Em EA Sports WRC, os astros alinharam-se e a Codemasters teve finalmente a oportunidade de produzir um jogo oficial do Mundial de Rali. O resultado é um simulador acessível e divertido, mas ainda com espaço para muitas melhorias.
Após um breve momento a afinar as assistências e algumas das opções de acessibilidade de EA Sports WRC, os meus primeiros minutos ao volante (neste caso ao comando) do Ford Focus RS Rally 2001 do lendário piloto Colin McRae, pelas florestas brancas da Suécia, fizeram-me esboçar um sorriso de orelha a orelha de pura êxtase e satisfação.
Por momentos, EA Sports WRC pareceu-me ser exatamente aquilo que eu, durante décadas, apenas poderia imaginar: uma fusão da série da Colin McRae Rally (que evoluiu para a série DiRT) da Codemasters e da série de jogos WRC: World Rally Championship para a PlayStation da Evolution Studios.
EA Sports WRC é, no fundo, um produto do alinhamento dos astros. É verdade que, ao longo do tempo, já não são as mesmas equipas a produzir estes jogos, mas não deixa de ser entusiasmante olhar para a indústria – numa lente mais positiva – e ver estes lendários estúdios a partilharem o seu pedigree, com orçamentos de uma Electronic Arts e a licença da maior competição de Ralis do mundo.
E a verdade é que funciona. EA Sports WRC não é perfeito, e admito que não é tão incrível como imaginaria, mas para uma primeira entrada (que a julgar pelo nome não funcionará como uma plataforma em evolução ao longo dos próximos anos), satisfaz e bem.
Não se deixem enganar, este não é um jogo de arcade como no passado Colin McRare Rally, os títulos numerados de DiRT ou os WRC: World Rally Championship da Evolution Studios foram. Este é um jogo de simulação que, se não fosse pela licença, seria certamente um DiRT Rally 3, o spin-off hardcore da série DiRT, com uma jogabilidade extremamente afinada e desenhada a pensar nos jogadores que procuram desafio e realismo, especialmente os que tiverem um setup à medida.
Não é o meu caso, que jogo estes jogos maioritariamente no comando, aqui na PlayStation 5 com o DualSense, mas sinto que EA Sports WRC faz um excelente trabalho a traduzir a adrenalina e o risco da condução de rali, graças à profundidade das suas mecânicas, da vasta responsividade de controlos dos veículos e do design sinuoso dos vários traçados do jogo.
Dizer que EA Sports WRC é um jogo difícil seria redutor. Não é, de todo. É sim, um jogo complexo que requer “mãozinhas”, tato, sensibilidade e treino. E isso comprova-se facilmente ao explorar o conteúdo do jogo, pelos mais de 70 veículos de diferentes classes ao longo da história do rali, todos com diferentes comportamentos, e pela incrível variedade de traçados, condições e tipos de terreno que obrigam ao treino constante.
Os carros híbridos de WRC modernos, com as suas acelerações estonteantes e incrível controlo imediato, são completamente diferentes dos carros de classes mais antigas como o Group B, de direção caótica e embalos assustadores, para não falar das classes da década de 2000, que são um deleite de controlar ao deslizar a cada curva. Em cima disso temos que equacionar as condições dos traçados e o tipo de terreno, trazendo assim para o jogo uma profundidade multiplicada de oportunidades de jogo.
EA Sports WRC faz um excelente trabalho para nos deixar jogar como queremos e para treinar todas estas variantes através de diferentes modos de jogo. Temos uma escola, um modo opcional de tutorial que nos permite participar em pequenos desafios ao mesmo tempo que aprendemos o básico da jogabilidade deste jogo; temos Time Trials; um modo Quick Play onde podemos criar o nosso próprio campeonato a solo ou em multi-jogador; o Moments, onde nos são desafios periódicos; os Championship, onde podemos participar nos atuais campeonatos; e o modo Carreira.
Dando destaque a alguns, o modo carreira é, infelizmente, o que menos gostei desta experiência. É um modo de role-play, que pretende simular a nossa carreira na modalidade. Podemos criar o nosso piloto e co-piloto, o nosso emblema e até os nossos veículos, peça a peça com orçamentos limitados. Depois disso, embarcamos num calendário semanal e temos que fazer a gestão da nossa equipa de engenheiros. Não é nada de muito novo se conhecem, por exemplo, o formato da EA Sports na sua série F1, mas infelizmente não me diverti muito com esta carreira.
Toda a gestão extra em torno da equipa é demasiado ruidosa, afastando-nos do que é realmente interessante no jogo, e o seu calendário, onde apenas podemos optar por uma atividade por semana, em vez de nos colocar urgência ou desejo em participar nas competições, torna-se num “Cubo de Rubik”, onde temos que calcular orçamentos, fazer previsão de carros a adquirir para futuros eventos e, até, estar atentos à psicologia dos membros da nossa equipa. Por causa disto e por falta de atenção, fui perdendo campeonatos por desistência ou surgiram-me semanas em que não tinha um carro para participar. Se há modo muito insatisfatório… é este.
Felizmente, não faltam modos bons de jogo. O Championship poderia ser o modo principal, com a opção de participar no atual Campeonato Mundial de Rali, nas modalidades FIA Junior WRC, WRC2 e WRC. Nelas, podemos escolher os nossos pilotos atuais favoritos, com os carros atuais, ou até participar com o nosso piloto. É um modo sem compromissos, curado e direto ao assunto.
O modo Championship, para já, apenas apresenta as temporadas contemporâneas. Felizmente, podemos usar o Quick Play para criar campeonatos automáticos ou manuais, com as nossas regras, traçados e classes preferidas. Podemos, por exemplo, focar-nos no rali dos anos 2000, nas classes S2000 e S1000, ou no lendário Rally do Group B.
Ainda assim, o meu modo favorito acabou por ser o Moments, composto por uma seleção curada de pequenos eventos, com objetivos bem definidos (tempo, nível de dano, etc) inspirados em momentos históricos do WRC ou fictícios. O único senão é que, para além de serem apenas 10 eventos singulares, estes só são renovados daqui a 6 semanas e dois deles estão fechados, sendo acessíveis apenas a subscritores do EA Play – o que é simplesmente estúpido.
De facto, tudo o que diz respeito à EA é, infelizmente, uma das piores partes de EA Sports WRC. Apesar do jogo ser extremamente completo e surpreendentemente acessível, com o preço base de lançamento de 49,99€, sente-se o oportunismo de capitalização por todo o lado. Desde o tradicional passe de temporada que oferece elementos cosméticos redundantes, aos eventos fechados, o próprio nome do jogo, sem numeração ou um ano, revela que EA Sports WRC é um jogo plataforma. Algo que temo que, ao longo do tempo, seja mais pago que gratuito.
A apresentação e atmosfera do jogo também sofre um pouco com o lado corporativo da EA e da própria FIA. Há um sentimento de falta de visão artística, sendo que o jogo tenta emular ao máximo a imagética do WRC, sem pingo de alma ou atitude, algo que é um pouco trágico, tendo em conta que tanto os jogos da Codemasters e da antiga Evolution Studios destacavam-se bastante pela sua identidade quase irreverente.
Por fim, infelizmente EA Sports WRC também se perde a nível de visuais e de desempenho. É uma mixórdia de “bom” e de “mau”. Para este jogo, a Codemasters abandonou o proprietário EGO Engine para o Unreal Engine, na sua versão 4. Uma estranha decisão, sustentada pela possibilidade de criarem a melhor física e traçados mais longos, mas que, na prática, se revelou numa má decisão.
Visualmente, EA Sports WRC está longe do melhor que é possível fazer hoje em jogos. Na verdade, DiRT Rally 2.0 tem uma clareza e detalhe visual muito mais agradáveis. EA Sports WRC faz-se sentir como um jogo da geração passada, onde os ambientes são, na sua maioria, deslavados, e os modelos dos carros e dos pilotos parecem saídos de jogos da geração passada. Em cima de tudo isso, o desempenho do jogo poderia ser melhorado. Na PlayStation 5 apenas temos um modo, a 60FPS, com uma qualidade de imagem demasiado suave, sem V-Sync e ocasionais perdas de fluidez. Pior ainda está a versão PC – que tive oportunidade de experimentar com o trial de 5 horas no EA Play do Xbox Game Pass – onde o jogo está claramente mal otimizado, consumido recursos e com soluços constantes mesmo em alto desempenho.
Apesar destes apontamentos finais, EA Sports WRC é um ótimo jogo, com espaço para melhorias, e que irá certamente preencher-se de conteúdos para atrair a atenção e ocupar o tempo dos maiores fãs de rali e de jogos de simulação. Não chega às alturas das expectativas de um fã de longa data da Codemasters, com desejo de os ver a trabalhar finalmente com a licença WRC, mas satisfaz o suficiente para ficar confiante no futuro desta nova franquia.
EA Sports WRC pode ser jogado no PC, PlayStation 5 e Xbox Series X|S.
Cópia para análise (versão PlayStation 5) cedida pela Electronic Arts.