Fora o preço avultado, o regresso de Ryu Hayabusa, agora no Unreal Engine 5, comprova a mestria e solidez do clássico de ação e aventura, mesmo depois de 17 anos.
A recomendação que atribuo a Ninja Gaiden II Black, a novíssima remasterização da “famosa” sequela da “icónica” série da popular produtora japonesa, é apenas uma formalidade. Quando se trata de um dos melhores jogos do género – daqueles que ainda hoje podemos considerar como uma influência constante -, é difícil não chegar à mesma conclusão que é conhecida e sabida desde o seu lançamento original em 2008: Ninja Gaiden II é absolutamente imperdível. Talvez prefiram o primeiro título da série, liderada por Tomonobu Itagaki, ou considerem que outras franquias rivais, como Devil May Cry e God of War, conseguiram encontrar um equilíbrio mais saudável entre um sistema de combate implacável e momentos de exploração limitados – mas recompensantes para aqueles que decidiram esmiuçar todo o conteúdo adicional presente ao longo da campanha e dos seus vários modos de dificuldade –, mas repito para não existirem dúvidas sobre o quão inegável é o impacto desta sequela: Ninja Gaiden II é obrigatório para todos fãs de jogos de ação e Character Action Games.
17 anos depois, Ninja Gaiden II continua a saltitar entre versões, plataformas, remisturas e remakes que procuram atualizá-lo perante uma nova geração de jogadores. Esta insistência em atualizar-se é um claro sinal da sua qualidade e do impacto que continua a ter dentro da sua comunidade de fãs. Em 2008, Itagaki e a sua equipa procuraram ultrapassar a fasquia alcançada por Ninja Gaiden e a resposta passou por aprofundar o sistema de combate com novas combinações, novas armas e um maior foco na obliteração das forças inimigas, com planos aproximados e grotescos de Ryu Hayabusa a decepar ninjas, monstros e criaturas mitológicas sem qualquer piedade. De facto, a sequela apresenta uma direção mais meticulosa, sem receio de se focar no sangue e vísceras, não só pelo choque visual dos cortes pesados de Hayabusa, mas para enaltecer todas as ações do sistema de combate. O feedback é perfeito e agigantado por uma direção de som que equilibra os temas do jogo com os efeitos sonoros das armas, cortes e grunhidos dos inimigos que procuram eliminar Hayabusa antes que seja demasiado tarde. As melhorias são incrementais e Ninja Gaiden II não se assume como uma completa evolução quando comparado ao título anterior, já que sacrificou parte da liberdade de exploração que se encontrava no primeiro título para se focar ainda mais na ação, mas é um reforçar do que já havia funcionado – só que à força da violência, sangue e gore.
Enquanto exclusivo para a Xbox 360, um pouco à semelhança de Ninja Gaiden em 2004 e depois em 2005 com Ninja Gaiden Black, o regresso de Ryu Hayabusa procurava liderar o género em todos os sentidos. A cinematografia, a violência quase gratuita, o sistema de combate profundo e difícil de dominar, aliado a uma IA implacável e a uma campanha com traços Hollywoodescos que procurava ser mais do que verdadeiramente era, num nível de fanfarronice que só poderia ter sido destilado em 2008. Numa era onde Devil May Cry, God of War, Onimusha e tantas outras séries do género preparavam-se para uma longa hibernação, Ninja Gaiden II apresentava-se mais arrojado do que nunca e para continuar a sobreviver, a exclusividade teria de ser quebrada. Ninja Gaiden Sigma já havia marcado a estreia da nova saga na PlayStation 3 em 2007 e dois anos depois, Ninja Gaiden Sigma 2 traria o mais recente título de Itagaki para a consola da Sony numa versão nem sempre amada pelos fãs. Nesta conversão, o sangue em litros de exagero, os membros cortados – agora mascarados por uma camada roxa que procurava mitigar os efeitos da violência do combate –, o número avultado de inimigos em campo e um desempenho aceitável ficaram todos para trás – muito longe de ser uma versão definitiva.
Para a maioria dos fãs, Ninja Gaiden Sigma 2 foi um passo atrás, mas um mal menor quando comparada à possibilidade da saga permanecer exclusiva a uma única plataforma. Seguiram-se reedições na PS Vita e, por fim, a Master Collection, lançada em 2021, que contou com a dupla Sigma e o terceiro título da série, agora remasterizados e finalmente otimizados para todas as plataformas. Um festim de Ninja Gaiden que agradou os mais pacientes, como eu, mas o travo permaneceu agridoce devido à insistência da Koei Tecmo em apostar única e exclusivamente nas versões Sigma dos primeiros dois jogos. Reza a lenda que os códigos de Ninja Gaiden II foram apagados e que nada resta da versão original do antigo exclusivo da Xbox 360 – e essa é uma lembrança que os fãs terão de reconhecer para todo o sempre.
Desta forma, Ninja Gaiden II Black não é propriamente o que os fãs queriam. Não é, portanto, um regresso ao jogo de 2008 e muito menos é uma atualização mecânica significativa em relação ao original, tal como Ninja Gaiden Black fora ainda na Xbox. O que Ninja Gaiden II Black é, além de um excelente jogo de ação, é um meio termo entre a versão original e a versão Sigma. O sangue está de regresso, com execuções grotescas em grande plano – o sistema de Obliteration nunca foi tão intenso como nesta versão – e um desempenho sem quaisquer entraves, mantendo-se com uma framerate sólida e com poucas quedas até durante os momentos mais exigentes. No entanto, o posicionamento de itens, a campanha mais linear, a ausência de um número impressionante de inimigos e uma certa acessibilidade no que toca a dificuldade do original mantêm-se intactos – ainda que a nova versão seja tudo menos fácil.
Existem também diferenças positivas entre Ninja Gaiden II Black e a versão original, como a implementação de novas personagens jogáveis, que não estavam disponíveis em Ninja Gaiden II, níveis adicionais e até um boss secreto. O que é peculiar nesta reedição em formato de remake ou remasterização – hoje em dia já não sabemos o significado das nomenclaturas e parece valer tudo -, é que está constantemente numa dança entre ser a versão definitiva de Ninja Gaiden II ou assumir-se apenas como mais uma atualização que continua a apresentar várias ausências no que toca a mecânicas e conteúdos adicionais. Uma decisão estranha já que se chama Ninja Gaiden II Black, um nome que deveria ser sinónimo de versões definitivas.
Por debaixo da pele da nostalgia, esconde-se o mesmo jogo que tem vindo a ser reeditado desde 2009, com a estreia na PlayStation 3, e isto poderá dividir os fãs a longo prazo. Por agora, e com todo o mérito, Ninja Gaiden II Black é uma celebração da série e é um sinal de vida quando tudo parecia estar perdido. A nova versão é acompanhada por um primeiro passo definitivo num estilo visual revigorado, onde os cenários e modelos do original e Sigma 2 são finalmente atualizados e até adornados por um tom mais realista do que o habitual. Para compreender o nível de reconstrução aplicada à versão Black, decidi instalar novamente a Master Collection e as diferenças são notórias. Um novo sistema de iluminação, melhores efeitos volumétricos, cenários mais detalhados pintados pelo Unreal Engine 5 e desempenho otimizado são certamente alguns dos destaques desta versão.
Esta aposta num novo motor de jogo, com uma fidelidade que seria impossível de prever em 2008 com o lançamento da versão original, acaba por ser uma promessa que fica semi-cumprida. Ninja Gaiden II Black é um excelente jogo de ação, absolutamente obrigatório para todos os fãs do género e que agora chega ao PC e consolas numa versão modernizada e muito mais visualmente apelativa, mas não deixa de ser um jogo de 2008. O level design não sofreu quaisquer alterações desde Ninja Gaiden Sigma 2 e mesmo que o desempenho seja agora muito mais sólido e estável, a câmara continua a ser um problema constante em espaços mais fechados. Ryu também tem o mau hábito de ficar preso nas arestas dos cantinhos dos vasos e corrimões ao longo dos níveis da campanha, obrigando-nos a recentrar a personagem e a acertar no espaço correto para evitarmos estes pontos de contacto absolutamente irritantes. Estes são os momentos onde a Koei Tecmo não conseguiu esconder a idade de Ninja Gaiden II.
Reforço o que disse no início do texto: Ninja Gaiden II é imperdível. Seja qual for a versão que escolherem jogar, desde a original à nova remasterização – ou remake, venha o diabo e escolha -, o título de Tomonobu Itagaki e da Team Ninja continua a ser um dos mais divertidos, implacáveis, irritantes, mas recompensantes jogos de ação que joguei e digo-o de coração cheio. É tão bom ver Ninja Gaiden a recuperar a sua fama e a chegar a novos jogadores, especialmente quando existe a promessa de um novo capítulo já agendado para 2025. Ninja Gaiden II Black, juntamente com Ninja Gaiden: Ragebound – a versão 2D a mando da The Game Kitchen – é um quebrar dos anos e anos de secura que marcaram a série, quase relegada ao buraco negro das incertezas e cancelamentos, mas há um problema que não posso ignorar: fora as suas qualidades objetivas e incontornáveis, este jogo de 2008 está agora a 49,99€. A versão Master Collection, para todos os efeitos – e que inclui o primeiro Ninja Gaiden e o outro jogo que não precisamos de mencionar -, está a 39,99€ e oferece mais. Ninja Gaiden II Black exige um preço de entrada avultado, apesar de ser um jogo que recomendo vivamente, e isso deve ser assinalado – ainda que esteja atualmente incluído no Xbox Game Pass. A escolha será vossa. A única certeza que vos posso dar é esta: Ninja Gaiden II Black é muito bom.
Cópia para análise (versão PlayStation 5) cedida pela KOEI Tecmo.