Gotham Knights é, na soma das suas partes, um jogo aborrecido, irritante e um desperdício de potencial, que pouco faz com a sua Bat-Family.
As minhas primeiras impressões com Gotham Knights foram relativamente positivas. Algumas horas com a “Bat-Family”, numa nova reinterpretação de Gotham, foram relativamente divertidas, mas não merecedoras de uma longa dissertação sobre os temas, sistemas e design que compõem o jogo. Parecia-me OK e inofensivo. Um jogo que é uma mescla de clichés e mecânicas de outros jogos populares que estavam a satisfazer o meu tempo livre.
Foi apenas depois de fazer uma pausa e decidir investir um pouco mais de tempo e energia em Gotham Knights que percebi porque é que o sentimento geral em torno do jogo estava tão azedo. Não por ser um péssimo título, mas porque essa diversão e descontração, que encontrei inicialmente, transformou-se numa experiência chata, aborrecida e criada por um algoritmo que não faz absolutamente nenhuma justiça a uma premissa cheia de potencial.
Apesar de não ser uma sequela da série Arkham, é impossível não traçar comparações a entradas passadas, até porque Gotham Knights bebe mecanicamente muito das produções passadas da Rocksteady Studios, que influenciou todo o género de jogos de super-heróis, dos melhores como Marvel’s Spider-Man, aos mais mornos como o Marvel’s Avengers. Gotham Knights apresenta-se, assim, familiar, mas infelizmente sem nada de novo. É um jogo narrativo, de mundo aberto, com atividades genéricas e repetitivas para explorar entre os pedaços de história principais em missões mais redondas e bem trabalhadas.
A premissa de Gotham Knights não é, de todo, má. Na verdade, está cheia de potencial. A WB Games Montreal explora o mundo de Batman… sem Batman. O morcego morreu, mas a cidade vive, ainda que mais triste, em luto e desprotegida. Para ajudar a limpar as ruas de criminosos e impedir outras forças como a ascensão da Court of Owls, o bastão de vigilantes é passado a quatro bat-jovens, Batgirl, Nigthwing, Red Hood e Robin.
A cidade de Gotham representa um dos mundos abertos mais aborrecidos dos últimos tempos.
Com algum respeito ao lore e mitologias estabelecidas dos materiais em que se inspiram, não temos aqui nenhuma história de origem, mas uma de desenvolvimento enquanto os nossos heróis têm que aprender a lidar com a morte do seu mentor, sair das sombras e fazer justiça ao seu legado. O potencial de contar uma história emocionante, dinâmica e refrescante é enorme, mas altamente afetada por uma experiência aborrecida e cheia de travões.
A cidade de Gotham representa um dos mundos abertos mais aborrecidos dos últimos tempos. Não é propriamente grande, o que é uma vantagem, mas é tão despida de vida, tão escura e com tanta repetição arquitetónica que existe uma enorme dificuldade de memorizar cada um dos distritos que a compõem. A sua navegação também não é a mais intuitiva, seja pelo topo dos edifícios com um gancho ou através das habilidades únicas de cada personagem. E o fast travel está fechado atrás de missões chatas de scan de drones espalhados pela cidade, que se não nos dispusermos a fazê-las, ficamos com a locomoção limitada.
É nas ruas da cidade onde iremos passar mais tempo, mais do que aquele que vamos dedicar a fazer missões principais e secundárias (narrativamente mais ricas e interessantes), porque é nelas que encontramos o maior travão de todos desta experiência: os combates com rufias. Gotham Knights cai no erro de nos obrigar constantemente a fazer “investigações” e atividades espalhadas na cidade antes de avançar na história, como se fosse um controlo de ritmo forçado. Parecia ser uma ideia “genial” para evoluir as habilidades dos nossos heróis ou servir de campo de treino da sua jogabilidade medíocre, mas é extremamente frustrante ter um jogo que nos manda “ir comprar o leite quando já o temos no frigorífico”. Os jogadores que optem por jogar Gotham Knights pelas suas histórias vão encontrar um jogo reminiscente de um “Game As A Service” (Jogo Enquanto Serviço – GAAS) forçado, quando podia ter algo tão especial como um Batman Arkham.
Na verdade, Gotham Knight transpira ares de GAAS por todo o lado. É fácil ler nas entrelinhas que este era para ser outro jogo. A primeira prova prende-se com a sua natureza Co-Op, com um péssimo matchmaking, onde os jogadores preferem, aparentemente, jogar sozinhos, já que foi raro encontrar outro jogador ou era facilmente kickado. E convém referir que o Co-Op está limitado apenas a dois jogadores. Quer dizer…
A segunda prova está na progressão de personagens, feita através de pontos de experiência nas atividades na cidade, com um sistema de desbloqueio de skins, permutações e elementos de crafting confusos e desnecessários. Confusos são também os menus e a quantidade de entulho que o jogo oferece ou obriga a evoluir para estarmos preparados para a próxima missão. O que é pena, porque no meio de menus desenhados para um MMO ou jogo Mobile, encontramos uma incrível seleção de excelentes skins para os nossos heróis, que nunca sabemos muito bem como desbloquear. Por vezes até parece que é meio aleatório, pois simplesmente aparecem no nosso inventário.
Gotham Knight transpira ares de Jogo Enquanto Serviço por todo o lado.
Outro aspeto que desilude é que, se optarmos por jogar sozinhos, escolhendo e trocando de personagem sempre que quisermos, as missões e a exploração são sempre feitas a solo e nunca com a nossa bat-family. Não só é estranho quando o risco de algumas missões de história é elevadíssimo e faria todo o sentido ter todos os bat-membros juntos e unidos, como é também uma oportunidade desperdiçada de desenvolver as personagens e as suas relações em diferentes atividades.
Ainda antes do lançamento de Gotham Knights, uma das discussões recorrentes na Internet deveu-se ao choque do desempenho do jogo estar limitado a 30FPS nas consolas por falta de otimização ou desleixo dos produtores. Não vou recair no segundo argumento, mas acredito que o primeiro seja a maior razão. Não me importo de jogar jogos a 30FPS, especialmente nas consolas, desde que faça sentido para a visão dos criadores e que essa limitação seja em sacrifício de visuais que façam justiça às capacidades extra das máquinas, que podemos considerar ainda recentes. Gotham Knights não é um jogo, no geral, feio. Tem coisas mais feias e desapontantes como a cidade, é certo, mas tem uma excelente apresentação visual, com modelos muito detalhados, cenários fechados bem decorados. O sistema de iluminação dá um certo “pop” às personagens durante a ação quando luzes e sombras dançam e, por vezes, existe alguma densidade ambiental e complexidade geométrica que categorizaria como Next-Gen, mas não é, de facto, um portento gráfico que não pudesse sacrificar algo em prol de um modo de jogo mais fluido, como outros títulos já nos habituaram. Opções são boas e bem-vindas e em Gotham Knights seria, sem dúvida, bem-vindo, pois a jogabilidade iria beneficiar bastante com a fluidez extra.
Gotham Knights é um tipo de jogo que, quanto mais tempo passamos nele, mais rapidamente nos vamos aborrecendo e irritando, vendo que as somas das suas partes não são suficientes para nos manterem investidos o tempo que o jogo requer. É um título que se aproxima mais de um produto banal, formulaico, criado por um algoritmo como indiquei no início. É, no fundo, uma caixa de areia com brinquedos de plástico, para os miúdos se entreterem um pouco até a areia começar a causar comichão.
Cópia para análise (PlayStation5) cedida pela Upload Distribution.