Wolf Man revela-se uma oportunidade perdida para Leigh Whannell, que não consegue replicar o sucesso técnico e narrativo de The Invisible Man.
Existem vários fatores de antecipação para um filme. Seja o elenco, género, a franquia pré-estabelecida ou realizador, entre outras, as razões pelas quais espetadores se sentem mais ou menos entusiasmados para um novo lançamento cinematográfico são infindáveis. Pessoalmente, as expetativas para Wolf Man eram, naturalmente, altas devido ao simples facto de ser o novo filme de Leigh Whannell, o cineasta responsável por Upgrade e The Invisible Man, sendo que esta última obra foi mesmo dos meus filmes favoritos do seu ano de estreia. No entanto, não consegui escapar à reação inicial, menos positiva, por parte das audiências e restante crítica, acabando por entrar para a sala de cinema com alguma moderação.
Wolf Man conta com um argumento de Whannell e da sua mulher Corbett Tuck – mais conhecida como atriz com papel “recente” em Insidious: Chapter 3, – e é considerado um reboot da obra original de 1941, The Wolf Man. O filme acompanha Blake (Christopher Abbott) que herda a sua remota casa de infância na zona rural de Oregon, depois do seu pai desaparecer e ser dado como morto. Com o casamento desgastado, Blake convence a esposa Charlotte (Julia Garner) a visitar a propriedade com a filha de ambos, a pequena Ginger (Matilda Firth). Quando a família se aproxima da casa, são atacados por um animal que não conseguem identificar. Numa fuga desesperada, barricam-se dentro da casa enquanto a criatura ronda o perímetro.
O sucesso de The Invisible Man é devido a inúmeros atributos, mas a forma inteligente e intrigante com que Whannell explorou o conceito da invisibilidade e do espaço vazio através da cinematografia brilhante de Stefan Duscio – que se mantém como diretor de fotografia em Wolf Man – foi, sem dúvidas, um fator técnico que elevou tremendamente uma história, já por si, extremamente rica e complexa sobre abuso doméstico. Desde o primeiro minuto que Whannell agarrou os espetadores com uma introdução aos conceitos audiovisuais que predominam ao longo da obra.
Infelizmente, Wolf Man falha precisamente nestes dois pontos vitais. O enredo é chocantemente superficial e vazio, ao passo que os tais pormenores técnicos pecam por serem tardiamente explicados. Whannell tenta criar um ambiente de perspetiva díspar, entre o olho humano e animal, focando-se na diferença gritante entre aquilo que os humanos (não) conseguem percecionar na escuridão, contra a clareza total de um olhar de lobo. No entanto, apenas utiliza este truque visual um par de vezes, sendo que a única sequência onde, de facto, tem um impacto palpável é já no terceiro ato.
Mesmo assim, o problema maior acaba por ser a escuridão excessiva nas cenas noturnas. Com exceção da tal sequência mencionada acima, os restantes momentos de suposto suspense, tornam-se mais frustrantes do que tensos, devido à incapacidade de se poder observar o que quer que seja. Sinceramente, cheguei mesmo ao ponto de questionar se era um problema de projeção, tal a impossibilidade de perceber o que se passava no ecrã. Se a intenção é propositada, é um risco que sai ao lado, pois a justificação não é suficiente para compensar a confusão visual.
Dito isto, os outros departamentos técnicos de Wolf Man merecem muitos elogios, especialmente a maquilhagem e produção sonora – não confundir com a banda sonora de Benjamin Wallfisch. A transformação física de Blake é genuinamente fascinante, orquestrando um trabalho conjunto impressionante de efeitos práticos, visuais e maquilhagem. Junte-se a isto uma atmosfera sonora potente e os ingredientes para sequências imersivas, culminando num momento fantástico envolvendo uma aranha, que é provavelmente a melhor altura do filme.
As prestações de Abbott (Poor Things) e Garner (The Royal Hotel) são igualmente louváveis. O ator acaba por se destacar com um desempenho mais físico, logo cabe em Garner a maior fatia da camada emocional, sendo que a atriz surpreende com uma interpretação mais complexa do que inicialmente aparenta. Desde momentos mais contidos a interações mais emotivas, Garner é bem capaz de ter entregue uma das melhores prestações da sua carreira. Já a jovem atriz Firth (Subservience) cumpre com o que lhe é dado… o que, infelizmente, é muito pouco.
É um problema inesperado, pois após The Invisible Man, não esperava que Wolf Man fosse capaz de ser tão banal e vazio. O argumento é baseado em meras descrições de eventos e personagens, sem nunca desenvolver um único ponto introduzido anteriormente. Blake é escritor, Charlotte é jornalista. Ginger tem uma proximidade maior com o pai do que com a mãe. O casal não parece propriamente feliz. E é isto. Não existem diálogos que expliquem melhor as diferenças entre as relações. Não existem ligações entre pontos de enredo ou continuações de algo introduzido anteriormente – por exemplo, Charlotte supostamente encontrava-se a escrever um livro, mas tirando essa linha de diálogo, nunca mais tal é referido ou jogado de alguma maneira na narrativa.
Existe uma cena minúscula onde Charlotte parece mais focada no trabalho do que na família, mas tal como tudo o resto, nunca mais volta a ser abordado ou desenvolvido. Wolf Man é um conjunto de descrições básicas sem nunca avançar para lá disso. O drama familiar no centro da história tem potencial temático através de um estudo mais profundo e cuidado sobre problemas relacionais, maternidade e paternidade, balanço entre vida pessoal e trabalho, e até traumas de infância… mas a falta de maior desenvolvimento é tão evidente que a verdade é impossível de ignorar: não me podia importar menos com qualquer uma destas personagens.
A desilusão geral culmina numa conclusão apressada cuja resolução forçada deixa inúmeros nós por desatar e – apesar do plano final deslumbrante -, um vazio emocional tremendo, que não permite Wolf Man chegar, pelo menos, a “porto seguro”. Nem quero imaginar se tivesse mantido as tais expetativas altas…
VEREDITO
Wolf Man revela-se uma oportunidade perdida para Leigh Whannell, que não consegue replicar o sucesso técnico e narrativo de The Invisible Man. Apesar de contar com prestações sólidas, especialmente de Julia Garner, e de conter alguns momentos tecnicamente impressionantes, o filme peca por um enredo chocantemente superficial, desprovido de impacto emocional e com níveis de escuridão incompreensíveis. É um trabalho que se sente fragmentado e vazio, que falha em explorar o seu potencial temático e em criar uma conexão emocional significativa com o público. Elogios para as equipas de maquilhagem, produção sonora e efeitos práticos, mas infelizmente, não são suficientes para combater a desilusão geral.