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Uma coleção que reúne a trilogia Ray nas plataformas atuais, mas com um preço pouco recomendável.

Talvez seja a idade a falar, mas sinto que já não é tão comum alguém comprar videojogos sem saber o que está a comprar. Com o excesso de informação e o acesso que temos a sites, críticos e vídeos sobre, estamos constantemente a ser bombardeados por novos lançamentos e campanhas de marketing. Mas nos anos 90, o cenário era muito diferente. A Internet existia, mas o acesso à informação era limitado, restrito a um punhado de sites e fóruns, que apenas “aquele amigo da rua” conhecia. A nossa proximidade ao mundo dos videojogos era composta por programas de televisão, revistas, diz que disse e as ocasionais campanhas de marketing natalícias. Era fácil não saber o que estávamos a comprar.

Isto pode parecer assustador para as gerações mais novas, mas se cresceram durante os anos 90, esta prática era totalmente normal. Entrávamos numa loja, víamos as capas e escolhíamos de acordo com o potencial da mesma, juntamente com as pequenas imagens que decoravam a traseiras da caixa. A escolha era feita por impulso, uma roleta russa onde nunca sabíamos se íamos ter sorte ou um azar terrível. Como podem prever, eu caí várias vezes nesse azar, onde convenci-me que estava a escolher algo incrível para chegar a casa e perceber que afinal tinha comprado Judge Dredd ou Batman Forever.

Mas o inverso também aconteceu. Galactic Attack captou logo a minha atenção, no topo da prateleira do clube de vídeo. A caixa longa da SEGA Saturn mostrava-se imponente, com o desenho de uma nave vermelha e a promessa de combate especial. Eu adorava R-Type, apesar de nunca ter passado do terceiro nível, e aquele jogo, que estava, felizmente, dentro do meu orçamento de aniversário, podia dar-me a experiência que ansiava. Assim foi. Aqui estamos.

Há muito tempo que perdi a minha cópia de Galactic Attack. Não sei para onde foi, se a vendi quando a minha SEGA Saturn avariou ou se a emprestei a um amigo que me fugiu com ela. O que importa é que Galactic Attack nunca me saiu da memória. Não estamos a falar de um ponto máximo do género, uma experiência única ou a reinvenção das mecânicas que popularizam os shmup durante décadas. O que Galactic Attack simbolizava, especialmente para uma criança de 8 ou 9 anos, era uma aventura equilibrada e com uma progressão impressionante para a época. Eu recordo-me de ficar fascinado com a forma como a campanha leva-nos do espaço, onde começamos a nossa missão, até ao interior de um planeta enquanto lutamos contra máquinas imponentes. Tudo isto sem cortes, sem ecrãs de loading ou mudanças de missão que obrigavam a um fade out: estávamos numa viagem. Alguns momentos ficaram sempre comigo, como a entrada na atmosfera do planeta e a passagem para a sua crosta enquanto lutamos contra uma aranha mecânica, com a planificação a injetar uma enorme cinematografia a uma campanha mecanicamente simples e pouco surpreendente no que toca aos padrões dos inimigos e aos desafios que encontramos ao longo dos oito níveis.


A minha falta de conhecimento sobre a génese do género levou-me a acreditar que Galactic Attack era muito mais inovador do que realmente é. A combinação entre ataques verticais, semelhantes a tantos outros shmups, e um sistema de mira, para atacar inimigos no fundo – ou no solo, já que representam a maioria dos inimigos em campo –, não era tão inovadora como fora para o meu cérebro de 8/10 anos. Podemos datar este sistema a títulos como Xevious, que utilizava o mesmo esquema de controlos para dar aos jogadores uma maior gestão de inimigos em campo. O que Galactic Attack faz é equilibrar tudo ao ponto de ser um dos shmups mais satisfatórios que já joguei.

Aqui o sistema de combate chama-se Two Attack Layer. Com a mira sempre visível, basta passarmos o cursor pelos inimigos para ficarem marcados. O ataque não é automático, logo, podemos marcar mais do que um inimigo em simultâneo e soltar uma chuva de lasers quando quisermos. O número de lasers, tal como o poder de ataque da nossa nave, aumenta de acordo com os power ups recolhidos. Pensem em Panzer Dragoon para compreenderem melhor como Galactic Attack funciona. Isto foi o suficiente para se tornar numa experiência sempre clássica, mas muito mais assente no controlo em dois níveis, substituindo o foco no “bullet hell” que marcou outros títulos do género.

Galactic Attack foi o título que recebeu na sua edição europeia, mas este clássico shmup foi batizado com um nome muito mais popular: Rayforce. Talvez o conheçam assim. Para mim, foi uma surpresa, como podem imaginar. Pensava que Galactic Attack estava esquecido para sempre, fechado na SEGA Saturn ou numa cabine abandonada, mas não só o meu jogo de infância está vivo, como é mais popular do que alguma vez imaginei. Rayforce é o primeiro título da série, cuja coletânea está agora disponível para PS4 e Nintendo Switch. Ray’Z Arcade Chronology traz-nos Rayforce, Raystorm e Raycrisis naquele que é um verdadeiro regresso à infância. Um sonho tornado realidade, uma lembrança imortalizada. Tanta poesia para um jogo onde destruímos coisas no espaço!

Chamemos-lhe então Rayforce, tal como é recordado. Até um dia deste, Galactic Attack, lá ficas tu no passado. Foquemo-nos no presente, nesta reedição da série Ray. O regresso a Rayforce foi um cimentar do meu amor pelo jogo, onde redescobri os elementos acima indicados. Rayforce envelheceu bem, com uma campanha compacta, repleta de ação e uma campanha que progride como um filme de ação. O que também se destacou foi a sua facilidade de leitura, graças aos sprites utilizados. Nunca perdemos a noção do espaço e da localização da nossa nave ou dos projéteis inimigos. É tudo tão limpo e harmonioso, o que combina bem, para minha surpresa, com o novo UI que acompanha esta reedição. As bordas do ecrã são decoradas por informações adicionais, como o número de lock ons ativos, o poder da nossa nave e, como seria de esperar, a nossa pontuação.

O que achei interessante foi a ausência de um ataque especial, muito comum aos shumps. Em Rayforce não temos a possibilidade de lançar uma bomba ou um ataque de área capaz de eliminar todos os inimigos e os seus projéteis. A única opção que temos é o sistema de lock on e isso diz muito sobre o flow da jogabilidade em Rayforce, especialmente quando equiparado às suas sequelas. Raystorm é o segundo título da série, lançado em 1996 para várias plataformas – incluindo a PlayStation, onde joguei uma vez sem saber que existia ligação ao meu querido Galactic Attack, ainda que me lembre de indicar que lhe havia roubado o sistema de mira –, naquela que foi a uniformização da série aos moldes do género. Se Rayforce procurou destacar-se, Raystorm ambicionou o melhor de dois mundos, regressando ao sistema de mira, mas agora num ambiente poligonal 3D, com ataques especiais, duas naves à disposição e uma campanha dividida por oito níveis distintos. Já não temos uma campanha sem corte como no primeiro título.

Penso que Raystorm tem tudo para ser o favorito da coleção. É acessível, apresenta níveis mais desafiantes e bosses mais inventivos, e existem novas mecânicas que exponenciam os combates aéreos. No entanto, sinto que se perdeu algo na passagem para o 3D. A leitura dos níveis não é tão satisfatória e muitos projéteis perdem-se entre modelos e fundos animados, onde nem sempre conseguimos compreender onde estamos e o que estamos a fazer. Raystorm é, desta forma, muito mais desafiante, ainda que não seja injusto, mas sinto que a progressão dos níveis e o foco no combate à distância, cada vez mais dependente do sistema de mira, retiram-lhe impacto. Este problema seria ainda mais notório se a coleção só contasse com a versão original de Raystorm, mas, felizmente, a M2 traz-nos uma remasterização do título. A versão HD limpa os modelos e torna tudo mais percetível, uma dádiva para um jogo já com problemas de leitura e ritmo.


O que me impressionou mais foi o quão desapontado fiquei com Raycrisis. Apesar de ser o título mais inovador da trilogia, com uma mira deslocável – até aqui era imóvel, o que impossibilitava a marcação de inimigos que estivessem num ângulo inferior à nossa nave – e vários caminhos e níveis alternativos, não consegui entrar na sua campanha. Não se trata de um problema com o estilo visual e a sua representação de espaços visuais – o UI parece ter saído de um ano dos 90s, como Ghost in the Shell ou Neon Genesis Evangelion -, mas com o ritmo da ação. Raycrisis apresenta novos movimentos de câmara, muito mais dinâmicos e que adicionam novas perspetivas a certos momentos da campanha – como uma câmara frontal, com inimigos a virem contra nós –, mas a ação é caótica e os bosses são autênticas esponjas. Felizmente, Raycrisis também se apresenta numa versão HD, mas seria preciso um maior foco na jogabilidade para me divertir com este título.

Fora os novos UI e versões HD, Ray’Z Arcade Chronology traz-nos os extras do costume, como a adição de créditos infinitos e a possibilidade de gravarmos a qualquer momento. Não é uma coleção que se destaque pelos seus extras.

A reedição de videojogos recai, infelizmente, sempre sobre um ponto importante: o seu preço. Rayforce, ou Galactic Attack, é um jogo importante para mim e um excelente exemplo do que esperar de um género cuja popularidade esmoreceu ao longo dos anos. As suas sequelas também têm pontos fortes e fãs ou esta reedição não existiria. Mas valerá o preço de 49,99€? Estamos a falar de três jogos, duas versões remasterizadas e mais alguns extras polvilhados para justificar o relançamento. O preço continua a ser excessivo, na minha opinião, mas irá sempre depender de vocês.

Para mim, um jogo muito bom, outro bom e um assim-assim não equivalem ao valor associado à coleção, por mais carinho que sinta por esta série. A vida é assim. Tal como há tantos anos atrás, quando comprei Galactic Attack porque não tinha direito para mais, hoje acontece o inverso. A ironia do mundo atual.

Cópia para análise (versão PlayStation 5) cedida pela PR Hound.

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