Desliguem o vosso cérebro, chamem um amigo e juntem-se à resistência contra a invasão extraterrestre naquele que é o RPG de ação mais personalizável e igualmente vazio de 2024.
Entre a invasão alienígena que levou ao desaparecimento de 99% da Humanidade, personagens cujas emoções alternam entre o melodrama e a euforia, enormes trechos de diálogos onde pouco acontece – a não ser a interrupção constante da jogabilidade, às vezes para assistirmos a cinemáticas muito curtas – e uma tentativa em adaptar a alma e coração do género Mecha esconde-se um RPG de ação com inúmeras opções de personalização. O leque de peças, armas, chips e habilidades é tão variado que podemos mudar constantemente a build do nosso robot gigante no final de cada nível. O loot é imparável e as possibilidades são inúmeras, ao ponto de justificarem o investimento naquela que é uma campanha munida de clichés e trechos de diálogos pouco ou nada entusiasmantes.
Fora do combate, Megaton Musashi W: Wired funciona quase como um jogo de aventura e uma visual novel. A cidade de Ixia, onde a maioria da ação decorre, não é o que aparenta ser. Entre as suas zonas residenciais, escolas e lojas esconde-se a verdade sobre o que aconteceu à Humanidade: apenas 1% da raça humana sobreviveu ao extermínio provocado pela invasão dos Draktors. Através de uma perspetiva sidescrolling, Ixia constrói-se como a típica cidade japonesa ao longo da introdução, mas a verdade não demora a ser revelada: é tudo uma mentira. Ixia é uma reserva para os sobreviventes, agora com a memória apagada, controlados e vigiados pelos seus conquistadores. Mas a resistência trabalha nas sombras e não demoramos a encontrar uma forma de ripostar. É aqui que entra Yamato, um dos protagonistas, e o gigantesco robô Musashi como os únicos capazes de parar os Draktors.
Se estão a pensar em 13 Sentinels: Aegis Rim, não vos censuro, já que o novo título da Level-5 tenta desenvolver as suas personagens e tramas de uma forma similar ao jogo da Vanillaware – momentos de exploração e navegação com diálogos –, ainda que sem escolhas narrativas com verdadeiro peso para o desenrolar da campanha e muito mais clichés saídos de uma série animada. A movimentação também não é 2D em Megaton Musashi W: Wired e existe a possibilidade de controlar Yamato e os seus amigos em cenários com maior profundidade, ainda que a ação se resuma a encontrar o caminho certo e a personagem com quem temos de interagir para a ação avançar.
A exploração é pouco satisfatória e existe muito pouco para fazer em Ixia que seja minimamente interessante. É admirável sentir o esforço da Level-5 ao colocar tantos NPC em campo, todos eles com uma ou duas linhas de diálogo quando interagimos com eles, mas a ação resume-se a seguir os pontos de interesse para ativar as sequências de histórias que importam e pouco mais há para descobrir, a não ser que procurem conhecer melhor a mitologia e contornos sociais desta realidade alternativa – e para isso, só precisam de visitar o menu principal – ou então colecionarem alguns recursos espalhados pelas lojas e ruas de Ixia. Desta forma, a campanha assume uma estrutura mais descartável no que toca ao seu mundo e narrativa, e demonstra regularmente que é mais importante utilizar o sistema de fast travel do que explorar Ixia. O que importa é fazer a ação avançar até às próximas missões e é aqui que a Level-5 demonstra as suas verdadeiras forças.
Há muito tempo que não me via embrenhado num mundo criado pela Level-5. Os lançamentos sucessivos da série Inazuma Eleven nunca me interessaram e Professor Layton e Yo-kaiWatch não são propriamente franquias que me interessem. Para mim, a Level-5 parecia ter desaparecido quase por completo a seguir a Ni no Kuni II: Revenant Kingdom e agora emergido das sombras com este peculiar hack-and-slash de Mechas que foi primeiramente lançado em exclusivo no Japão e cuja sequela foi um título free-to-play repleto de DLC e outros incentivos incontornáveis dentro do modelo atual. Megaton Musashi W: Wired chega ao ocidente como um monstro de Frankenstein, tanto uma combinação entre ambas versões lançadas no Japão – e, uma vez mais, munido de tantos DLC que devia ser proibido –, como a versão definitiva para este RPG de ação em ponto grande. É uma escolha peculiar aos olhos deste fã da velha guarda, que cresceu com Dark Cloud e Dark Chronicles na PlayStation 2, mas que se torna mais e mais evidente quando jogamos e compreendemos o seu loop de combate, loop e personalização.
Fora das ruas e bases secretas de Ixia, Megaton Musashi W: Wired ganha vida. Seja offline ou online, num modo cooperativo ou a solo, dentro da campanha principal ou num modo adicional, o novo jogo da Level-5 é muito divertido. Com o titular robô gigante, temos várias missões à nossa disposição, cujo objetivo é quase sempre destruir o maior número de inimigos possíveis e derrotar um (ou mais) bosses no final de cada fase. Os cenários são muito vazios e descaracterizados, situados num mundo destruído e após a queda da Humanidade – montanhas e vales em tons castanhos, onde ainda vemos réstias das cidades que ali existiam –, mas a ação acontece em ponto grande e inteiramente centrada nos Mecha. Nós somos gigantes neste mundo em ruínas e somos também os únicos capazes de saltar o planeta Terra, e o jogo é muito eficaz em fazer-nos sentir como tal.
A nível mecânico, o sistema de combate não é o mais profundo, mas é eficaz. Apesar do seu tamanho, Musashi e os restantes Mecha movem-se com rapidez – e são ainda mais rápidos se escolherem peças mais leves, dependendo do vosso estilo de jogo ou então da vossa abordagem aos vários níveis –, como se fossem os protagonistas de um Character Action Game. Os movimentos são rápidos, temos acesso a um desvio, salto e a um botão de defesa, tal como os habituais ataques rápidos e habilidades especiais – que requerem TP para serem utilizados. As combinações não são muito inventivas ou imaginativas, quase todas centradas na utilização dos ataques rápidos, dentro do esquema habitual para o género, mas a Level-5 compensa ao proporcionar aos jogadores várias armas, entre elas, pistolas, bazucas, espingardas, metralhadoras, entre outras. Ao todo, podemos equipar três espadas e três armas de longo alcance para utilizarmos em combate, com a troca entre elas a acontecer instantaneamente assim que as selecionarmos. Desta forma, temos três builds sempre em combate, se assim quisermos.
A ausência de níveis mais interessantes visualmente ou com alguma variedade mecânicas irá pesar com o tempo, já que existem poucas distrações em campo, mas Megaton Musashi W: Wired contorna este problema ao apostar em missões mais curtas e sempre centradas na ação e na recolha de novas armas e peças. Entre cinco a dez minutos, consoante a dificuldade, a missão é concluída com sucesso e nós temos acesso a uma panóplia de recursos que são sempre imprescindíveis à evolução do nosso Mecha. Em pouco tempo, temos acesso a novas peças e temos vontade em fazer mais uma missão, se calhar até apostar nas missões alternativas – que, infelizmente, são quase idênticas às missões principais, só que ainda mais curtas – e recolher todos os itens que consigamos. Estamos constantemente a ser recompensados e mesmo que os itens não valham a pena, podemos recicla-los por dinheiro e peças que nos permitem evoluir outros parâmetros do nosso robô. Se entrarmos no loop, não sentimos tanto as limitações no que toca à duração e expansividade das missões.
Na verdade, é difícil não entrarmos no loop e é aqui que sentimos a alma free-to-play de Megaton Musashi W: Wired. As recompensas não param de chegar, até quando estamos fora dos combates, com regalias diárias, achievements constantes e metas que podemos concluir para recolher mais dinheiro, recursos e até peças. Desta forma, o nosso robô está em constante evolução. Podemos alterar os seus braços, tronco e pernas com novas peças, combinar vários tipos – desde peças mais pesadas até a outras mais leves – e encontrar recursos mais valiosos à medida que concluímos missões e temos acesso a novas recompensas. A combinação entre peças é muito importante e as alterações nas percentagens de ataque/defesa/desvio/entre outras são incrementais, mas não demoramos a sentir os seus efeitos positivos em ação. Com armas e peças com vários níveis de raridade – os tradicionais verdes, azuis, roxos e laranjas -, existe incentivo para continuarmos a recolher o maior número de recursos para combinarmos e encontrarmos novos setups para o nosso robô – e isto sem contar com a possibilidade de criarmos perfis para cada Mecha e até alternar entre pilotos.
Depois temos as habilidades especiais e a motherboard, onde podemos desbloquear novos atributos passivos e ativos. Com os recursos recolhidos, podemos aceder a esta verdadeira árvore de habilidades com um número impressionante de opções. Se tivermos dinheiro e recurso, podemos desbloquear várias opções de uma só vez. Estes atributos podem ser equipados nos circuitos dos robots e existem alguns limites no número e dimensão dos chips, portanto, é preciso fazer decisões de acordo com o nosso estilo de jogo. Para além destas opções, temos ainda os Mods, que podemos equipar nas peças e armas dos Mechas. Com um sistema de fraqueza, que define a proficiência das armas em combate, Megaton Musashi W: Wired exige que estejamos sempre a trocar equipamentos em busca da melhor combinação para o nosso robô, mas também é possível criar e evoluir peças individualmente, reciclar aquelas que não queremos e até aumentar a possibilidade de recebermos equipamentos lendários ao investirmos recursos no sistema de evolução. No total, temos um conjunto de variantes que influenciam o poder, defesa e rapidez do robot de forma ativa, com uma variedade sólida de armas de longo e curto alcance para dar maior profundidade a um combate que, na sua génese, não é propriamente surpreendente ou difícil de dominar.
Megaton Musashi W: Wired é uma caixinha que se vai abrindo e revelando mais compartimentos. É um jogo que sabe quando adicionar novos elementos à sua fórmula para conseguir manter os seus jogadores investidos através de recompensas valiosas e novos tipos de armas e habilidades. Se a narrativa não é envolvente, mas utilitária, a jogabilidade oferece opções de personalização suficientes para manter-nos investidos. Com várias missões principais e secundárias, novos modos e ainda a possibilidade de se aventurarem por partidas online, Megaton Musashi W: Wired é um pacote completo que peca na sua dependência por DLC e missões com pouca variedade. Mas no final do dia, é um RPG de ação divertido, acessível e constantemente recompensante que é ideal para desligarmos a cabeça durante umas horas enquanto batemos em robô cobertos de néon em cenários que envergonhariam as lutas de Dragon Ball Z.
Cópia para análise (versão PlayStation 5) cedida pela Honest PR.