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A Haunting in Venice é, com alguma margem, a melhor adaptação cinematográfica da atual trilogia sobre Hercule Poirot.

Murder on the Orient Express podia ter sido bem melhor e Death on the Nile foi uma desilusão tremenda, mas, ainda assim, as histórias de Hercule Poirot imaginadas por Agatha Christie tendem sempre a capturar o meu interesse total. As adaptações cinematográficas têm estado nas mãos do realizador-ator Kenneth Branagh (Oppenheimer) e do argumentista Michael Green (Blade Runner 2049), tal como A Haunting in Venice que completa a agora trilogia de whodunnits misteriosos, sendo que esta última obra mergulha os dedos dos pés do género de horror.

Tendo em conta a opinião geral sobre as primeiras obras, afirmar que A Haunting in Venice é a melhor adaptação até à data não significa muito, mas a verdade é que Branagh e Green conseguem, de facto, evitar alguns dos erros cometidos anteriormente e aproveitar a nova atmosfera sombria e negra para adicionar uma camada extra de suspense, fascínio e intriga ao enredo. Possui o elenco menos “recheado” da trilogia, mas sinceramente, até acaba por beneficiar as diversas linhas narrativas focadas na inevitável investigação e interrogatórios de Poirot – sequências essas que devem ser guiadas mais pelas personagens respetivas e não pelos atores.

A Haunting in Venice obriga Poirot a analisar dois mistérios distintos mas, de certa forma, interligados. O primeiro advém da premissa deste tipo de obras: o trabalho típico de detetive, encontrar o(a) culpado(a) do homicídio que costuma marcar o fim do primeiro ato. Nada a que o famoso detetive não esteja habituado. No entanto, o segundo mistério é tão ou mais cativante devido à sua camada inerentemente pessoal: a presença e impacto de entidades sobrenaturais. Assistir a Poirot tentar encontrar respostas para o paranormal quando é uma pessoa essencialmente guiada pela lógica, raciocínio e ciência torna-se verdadeiramente no enredo mais aliciante do filme, para além do peso temático que acrescenta.

a haunting in venice echo boomer 2

Ambos os mistérios de A Haunting in Venice mantêm-se bastante vivos até ao fim, uma melhoria significativa em relação aos seus antecessores. Repito o que já escrevi em outras críticas: um whodunnit vale mais do que meramente encontrar ou adivinhar quem é o assassino, mas esta é a primeira obra que realmente consegue gerar dúvidas genuínas até à cena de exposição final de Poirot. Praticamente todas as personagens possuem motivos convincentes, apesar de o interesse em cada interrogatório individual variar de indiferente a hipnotizante.

Tal como nem todas as linhas narrativas agarram os espetadores, nem todas as perguntas são respondidas. Por um lado, o tal mergulho no género de horror oferece uma atmosfera única a estes mistérios de Poirot, sendo que a direção de Branagh é nada menos que brilhante no que toca à construção de momentos carregados de suspense. Os sustos são eficientes, mas são os build-ups para os mesmos que transformam por completo inúmeras cenas ao longo de A Haunting in Venice. Por outro lado, ambiguidade não encaixa muito bem neste mundo de lógica extrema, logo a adição de componentes sobrenaturais que terminam sem explicação – ou com “desculpas esfarrapadas” como o uso de alucinogénios – deixa um sabor amargo durante a conclusão da obra.

Branagh demonstra aptidão notável enquanto cineasta no que toca a criar um ambiente verdadeiramente imersivo. Desde planos glamorosos sobre Veneza ao uso de sombras e de escuridão natural, A Haunting in Venice é, sem margem para dúvidas, o filme da trilogia que mais beneficia dos seus atributos técnicos. Abusa ligeiramente dos ângulos tortos de cima para baixo e alguns momentos de “ação” são demasiado agitados e tremidos, mas no geral, é impossível negar o estilo distinto do realizador que também deixa o público entretido com a sua interpretação já icónica do protagonista.

Tal como referido acima, o elenco pode não ser o mais “estrelado” da saga, mas as prestações permanecem fantásticas de uma ponta à outra. Branagh emprega o bigode de Poirot com a mesma vivacidade e expressões que caraterizam o detetive, sempre com um humor especial que torna todas as interações únicas. Tina Fey já tinha demonstrado qualidades dramáticas em filmes anteriores, mas em A Haunting in Venice consegue um balanço interessante com as suas veias cómicas. Michelle Yeoh expectavelmente rouba os holofotes sempre que se encontra na frente do ecrã.

VEREDITO

A Haunting in Venice é, com alguma margem, a melhor adaptação cinematográfica da atual trilogia sobre Hercule Poirot, corrigindo muitos dos erros do passado e aproveitando o talento nato de Kenneth Branagh enquanto cineasta e ator para se destacar como uma obra mais sombria e atmosférica. Conta com prestações divinais, sequências de suspense com build-ups intensos e um par de mistérios genuinamente intrigantes que se aguentam até ao fim. Alguma ambiguidade sobre os temas sobrenaturais parece não pertencer a este mundo guiado por lógica, assim como nem todos os enredos de personagem merecem o tempo de ecrã associado aos mesmos. Usando este último filme como base para novas sequelas, a saga tem tudo para continuar…

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