente, dever mais do que cumprido. Simon Le Bon fica um pouco para trás a caminhar para o camarim e dá um pulinho juvenil, antes de um último aceno. Os Duran Duran parecem estar num sítio bom.

Fotos de: Rock in Rio Lisboa

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