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Cleaner é um thriller funcional que cumpre os requisitos mínimos do género sem nunca se destacar verdadeiramente.

Existem certas caraterísticas cinéfilas que automaticamente me deixam interessado num filme. No que toca a Cleaner, a protagonização de Daisy Ridley (Star Wars), a realização de Martin Campbell (GoldenEye, Casino Royale) e uma premissa narrativa à la Die Hard cumprem e, até, ultrapassam os requisitos mínimos para me levar ao grande ecrã ou, neste caso, ao confortável sofá de casa. No entanto, tais elementos da obra não significam que as expetativas não possam ser ajustadas de forma realista.

Olhando para a sinopse oficial de Cleaner, não esperava nada mais nada menos que uma variação genérica da fórmula de sucesso gerada pelo clássico mencionado acima. Ridley interpreta Joey, uma ex-militar que se dedicou à limpeza de vidros, que se vê suspensa 50 andares no exterior de um arranha-céus após um grupo de ativistas radicais tomar controlo de uma gala anual de uma empresa de energia. Com 300 reféns e um membro terrorista “infiltrado” no grupo ativista, Joey é obrigada a salvar as pessoas inocentes dentro do prédio, incluindo o seu irmão mais novo, Michael (Matthew Tuck).

A quantidade de clones de Die Hard é demasiado vasta para se chegar a um número conclusivo, mas afirmar que já se deve encontrar na ordem de grandeza das centenas poderá não ser um exagero. Costuma-se descrever tais histórias como “Die Hard mas …” e acrescentar o novo local escolhido para conseguir uma descrição perfeita da obra. Cleaner é “Die Hard mas“… bem, no “mesmo” arranha-céus que Die Hard. A maior diferença não se encontra na localização, mas sim nas motivações do grupo ativista/terrorista.

Aliás, um dos temas principais explorados pelo argumento de Simon Uttley (Alleycats), Paul Andrew Williams (Bull) e Matthew Orton (Operation Finale) é precisamente a linha ténue que existe entre ativismo extremista e terrorismo, assim como os comportamentos entre gerações mais velhas e novas deste tipo de grupos. A missão pode ser comum – em Cleaner, o objetivo passa por revelar a corrupção massiva dentro de uma empresa que apenas contribui para a destruição exponencial de ecossistemas naturais -, mas quando um lado é mais passivo e vocal enquanto que o outro é mais agressivo e violento, é fácil de perder a noção das diferenças e deixar ser levado pelo caos.

A camada temática de Cleaner é de louvar, mesmo sem apresentar um estudo provocante propriamente inovador. Aliás, tomara que o resto do enredo tivesse o mesmo nível de cuidado – desde a estrutura narrativa familiar aos diálogos básicos, é raro encontrar momentos genuinamente originais que não sejam uma mera cópia genérica de cenas já vistas nas tais centenas de variações desta história previsível. As sequências de ação não impressionam, mas contêm níveis de entretenimento e tensão decentes, especialmente quando se focam na dedicação de Ridley em executar a maioria das suas ações mais físicas, incluindo ficar pendurada do lado de fora de um prédio bem alto.

A atriz é, sem margem para dúvidas, o grande destaque de Cleaner e, sinceramente, não creio que o filme conseguisse chegar a porto seguro sem esta prestação bem completa. Seja o seu esforço físico, o seu alcance emocional notável ou a sua química genuína com Tuck, Ridley demonstra novamente que merece muito mais oportunidades em obras de renome global. É pena que uma trilogia criminalmente afetada por uma das comunidades mais tóxicas da história do cinema ainda prejudique a carreira da atriz – e de tantos outros que trabalharam na mesma saga – nos dias de hoje.

Impossível não abordar também a relação entre os irmãos Joey e Michael, sendo que este último é apresentado como um ser neuro-divergente no espetro autista. Ambos tiveram uma infância traumática, mas ao mesmo tempo que o irmão sofria nas mãos violentas dos pais, a irmã fugia para o parapeito da janela até a confusão terminar. Cleaner salta décadas mais tarde, onde Joey fica encarregue de tomar conta do irmão, mas este passa mais tempo a trocar de locais institucionais do que a conviver com a irmã.

A dinâmica complexa de um relacionamento deste estilo é algo que, com certeza, tocará no coração de muitos espetadores e a mensagem positiva sobre este tipo de condição neurológica não impedir ninguém de poder ser o herói de qualquer história será altamente bem recebida. Dito isto, a execução de Cleaner em relação a este tópico deixa algo a desejar, sendo que o diálogo pouco natural não ajuda a convencer que esta caraterística de personagem não seja meramente uma espécie de checklist para cumprir com quotas de diversidade. Evidentemente, as intenções de Campbell e dos seus argumentistas são benignas e, no geral, a representação do personagem é positiva, mas é necessário um cuidado especial quando se retratam condições mentais sérias e sensíveis.

VEREDITO

Cleaner é um thriller funcional que cumpre os requisitos mínimos do género sem nunca se destacar verdadeiramente. A dedicação total de Daisy Ridley eleva consideravelmente o material, mas a realização competente de Martin Campbell não consegue disfarçar um argumento previsível e um desenvolvimento temático que, embora louvável, não vai muito para além do superficial. No fim, são 90 minutos com entretenimento decente, mas que dificilmente deixarão uma marca duradoura no panorama dos incontáveis sucessores espirituais de Die Hard.

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