Destroyer no Musicbox Lisboa – O bom filho a casa torna

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São visita da casa, não precisam de avisar. Basta aparecerem que nós recebemos.

Noite amena, Rua Nova do Carvalho – que é como quem diz, rua cor-de-rosa – com esplanadas a abarrotar (daqui a pouco não passam duas pessoas lado a lado pelo meio) e chega-se ao Musicbox minutos antes das 21h30, hora de início do concerto dos Destroyer, com pouca fila.

Lá dentro está o calor do costume, mas é fácil chegar à frente, à beira do palco, onde após espera de alguns minutos com direito a música ambiente, entram em campo nada mais de sete músicos no palco de área modesta, capitão de equipa Daniel Bejar. Dan, para os amigos. Restantes elementos: John Collins (baixo), David Carswell e Nicolas Bragg (guitarras), Ted Bois (teclas), JP Carter (trompete fabuloso, uma das marcas da banda) e Joshua Wells (bateria).

“It’s in Your Heart Now”, do acabadinho de sair do forno Labyrinthitis, é a abertura. Instrumental crescente de intensidade, tal como “June” (com direito a efeitos iniciais reproduzidos em telemóvel à frente de guitarra, pormenor engraçado, antes de Bejar sacar de papel e ler a reflexão que aparece a meio), e segue-se “The Raven” do anterior Have We Met, que seria a justificação do concerto previsto para 2020, adiado para agora.

Bejar, canadiano de pai espanhol fugido à guerra civil, é o modelo Ralph Lauren que precisávamos: camisa meio aberta, cabelo desgrenhado e barba farta, garrafa de cerveja a refrescar. A voz calma por cima do volume alto que estranhamente nunca deixa de se ouvir. Mas seria injusto reduzir os Destroyer a sociedade unipessoal, mesmo que ele apareça sozinho em várias capas e o seu sujeito poético seja determinante.

A concentração de talento por metro quadrado de palco é provavelmente a maior do ano, com direito a vários solos, como o de Joshua Wells, de ar quase grunge, em “Tinseltown Swimming in Blood”, a única de ken, curioso álbum com referências aos anos Thatcherianos que influenciaram o artista. Aliás, o ar dos músicos é como uma salada que está perfeita e em que não mexeríamos nada, ar de quem está a ser o que é sem fazer fretes, e a trazer à memória paralelos como entre o guitarrista com óculos gigantes quase a la Paul Reynolds, guitarrista dos A Flock of Seagulls.
Antes, “Times Square” seria a primeira música mais reproduzida em murmúrio pelo público, em respeito por um concerto mais de entrar na onda sonora do que em participar de forma ruidosa.

Em palco, os Destroyer fazem uma pintura bonita dentro da moldura dos arcos do Musicbox, na sequência dos concertos de 2012 e 2013 (aqui em versão reduzida para apresentar o EP Five Spanish Songs), e este regresso faz lembrar que o Musicbox é o sítio deles. Eles pertencem aqui. A ida ao NOS Primavera Sound em 2016 foi uma variação simpática, tarde soalheira com óculos de sol e copo na mão, e no ano anterior Dan Bejar falhou, infelizmente, a presença na ida ao Porto do seu outro grande cartão de visita, os gigantes The New Pornographers, super-grupo com discografia que inclui o grande Brill Bruisers, de 2014, na altura a ser promovido em tournée. Antes, lá longe em 2011 num Sudoeste que hoje parece bizarro, Kaputt foi tocado em estreia no solo pátrio, fãs à porta cá fora a escutar atentamente.

De raras palavras para além das cantadas, o vocalista diz que é bom estar aqui, que Lisboa é das cidades preferidas (a sério). Numa das pontas, uma jovem de óculos pendurada no limite do palco, a um braço de distância do teclista, sorri. Aqui as palavras têm peso e é mais fácil acreditar nelas.

“Tintoretto, It’s for You” é mais uma das novas, interpelação de referências cultas com sintetizadores e trompete a rasgar, e “Kinda Dark” é exactamente isso – referências ao Boston Strangler, pandeireta a suavizar. Coisas dos Destroyer, e que poucos mais são capazes de fazer.

Fase mais atmosférica antes da chegada a “Kaputt”, música xará do álbum do mesmo. E Kaputt, o disco, um dos melhores da década de 10, acabaria por definir aquilo que é o estilo dos Destroyer, a grande catapulta para a ribalta, mesmo que a cada disco exista reinvenção. “Suicide Demo for Kara Walker”, beleza sem verbo, é a segunda presença, e mesmo sem termos direito a “A Savage Night At The Opera”, a gloriosa “Chinatown” abre o encore, agora com coros menos tímidos, antes do final festeiro de “Streethawk I”, do longínquo álbum de 2001 ainda recebido por culto reduzido, e “European Oils”, de Destroyer’s Rubies, de 2005. São visita da casa, não precisam de avisar. Basta aparecerem que nós recebemos.

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