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Monkey Man mostra que Dev Patel ainda tem muito que aprender no campo da realização e argumento, mas o compromisso inabalável para com uma história culturalmente e tematicamente rica merece inúmeros elogios.

Enquanto amante de cinema, um dos maiores prazeres desta paixão é encontrar novos cineastas com a sua própria identidade, estilo e mensagem. Existe quase sempre algo de especial numa estreia em longas-metragens por parte de um realizador desconhecido, mas quando este é um ator altamente popular com uma opinião pública fantástica, as expetativas em redor da obra inevitavelmente sofrem alterações. Dev Patel (The Personal History of David Copperfield) realiza, escreve – juntamente com Paul Angunawela e John Collee (Hotel Mumbai) – produz e protagoniza Monkey Man, cuja história descrita como “John Wick em Mumbai” foi considerada demasiado pesada para o público indiano pela Netflix, sendo necessário Jordan Peele (Get Out) assistir ao filme, comprá-lo e dar-lhe uma janela de visualização em cinema de tal maneira impressionado que ficou.

Monkey Man conta a história de Kid (Patel), um jovem que tenta sobreviver, noite após noite, num clube de luta clandestino onde, usando uma máscara de macaco, é espancado por lutadores mais populares a troco de dinheiro. Após anos de raiva acumulada, Kid descobre uma maneira de se infiltrar no centro da corrupta elite da cidade. Com traumas de infância a fervilhar, as suas mãos misteriosamente marcadas por cicatrizes lideram uma operação de vingança destinada a ajustar contas com os homens que tudo lhe tiraram.

“Eu acho que o género de ação é, por vezes, abusado pelo sistema. Eu queria dar-lhe alma real, trauma real, dor real… E queria infundir o filme com alguma cultura.” Patel proferiu estas palavras ao introduzir o filme na SXSW e cumpriu com o prometido. Diga-se o que se disser sobre a sua estreia – que tem problemas, já lá vamos -, não são assim tantos os cineastas com capacidade de transportar a sua vontade, visão e coração para o grande ecrã. Alguns perdem-se pelo meio de fórmulas narrativas, outros pelas decisões executivas do estúdio e muitos simplesmente não têm o talento necessário, por mais que custe aceitar tal testamento.

O compromisso de Patel para com a sua história e personagem é notável, mas estas caraterísticas do ator já eram conhecidas. Qualquer espetador sabia que Patel entregaria uma performance digna de inúmeros elogios e, em Monkey Man, volta a brilhar com uma interpretação mais complexa do que aparenta, sendo obrigado a demonstrar fúria, ódio e rancor de uma forma extremamente intensa, mas igualmente restringida durante grande parte do tempo de execução. O ator contribui tanto para a atmosfera gradualmente mais tensa quanto a banda sonora poderosa de Jed Kurzel (Overlord) e respetiva produção de som, assim como a premissa narrativa que promete um terceiro ato guiado por ação.

Aliás, os destaques de Monkey Man passam pela narrativa culturalmente e tematicamente rica e, claro, pelas lutas desenfreadamente violentas. “Para mim, é um hino às minorias sem voz e os marginalizados”, diz Patel quando questionado sobre a mensagem da obra e o valor da representação na mesma – a comunidade hijra, conhecida como o terceiro género na Índia, surge num momento crucial da obra e ocupa bastante tempo de ecrã. É triste admitir isto, mas a verdade é que será sempre um risco elevado trazer este tipo de representação simplesmente porque trará um certo tipo de espetadores que não perderão um segundo em tentar boicotar o mesmo. Felizmente, Patel mantém-se fiel à sua missão e não só chega a focar-se totalmente nesta comunidade, como explora a sua ligação religiosa para com uma figura divina – mistura de dois deuses hindu, um homem, outro mulher -, simbolizando a sua não-conformidade com o resto da sociedade.

Em termos de ação, Monkey Man tem a mentalidade de “imitação é a melhor forma de elogio”. Com referências evidentes de John Wick, Old Boy e The Raid, Patel e a sua equipa de stunts organizam sequências de luta longas e com um ritmo acelerado. No entanto, surge aqui um dos primeiros problemas com a obra. Narrativamente, faz todo o sentido que a ação seja pouco polida durante a maior parte do tempo de execução visto que Kid não é um lutador nato, logo a câmara agitada de Sharone Meir (Silent Night) e montagem confusa (Dávid Jancsó, Tim Murrell) têm o seu sentido, apesar de visualmente não ser bonito nem compreensível de se assistir em certos pontos.

Apenas no terceiro ato, após determinados eventos que levam Kid a melhorar nestas situações violentas, é possível respirar um pouco com um ligeiro afastamento da câmara que permite ver, agora sim, combates com duplos fenomenais. Patel mantém, mesmo assim, os espetadores bem próximos do protagonista, tentando sempre criar um ambiente de “luta de rua” onde não há regras e tudo pode acontecer, para além da brutalidade crua e sangrenta. A estrutura deste ato recorda até videojogos em que é necessário ultrapassar vários “maus da fita” de diferentes dificuldades até chegar ao “final boss” no topo do seu “castelo”.

Enquanto que o ritmo das cenas de ação não possui qualquer espaço para descansar, Monkey Man sofre com este mesmo aspeto no desenrolar do enredo principal. Demasiado flashbacks pouco percetíveis inflacionam o tempo de execução, mas são fáceis de concluir o que aconteceu no passado, ultimamente tornando o filme ainda mais previsível do que já era, para além de chegar a um ponto onde a continuação da aplicação deste método de contar história deixa de ter valor. Também existe pouco desenvolvimento de personagem para além de Kid, o que não é um mal por defeito, mas pelo menos o antagonista – um guru espiritual corrupto sem piedade pelos pobres – tinha potencial para um estudo mais instigante do ponto de vista político-social.

Finalmente, um pequeno aparte. É uma verdade desconfortável, mas este tipo de comportamento é inegável. O facto de Patel ser um ator popular coloca logo a sua estreia na realização numa posição diferente de, por exemplo, um cineasta completamente desconhecido. Monkey Man não é uma primeira longa-metragem perfeita, longe disso, mas temo que a lente crítica no geral seja “menos firme” precisamente pela história vir de Patel. A pressão será sempre maior em quem nunca provou nada em nenhum departamento cinematográfico, mas Patel já provou – e não foi pouco – no campo da atuação. Ser justo e honesto é julgar o seu trabalho nas mesmas circunstâncias que todos os outros que passaram pelo mesmo cenário. E sendo assim…

VEREDITO

Monkey Man mostra que Dev Patel ainda tem muito que aprender no campo da realização e argumento, mas o compromisso inabalável para com uma história culturalmente e tematicamente rica merece inúmeros elogios. Um arco de vingança com alguns problemas de ritmo narrativo, mas com sequências de ação carregadas de energia e adrenalina, mesmo quando caoticamente coreografadas e filmadas. Prestação previsivelmente dedicada de Patel que evita algumas fórmulas do género enquanto presta homenagem a alguns dos clássicos que o inspiraram. Estreia imperfeita, mas convincente.

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