Depois de abril ter sido marcado pelo regresso dos The Strokes, mas principalmente pelo novo álbum de Fiona Apple, o disco mais incrível de 2020, chegamos a maio com as expetativas em alta.
Hayley Williams (Paramore) lançou a sua esteia a solo e Freddie Gibbs juntou-se a The Alchemist para mais um trabalho em parceria. Lady Gaga regressou ao seu registo antigo e os The 1975 fizeram jus à sua diversidade musical novamente. Moses Sumney completou o álbum lançado em fevereiro e Perfume Genius voltou a brilhar.
Entre estes, houve estreias, afirmações e álbuns de carreira. Sem mais delongas, eis a seleção dos álbuns essenciais lançados em maio.
Boston Manor – Glue
Género: Alt-Rock/Grunge
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Com sete anos de existência, os Boston Manor já tratam o rock por “tu” e tocam como gente grande. Apesar de, neste álbum, se terem afastado um pouco da vertente emo e se aproximarem mais do rock alternativo, continuam próximos da aura do grunge dos anos 90. Sinceramente, foi isso que os tornou numa promessa excitante.
Com este novo trabalho, a jovem banda britânica consegue canalizar todos os fantasmas do passado e andar na corda bamba entre o explosivo e o consciente. No entanto, em última instância, é o querer do coletivo que faz deste álbum um trabalho muito estimulante!
Classificação do álbum: ★★★★½
Músicas a ouvir:
- Plasticine Dreams
- Only1
- Playing God
- Brand New Kids
- Stuck in the Mud
- Liquid
Buscabulla – Regresa
Género: Latin/Electronic
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Foi apenas após dois Extended Plays (lançados entre 2014 e 2017) que o duo de Porto Rico residente em Nova Iorque se viu na obrigação de regressar a casa, por consequência do furacão Maria, que matou mais de 3.000 pessoas.
Enquanto a tendência coletiva foi a dos Porto Riquenhos (entre os quais família e amigos do duo) abandonarem a destruição do país, Raquel Berrios e Luis Alfredo Del Valle foram contra a tendência e decidiram regressar a casa. Foi sob essa aura pesada de destruição e crise que encontraram inspiração para gravar Regresa, que simboliza o regresso a Porto Rico para encontrar conforto na reaproximação com as suas raízes.
Dotado de ritmos latinos, o álbum de estreia dos Buscabulla é um sucesso instantâneo pelo conteúdo e carga emocional, mas também pela sonoridade que é um misto entre a alegria e a melancolia.
Classificação do álbum: ★★★★
Músicas a ouvir:
- Vámono
- El Aprieto
- NTE
- Nydia
Charli XCX – how i’m feeling now
Género: Pop/Electronic
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how i’m feeling now é o resultado do processo criativo, em plena pandemia, que aconteceu durante o isolamento social de Charli XCX. No entanto, a verdade é que a artista de 27 anos não precisa de usar a pandemia como pretexto para produzir música, pois desde 2017 já lançou duas mixtapes de dois álbuns (entre eles uma série de singles) de sucesso.
O espantoso é que, apesar do fluxo de música produzida ser elevado, Charlotte Aitchison nunca para de surpreender com material fresh a cada ano que passa.
Este álbum abre e fecha com brutalidade e é composto todo ele por sonoridades eletrónicas fortes. Contudo, é durante o seu desenvolvimento que a cantora britânica partilha connosco o seu íntimo e mostra que também pode ser vulnerável e cheia de ternura. Este é, assim, o trabalho mais pessoal de Charli XCX. A sua qualidade é evidente.
Classificação do álbum: ★★★★
Músicas a ouvir:
- forever
- claws
- 7 years (ft. RJ Burton)
- enemy
- party 4 u
Eve Owen – Don’t Let the Ink Dry
Género: Indie Folk/Indie Rock
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Eve Owen acaba de estrear-se a solo num álbum produzido com a ajuda de Aaron Dressner (guitarrista dos The National) e é surpresa mais bela do ano devido à graciosidade da sua voz. É um disco que traz uma mensagem de esperança nestes tempos mais conturbados.
Don’t Let the Ink Dry é um trabalho produzido ao longo de três verões, uma vez que Eve Owen também foi backup singer dos The National, integrando inclusive a tour do álbum I am Easy to Find.
O conteúdo das letras é tocante. Quando combinadas com a textura suave dos instrumentais – cuja composição passa pelo piano e guitarra, mas também tocam numa vertente mais eletrónica – faz lembrar Birdy. Artistas assim, cuja voz é o instrumento principal, são raros, logo é fácil imaginar a minha felicidade ao descobrir que Eve Owen tinha lançado um álbum.
Classificação do álbum: ★★★★
Músicas a ouvir:
- Tudor
- Lover Not Today
- She Says
- So Still For You
- Blue Moon
- A Lone Swan
Freddie Gibbs – Alfredo
Género: Rap
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O rapper de Indiana começou o caminho para o estrelato em 2013, mas foi, porém, no ano seguinte, com o álbum Piñata, em colaboração com Madlib, que conquistou a crítica. Desde então não tem parado de lançar álbuns de qualidade ímpar. No entanto, foi com Alfredo, em colaboração com The Alchemist – o produtor de rap que já conquistou um estatuto lendário – que conseguiu o trabalho mais impressionante da sua carreira.
Tal como este álbum, todo o trabalho de Freddie Gibbs é muito particular. Nos anos 80/90, dominado por rapper líricos, tendo em conta quão naturais, soft e clean são os beats associados ao som dele, ia certamente ter um sucesso astronómico. Atualmente, posso dizer que é ousado apostar neste tipo de rap. O mercado mexe-se rápido e as pessoas estão mais focadas no agir, consumir e divertir do que no parar, pensar e refletir.
Referência ainda para as colaborações com Rick Ross (cheia de referências) e Tyler. The Creator (num registo completamente diferente). Senhoras e senhores, estamos perante um clássico instantâneo.
Classificação do álbum: ★★★★★
Músicas a ouvir:
- 1985
- God Is Perfect
- Scottie Beam (ft. Rick Ross)
- Something to Rap About (ft. Tyler. The Creator)
- Baby $hit
Hayley Williams – Petals for Armor
Género: Indie Rock/Indie Pop
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A famosa vocalista dos Paramore lança pela primeira vez um álbum a solo. E apesar de não ter nada a ver com todo o seu trabalho em banda, é um bem necessário para a cantora e para quem a acompanha e gosta dela.
Petals for Armor é uma metáfora à descoberta da força que o seu feminismo lhe confere, face a todos os dissabores que lhe trouxeram insegurança ao longo dos anos e, por sua vez, a levaram a produzir este álbum.
O álbum é longo, se calhar mais do que precisava, mas, no geral, é uma viagem consistente pelos pensamentos, vulnerabilidades e inseguranças que a artista foi acumulando ao longo dos anos e que, agora, decideiu partilhar com o mundo em nome próprio num registo mais indie.
Classificação do álbum: ★★★★½
Músicas a ouvir:
- Simmer
- Leave It Alone
- Sudden Desire
- Dead Horse
- My Friend
- Roses/Lotus/Violet/Iris
- Pure Love
- Crystal Clear
I Break Horses – Warnings
Género: Synth-Pop/Dream-Pop
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Alguma vez se questionaram o que acontece quando o synth-pop e o dream-pop se cruzam e fundem? Os I Break Horses respondem a essa questão ao longo de quase 55 minutos, no álbum Warnings.
Este álbum é um tesouro musical com a capacidade de transportar qualquer fã de música numa viagem mágica, algo experimental, mas bastante agradável, ao contrário dos dois anteriores, que iam de forma mais analítica diretos ao assuntos.
Maria Lindén encontrou o som e setup perfeito para a sua voz. O resultado está à vista.
Classificação do álbum: ★★★★
Músicas a ouvir:
- Turn
- Silence
- I’ll Be The Death Of You
- The Prophet
- Death Engine
Lady Gaga – Chromatica
Género: Dance Pop/Electropop
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Lady Gaga regressa ao estrelato da cultura pop com mais um álbum bastante satisfatório, mas completamente diferente do registo do anterior (Joanne). Francamente, fica um pouco abaixo desse a nível de consistência.
Quem conhece a artista sabe que é uma liricista brilhante e tem ideias magníficas, mas, na hora de as passar para a música, parece que fica sempre um pouco aquém do esperado.
Chromatica é uma ode à Dance Pop dos anos 90 que garante diversão do início ao fim, mas falta a chama de trabalhos passados como o do The Fame ou The Fame Monster, álbuns que a diferenciaram e enalteceram face ao resto do panorama pop. Ainda assim, é um álbum com ótimas individualidades.
Classificação do álbum: ★★★½
Músicas a ouvir:
- Stupid Love
- Rain On Me (ft. Ariana Grande)
- Sour Candy (ft. BLACKPINK)
- 1000 Doves
Moses Sumney – Græ
Género: R&B/Electronic
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Quando a primeira parte saiu (em fevereiro), criou expetativas enormes para com a segunda parte, devido à dúvida se estava à altura para servir de complemento. Moses Sumney lançou então, em maio, as duas partes juntas num só álbum. A forma como funcionam juntas é magnífica.
Este torna-se, assim, o holy grail do cantor. É rico em conteúdo, diversidade de musicalidade e mais poderoso e ousado que o seu predecessor, Aromanticism.
O melhor é que, devido a essa diversidade, a experiência ao ouvir este álbum de uma assentada vai ser sempre diferente mediante o estado de espírito, pois a complexidade de Græ torna-o possível.
Classificação do álbum: ★★★★★
Músicas a ouvir:
- Cut Me
- Virile
- Conveyor
- Colouor
- Polly
- Bystanders
- Me In 20 Years
- Bless Me
Perfume Genius – Set My Heart on Fire Immediately
Género: Baroque Pop/Indie Pop
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Quem conhece Mike Hadreas decerto que não está surpreendido com a qualidade deste álbum. Aliás, não tenho quaisquer dúvidas de que a felicidade seja enorme pelo simples facto de poder ouvir mais da música formidável que este produz.
É impossível ouvir a música de Perfume Genius e não ter a capacidade automática de human-shazam, associando logo ao artista, pois a sua arte é única e distinta.
O que foi plantado em Too Bright e cresceu forte em No Shape começa a florescer em Set My Heart On Fire Immediately. E que bela carreira que Mike está a a cultivar aqui, conseguindo passar a sua vida com emoções e visões anexadas para a música sem quaisquer falhas ou perda de identidade em prol do sucesso.
Relativamente ao álbum como um todo, não só é dotado de músicas que empregam uma simbiose entre a melodia e a melancolia incentivando à reflexão, como também de músicas onde os ritmos dançantes são predominantes e carregam consigo uma aura de dream pop puxando da vontade de bater o pé.
Resta dizer que, pela terceira vez consecutiva, Perfume Genius consegue um álbum excelente e, muito facilmente, um dos melhores álbuns do ano – outra vez!
Classificação do álbum: ★★★★★
Músicas a ouvir:
- Whole Life
- Without You
- Jason
- On the Floor
- Your Body Changes Everything
- Nothing at All
- Some Dream
Sparks – A Steady Drip, Drip, Drip
Género: Art Pop/New Wave
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Apesar de ser da autoria de artistas norte-americanos, Steady Drip, Drip, Drip consegue trazer à vida a predisposição britânica (onde a banda começou a fazer carreira) – o humor sofisticado, a inteligência na escrita das letras e a forma como são trazidas à vida, bem como o jogo de instrumentos divertido e dançante.
São já cinco décadas de carreira para os Sparks que, curiosamente, sempre foram buscar a sua inspiração a ídolos do Reino Unido, como The Who, Pink Floyd e The Kinks. A nível de género, a versatilidade é imensa, já tendo passado por glam rock, synth-pop, new wave, post-punk ou alternative rock.
Apesar de nunca terem tido a visibilidade que mereciam face à capacidade musical, regressam em 2020 com um álbum bastante acessível, com o qual todos os fãs de música podem embarcar nesta viagem, sem qualquer compromisso com o passado da banda.
Classificação do álbum: ★★★★
Músicas a ouvir:
- All That
- I’m Toast
- Lawnmower
- Sainthood Is Not In Your Future
- Left Out In The Cold
- Please Don’t Fuck Up My World
The 1975 – Notes on a Conditional Form
Género: Rock/Electropop
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Mais uma vez, os The 1975 lançam um álbum que prima pela diversidade de conteúdo musical. No entanto, apesar de ter individualidades muito boas, não chega ao nível do álbum lançado em 2017. Peca por ter 22 músicas que se estendem ao longo de 1 hora e 20 minutos. Para um álbum que não seja uma coletânea ou banda sonora cinematográfica, é longo demais.
A banda britânica caiu inevitavelmente no erro de incluir músicas (frágeis) só porque sim, deixando a sensação que não passam de tentativas de fazer render o álbum em singles. Coisa que não aconteceu, até porque a receção crítica não foi famosa.
Ainda assim, é um álbum melhor do que o pintam! Encaixa na perfeição na categoria de “álbum de companhia” e é ideal para ouvir sozinho em casa. Tem passagens que forçam a introspeção e outras que incentivam aquela vontade miudinha de dançar sozinhos, independentemente de onde estivermos.
Classificação do álbum: ★★★★
Músicas a ouvir:
- People
- The Birthday Party
- Jesus Christ 2005 God Bless America
- Nothing Revealed/Everything Denied
- Tonight (I Wish I Was Your Boy)
- If You’re Too Shy (Let Me Know)
- What Should I Say
- Guys
De modo geral, maio foi um mês equilibrado e com ótimos trabalhos. Fazendo uma retrospetiva, é possível constatar que, em cinco meses, já há material para fazer um top 50 de melhores álbuns cheio de diversidade de géneros e qualidade geral.
Ainda que, para outras vertentes (como o cinema), não esteja a ser o melhor ano, para a música tem sido o oposto. Em muitos casos, esta pausa até tem sido benéfica para muitos artistas encontrarem inspiração, explorarem mais a sua arte e, consequentemente, aumentarem a sua capacidade de criar música.