Free Guy contém um tributo notável aos videojogos, mas é o argumento surpreendentemente inteligente e tematicamente rico que torna o filme num dos meus favoritos do ano.
Sinopse: “Um caixa de um banco descobre que é, na verdade, figurante num videojogo e decide tornar-se o herói da sua própria história… que ele mesmo rescreve. Agora, a viver num mundo onde não há limites, ele está determinado a ser o homem que salva o seu mundo, à sua maneira… antes que seja tarde demais.”
Não me posso considerar um jogador dedicado no sentido em que não jogo centenas de jogos em diferentes plataformas no meu tempo livre, mas pertenço, sem dúvida, à comunidade dos videojogos. Estes sempre fizeram parte da minha vida e alguns dos momentos mais hilariantes da minha infância ocorreram enquanto jogava Nintendo 64 com os meus irmãos mais velhos. Hoje em dia sucumbi ao popular Fortnite, mas também não consigo evitar aventurar-me em jogos de franquias que adoro profundamente, como Star Wars, Tomb Raider ou Assassin’s Creed.
Como sempre, não assisti a um único trailer de Free Guy, logo as minhas expetativas eram tão simples quanto “espero divertir-me”. Certamente não antecipava que um filme de videojogos – não é baseado num jogo real, mas não deixa de ser uma obra sobre os mesmos – se tornasse num dos meus favoritos do ano, surpreendendo-me com o quão inesperadamente inteligente e ridiculamente entretido realmente é… Shawn Levy (Night at the Museum) e a sua dupla de argumentistas – Matt Lieberman (SCOOB!) e Zak Penn (Ready Player One) entregam a maior surpresa de 2021!
Nem sei por onde começar. Talvez com a declaração que chama mais à atenção: Free Guy é o melhor filme de videojogos de sempre e nem sequer é uma adaptação de nenhuma propriedade conhecida – para além de ser muito, muito mais do que apenas um “videogame flick”. É uma história original que não só oferece um excelente tributo à comunidade de jogadores – convidando algumas das personalidades mais influentes do meio para cameos recompensadores e engraçados -, como também quebra imensos estereótipos ao longo do caminho, mostrando os inúmeros benefícios dos videojogos sem nunca parecer uma mensagem forçada.
São centenas de detalhes que os jogadores, mais dedicados ou casuais, irão reconhecer e deixar-se entusiasmar pelos mesmos, mas não deixem que as minhas palavras vos enganem. Free Guy é uma explosão de entretenimento para todos, jogadores ou não. Desde sequências de ação impressionantemente filmadas ao mundo virtual visualmente deslumbrante, foi o filme que mais diversão me ofereceu no grande ecrã este ano. A Disney também mostra que ser dona de todos os estúdios não traz só pontos negativos. Na verdade, este filme serve de prova para o potencial positivo que a empresa do Mickey Mouse possui atualmente por ter quase todas as sagas favoritas dos fãs no seu portefólio – o clímax pesado em ação é a definição perfeita de um nerdgasm.
Passando ao elenco, estava seriamente receoso que Ryan Reynolds (Deadpool) prejudicasse o filme com os seus maneirismos cómicos por vezes exagerados e a sua improvisação frequentemente excessiva, mas o ator é capaz de moderar a sua prestação de forma fantástica. Reynolds é engraçado como habitual, mas o elenco secundário encontra-se no mesmo patamar. Jodie Comer (Killing Eve) entrega o que acredito ser a sua melhor carta de apresentação no mundo do cinema, Joe Keery (Stranger Things) começa a mostrar que é capaz de ser um jovem ator verdadeiramente subvalorizado e Lil Rel Howery (Judas and the Black Messiah) é o companheiro perfeito para a personagem de Reynolds.
A maioria dos espetadores provavelmente irá concentrar-se somente na ação e na natureza divertida do filme, mas Free Guy diferencia-se de obras semelhantes devido à sua premissa aparentemente simples que, na verdade, mostra ser extraordinariamente inteligente, emocionalmente convincente e surpreendentemente profunda. Um tema mais complexo sobre a natureza humana e o que é verdadeiramente real é lindamente explorado durante todo o tempo de execução. Usando as personagens que habitam os videojogos como uma analogia interessante ao mundo real, Levy, Lieberman e Penn lidam com estas questões sensíveis com tanto cuidado que acabaram com uma das melhores cenas de diálogo de todo o ano.
Geralmente, as pessoas definem “realidade” e “humano” como algo palpável, visível ou físico, mas raramente olham para “momentos” e como se sentem ao passar por um. Nunca antecipei que um filme que inevitavelmente examina a experiência multi jogador e os jogadores por detrás do ecrã me fosse surpreender ao ponto de genuinamente me fazer importar com personagens de um videojogo. É hilariantemente self-aware, alegre, incrivelmente cativante e possui todas as caraterísticas que o público em geral adora, mas não deixem ninguém afirmar que é apenas um “filme de videojogos”.
Sendo honesto, não tenho grandes queixas a apontar. Antwan (Taika Waititi) é propositadamente exagerado e segue o arquétipo que o ator-realizador-argumentista normalmente interpreta. É admitidamente um pouco uma caricatura demais para o meu gosto, mas entendo a intenção. No entanto, Mouser (Utkarsh Ambudkar) tem um arco cliché que estranhamente termina, retratando-o como amigo da personagem de Keery, Keys, quando Mouser é tudo menos isso. Independentemente disso, são apenas meras observações sobre um filme que genuinamente adoro e que mal posso esperar para ver novamente.
Free Guy contém um tributo notável aos videojogos, mas é o argumento surpreendentemente inteligente e tematicamente rico que torna o filme num dos meus favoritos do ano. Para além dos visuais impressionantes, pedaços de comédia hilariantes e sequências de ação carregadas de energia, Shawn Levy, Matt Lieberman e Zak Penn oferecem uma narrativa brilhante que explora profundamente a natureza humana e o que os espetadores interpretam como “real”.
Prestações soberbas de todo o elenco, nomeadamente Ryan Reynolds e Jodie Comer, e cameos de fazer cair o queixo elevam tremendamente a experiência geral. Honestamente, é capaz de ser o primeiro filme a provar que o facto da Disney possuir todos os grandes estúdios também tem os seus benefícios. O que podia ter sido simplesmente “mais um filme de videojogos” é, na verdade, uma visualização muito satisfatória e super entusiasmante com personagens emocionalmente convincentes e uma história extraordinariamente interessante.
Recomendação obrigatória para quem gosta de videojogos, mas não deixem as minhas palavras vos enganarem: Free Guy é uma explosão de entretenimento para todos!