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Gladiator II pode não alcançar o impacto inovador do filme original, mas não deixa de ser uma experiência cinematográfica impressionante, capaz de transportar o público para um épico repleto de grandiosidade visual e emotiva.

Nada melhor como iniciar um novo milénio com um épico histórico que viria a ter um impacto cultural e artístico indisputável. Gladiator é considerado por muitos como o “magnum opus” da carreira de Ridley Scott, algo tremendamente complicado de se afirmar, tendo em conta que o cineasta entregou-nos outras memoráveis obras-primas ao longo da sua carreira como Blade Runner, Alien ou Thelma & Louise. Pessoalmente, contento-me com o facto de pertencer ao grupo que aclama Gladiator como um desses clássicos e – como alguém que despreza a opinião terrível em volta da “necessidade” de novos lançamentos baseados em obras passadas -, senti-me altamente entusiasmado para assistir à sua sequela Gladiator II.

Gladiator II avança vários anos após a morte de Maximus (Russell Crowe), seguindo a caminhada de Lucius (Paul Mescal) até ao Coliseu depois de imperadores poderosos conquistarem a sua cidade. Carregado de raiva no coração e o futuro do império nas mãos, o protagonista de Gladiator II inspira-se no passado para encontrar a força e a honra necessárias para fazer regressar a glória de Roma ao seu povo. O argumentista David Scarpa (Napoleon) volta a trabalhar com Scott, sendo que o elenco encontra-se recheado de caras novas e antigas.

O que faz de Gladiator um clássico intemporal é o seu sucesso em gerir todos os seus departamentos. Todos os elementos de cinematografia e de narrativa destacam-se tanto individualmente e coletivamente, envolvendo os espetadores numa experiência incrivelmente imersiva, transportando os mesmos para uma época onde a violência não só equivale a espetáculo para a sociedade, como move o mundo através de corrupção política, escravidão e morte. A narrativa do filme original contém entretenimento para dar e vender, mas é a análise temática complexa e variada que conquista a atenção e coração da audiência que se deixa levar até a uma das conclusões mais catárticas e inesquecíveis da história do cinema.

E é precisamente na exploração dos mesmos tópicos em que Gladiator II simultaneamente brilha e desvanece, pois apesar da profundidade temática oferecida aos vários assuntos estudados, Scott e Scarpa não quebram a sensação de que já se navegou por este caminho. A estrutura e narrativa do argumento da sequela são, de muitas maneiras, semelhantes às da obra anterior, pelo que a duração longa do filme sofre mais com alguma perda de fulgor entre as sequências de ação ou de maior desenvolvimento de enredo.

O desejo por controlo e poder político é incorporado por Macrinus (Denzel Washington), um antigo escravo que deseja controlar Roma, tal como Commodus (Joaquin Phoenix) também desejava manter o seu trono, nenhum se encontra preocupando com as consequências para quem os rodeia, nem o povo romano. A dualidade entre justiça e vingança é novamente uma motivação crucial do protagonista, desta vez de Lucius, apesar da razão ser idêntica à de Maximus – não aprecio o facto de terem revelado a conexão entre estes dois nos trailers, mas infelizmente, vivemos na Era da informação a todo o custo – assim como as suas virtudes de honra e lealdade em contraste com a falta de integridade dos antagonistas.

A relação entre a vida e morte, tal como o pós-vida, é abordada através dos mesmos flashbacks que Maximus tinha, sendo que a dicotomia entre destino e liberdade eleva o filme a níveis de tensão necessários para os momentos de decisão das personagens ao longo dos seus arcos. Portanto, Gladiator II explora as complexidades da natureza humana, sociedade e a procura de propósito num mundo definido por conflito constante e ambiguidade moral… tal como o original. Não considero que o faça nem melhor, nem pior, mas o simples facto do elemento surpresa não estar presente, retira algum interesse à narrativa mais previsível.

Já tecnicamente, Gladiator II cumpre com o esperado, aproveitando a evolução tecnológica e a importância atual dada ao departamento de duplos para criar sequências de guerra e lutas incrivelmente cativantes. No geral, a ação acaba por se tornar mais “polida” no sentido de possuir coreografias mais desenvolvidas, planos longos – mérito para a cinematografia belíssima de John Mathieson que regressa do primeiro filme – efeitos visuais aprimorados e quantidades consideráveis de sangue e de mortes macabras. Dito isto, o caos inerente às batalhas mantém-se intacto, sendo inevitável sentir os níveis de adrenalina a subir sempre que uma nova sequencia de ação se inicia.

Seja a sequência de abertura épica à conclusão digna de arrepios, Gladiator II dificilmente deixará o espetador mais casual desiludido, mesmo apesar da duração não ser a mais acessível. A banda sonora de Harry Gregson-Williams (The Last Duel) é igualmente destaque ao conseguir utilizar os temas mais memoráveis da música de Hans Zimmer como meros complementos à sua própria composição original que tanto eleva os momentos mais impactantes, nomeadamente o clímax. 

E, tal como em 2000, as prestações transformativas de todo um elenco tornam tudo ainda melhor. Mescal (Aftersun) e Pedro Pascal (The Last of Us) entregam prestações físicas impressionante para o grande ecrã, realizando as suas próprias coreografias intensas de luta. O primeiro possui uma capacidade magnética de discursar e agarrar a atenção dos demais, enquanto que o segundo consegue através de pequenas expressões dar a entender mais do que o superficial sobre a sua personagem. No entanto, os holofotes batem mais forte com Washington (Training Day) que demonstra toda a sua aura especial que cativa todo o tipo de espetadores. Um verdadeiro “scene-stealer”. Os regressos de Connie Nielsen e Derek Jacobi são justificados e os atores voltam a representar as suas personagens na perfeição, ao passo que Joseph Quinn (A Quiet Place: Day One) entrega intensidade como ninguém, continuando a evolução fantástica que tem tido ao longo dos últimos anos.

Sempre que surgem as chamadas “legacy sequels”, a opinião em torno das suas necessidades volta a surgir. Pessoalmente, considero que a comunidade cinéfila confunde frequentemente este termo com a justificação para um novo filme existir. Gladiator II ser necessário ou não é irrelevante para a qualidade e desfrutação do mesmo. O que verdadeiramente importa é se a história criada e personagens introduzidas justificam a existência da sequela para lá da obra original. E, de forma bastante direta, a resposta é claramente positiva, provando que Scott ainda tem muito para dar ao cinema.

VEREDITO

Gladiator II pode não alcançar o impacto inovador do filme original, mas não deixa de ser uma experiência cinematográfica impressionante, capaz de transportar o público para um épico repleto de grandiosidade visual e emotiva. Ridley Scott volta a demonstrar o seu domínio em conjugar narrativa, ação e profundidade temática, entregando uma sequela caraterizada por uma execução técnica soberba e interpretações memoráveis das quais se destaca a de Denzel Washington. Independentemente das inevitáveis comparações com o clássico, o lendário cineasta apresenta uma história que se justifica pela sua própria qualidade e relevância, apesar de percorrer caminhos já desenvolvidos anteriormente. Necessário ou não, o que realmente importa é a força (e honra) com que uma obra nos conquista – e, aqui, Gladiator II triunfa.

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