Crítica – A Quiet Place: Day One

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A Quiet Place: Day One destaca-se pelo seu argumento tematicamente rico, complexo e universal, continuando a exploração da franquia em tópicos como a luta pela sobrevivência, humanidade e vontade de viver, mas enriquecendo a saga com arcos de personagem inspiradores em torno de saúde mental, física e emocional.

Para cinéfilos como eu, a vasta maioria dos filmes vistos ao longo do ano não necessita de razões específicas para me “convencer” a fazer uma visita ao cinema ou a ligar a televisão num dos canais de streaming. Dito isto, existe sempre um elemento de destaque na obra a assistir que eleva as expetativas, seja este o realizador, argumentista, elenco, género, franquia ou outro dos inúmeros aspetos apelativos da 7ª arte. Quase tudo sobre a produção desta prequela aumentava o interesse e entusiasmo para a mesma. Realizado e escrito por Michael Sarnoski (Pig), protagonizado por Lupita Nyong’o (Us) e, claro, co-produzido pelo cineasta-ator que começou tudo isto, John Krasinski, A Quiet Place: Day One conta a história do dia em que o mundo sucumbiu ao silêncio. 

Sem querer cair numa dimensão pessoal desnecessária, A Quiet Place: Day One não podia ter sido lançado em melhor altura do ano. Sarnoski demonstra todas as suas qualidades enquanto realizador ao conseguir construir uma atmosfera apocalíptica verdadeiramente caótica e genuinamente assustadora, igualmente repleta de sequências carregadas de tensão que irão satisfazer os espetadores em busca de puro entretenimento de horror. O uso inteligente de fundos desfocados para criar ainda mais suspense e a confiança total no elenco ao seu dispor – permitindo um trabalho de câmara persistente para deixar os atores, de facto, atuarem – são apenas dois dos imensos atributos técnicos visíveis ao longo da obra.

No entanto, é no argumento que Sarnoski consegue transformar A Quiet Place: Day One em mais do que um mero exercício cinemático para satisfazer perguntas superficiais sobre a origem de tudo. Tematicamente, esta prequela/spin-off é tão ou mais rica que os outros filmes da saga. Segue os tópicos centrais da franquia – história de sobrevivência, humanidade e vontade de viver -, mas acrescenta arcos de personagem inspiracionais e belissimamente desenvolvidos em torno de assuntos complexos como lidar com ansiedade extrema, doenças terminais que retiram a tal vontade de viver e, até, a ajuda vital de animais de suporte emocional, assim como a importância dos pormenores aparentemente irrelevantes do dia-a-dia que damos como garantidos.

Como alguém que passou por uma fase pessoal de saúde complicada – admitidamente bem longe de um cenário apocalíptico -, não pude deixar de me emocionar com algumas interações entre Sam (Nyong’o) e Eric (Joseph Quinn), sendo que os poucos diálogos que possuem são incrivelmente significantes. Continuar a lutar pela vida e não esquecer de viver em circunstâncias onde a vida em si parece ser tudo aquilo que não deve existir são mensagens que ficaram comigo e que têm um impacto narrativo e temático tremendo ao longo de A Quiet Place: Day One.

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A Quiet Place: Day One (Paramount Pictures)

Enquanto alguém que sofre de ansiedade e que ama cães mais que muitos seres humanos, Sarnoski consegue transportar momentos únicos e que considerava extremamente pessoais na minha vida para uma história fictícia insana onde aliens invadem o nosso planeta e atacam pessoas ao mínimo ruído sonoro. Sempre tive dificuldades em explicar por palavras o quanto a presença e companhia de cães têm de confortante e calmante na minha serenidade diária. Bem, A Quiet Place: Day One passa a ser o melhor exemplo audiovisual possível.

A banda sonora de Alexis Grapsas (Pig) adiciona uma camada sentimental à narrativa que as obras anteriores não tinham – A Quiet Place: Day One tem mais liberdade para usar música de fundo que o futuro pós-apocalíptico – ao passo que, em termos de construção de mundo, a prequela não oferece muito à saga. Não existe nenhuma história de origem especial sobre porque é que os aliens invadiram a Terra – simplesmente apareceram – e o “como” já era conhecido, apenas nunca antes visto numa escala tão grande como a de uma cidade como New York. Logo, como o fator novidade é inexistente, não só os monstros acabam por perder algum poder enquanto elementos narrativos misteriosos e assustadores, mas também não há espaço para alguma adição criativa ao seu movimento ou maneiras de os combater, levando a repetições de momentos já vistos uma e outra vez nas outras parcelas – por exemplo, assistir às personagens aprenderem que podem falar quando a sua voz é camuflada por outros sons como chuva ou trovoada.

Dito isto, A Quiet Place: Day One é pouco prejudicado por estes problemas menores causados pelo simples facto de pertencer a uma saga, sendo que os atores facilmente compensam por qualquer queda em níveis de interesse ou entretenimento com prestações soberbas de uma ponta à outra, apesar de ser um elenco curto. Alex Wolff (Hereditary) aproveita todos os minutos de tempo de ecrã para demonstrar um Reuben, cuidador do hospício onde Sam se encontra a lutar contra o seu cancro, altruísta e exemplar da bondade pura do ser humano. Quinn (Stranger Things) representa na perfeição a falta de controlo total proveniente de ataques de ansiedade sempre inconvenientes, mas acima de tudo, retrata Eric de forma soberba, um britânico perdido em New York de fato e gravata para estudar Direito que vê em Sam um pilar para a sua sobrevivência e, principalmente, para a sua saúde mental.

Mas é Nyong’o que, mais uma vez, demonstra que merece pertencer à categoria de A-listers em Hollywood. A Quiet Place: Day One é um demonstração magnífica para a atriz que já sofreu com o conhecido preconceito contra o género de horror nas temporadas de prémios, ao ser “roubada” de uma maior atenção pela sua performance impressionante em Us. A esperança é a última a morrer, logo espero que consiga maior reconhecimento pela sua representação de uma mulher corajosa que, mesmo enfrentando a dor incomparável de um cancro, serve de inspiração para outros lutarem pela vida tal como a mesma recordou, através de Eric, a alegria de viver quando tudo à sua volta apontava para o oposto.

VEREDITO

A Quiet Place: Day One destaca-se pelo seu argumento tematicamente rico, complexo e universal, continuando a exploração da franquia em tópicos como a luta pela sobrevivência, humanidade e vontade de viver, mas enriquecendo a saga com arcos de personagem inspiradores em torno de saúde mental, física e emocional. Michael Sarnoski demonstra a sua habilidade excecional em gerar uma atmosfera apocalíptica repleta de suspense e terror ao virar de cada esquina, sendo que o valor de entretenimento encontra-se garantido durante todo o tempo de execução. As performances notáveis de Lupita Nyong’o, Joseph Quinn e Alex Wolff elevam tremendamente o filme, com a atriz, em particular, entregando uma prestação poderosa e intensa que sublinha a importância de (re)encontrar esperança e alegria no meio do desespero. Nota ainda para o destaque dado à importância de animais de suporte emocional que torna esta obra numa adição valiosa e comovente à saga.

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