Clash: Artifacts of Chaos

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Com foco nos confrontos corpo a corpo, o novo título da ACE Team é divertido, desafiante e invulgar.

Em Clash: Artifacts of Chaos, a ACE Team marca o seu regresso antecipado ao mundo de Zeno Clash, naquele que foi, em tempos, um dos indies mais reconhecíveis do género. A sequela de Zeno Clash, lançada em 2013, não cativou os jogadores como o original, apesar de expandir o mundo e o sistema de combate físico, e foram necessários 10 anos até a produtora chilena voltar a tentar a sua sorte no género. No entanto, Clash: Artifacts of Chaos é um monstro diferente. Fora as semelhanças visuais entre os vários retratos do mundo de Zenozoik, o novo capítulo abandona a perspetiva na primeira pessoa e abraça o combate na terceira pessoa, agora com mais foco na personalização e numa aventura extensa em busca de vingança e respostas.

Conhecemos o mundo de Zenozoik através dos olhos de Pseudo, um ermita com dotes para o combate e um homem de poucas palavras, que vive em harmonia longe de tudo e todos. A sua paz é quebrada quando se vê responsável por Boy, uma criatura que diz estar amaldiçoada, abandonada pelo seu próprio irmão e caçada por Gemini, a terrível mestre dos artefactos. Pseudo afeiçoa-se ao rapaz e à sua sina enquanto amaldiçoado, e mesmo contra a sua vontade, decide lutar pela liberdade de Boy, explorando Zenozoik e os seus biomas em busca de recursos, novos equipamentos e habilidades num RPG de ação que se mantém divertido e envolvente até ao seu final.

Tal como Zeno Clash e a sua sequela, Clash: Artifacts of Chaos traz-nos um sistema de combate físico e em proximidade, com a maioria dos confrontos a acontecerem entre punhos e pontapés. Apesar de existirem armas que podemos encontrar e até construir, estas quebram-se com a utilização e é necessário dominar das habilidades naturais de Pseudo para derrotarmos os vários adversários que encontramos pelo caminho. Clash: Artifacts of Chaos não é tão deliberado e profundo como Sifu ou até Absolver, preferindo a simplicidade dos seus controlos e combinações em prol de uma experiência mais acessível, ainda que desafiante devido ao número de combatentes que nos desafiam. É fácil de começar e é familiar para quem já jogou brawlers ou outros RPG de ação, com uma combinação rápida de ataques com os punhos (relegados ao quadrado) e golpes especiais que podem ser mapeados à medida que desbloqueamos novas opções (definidos para o triângulo e os botões direcionais), e também um botão de desvio, que podemos combinar com um contra-ataque, e a habilidade de parry para evitarmos os golpes inimigos e deixarmos os adversários indefesos.

A evolução de Pseudo faz-se de nível para nível, com pontos de experiência a poderem ser alocados em quatro parâmetros distintos. No entanto, defendo que o mais importante é a personalização dos seus golpes especiais, que encontramos à medida que exploramos o mundo de Zenozoik, mas também das suas técnicas de combate. Começamos com apenas uma técnica, que escolhemos no início da campanha, mas cedo descobrimos novas formas de lutar que mudam o ritmo, cadência e impacto dos golpes de Pseudo. Os controlos nunca mudam, sempre focados na combinação entre golpes rápidos e os ataques especiais, mas cada técnica traz as suas vantagens e desvantagens, e existem diferenças notórias entre todas. Boxing é a classe mais equilibrada, muito forte em ataques com os punhos, mas não a mais rápida. Já Lightning, como o nome indica, é muito mais ágil e rápida na forma como disfere as suas combinações. Outro exemplo é a técnica Mammoth, mais lenta, mas poderosa nos seus ataques atordoantes, onde basta uma combinação falhada para sermos penalizados pelos nossos adversários.

O sistema de combate nunca é complexo e os confrontos podem ser caóticos quando temos mais do que um adversário em campo, como se a IA não conseguisse equilibrar ambos lutadores em simultâneo, mas Clash: Artifacts of Chaos traz elementos interessantes que injetam alguma novidade à fórmula. A primeira é a barra de defesa, que vem substituir a stamina popularizada pelos soulsbornes, permitindo à personagem que bloqueie ataques automaticamente. Isto pode parecer contraproducente para um título de combate, mas a barra de defesa está integralmente ligada aos ataques de Pseudo e quanto mais atacamos, menos possibilidades temos de defender. Isto significa que é necessário saber quando temos de recuar e bloquear ataques, servindo quase como uma barra de energia e não só de defesa. Esta barra pode ser evoluída ao longo do jogo e é uma dádiva quando estamos tão envolvidos num combate que não conseguimos acompanhar todos os adversários em simultâneo. É uma pequena vantagem, mas também um presente envenenado se pensarmos que a melhor tática é continuar a atacar sem discernimento.

O segundo elemento de destaque é a possibilidade de defrontarmos algumas das criaturas de Clash: Artifacts of Chaos em combates na primeira pessoa. Talvez seja apenas uma homenagem a Zeno Clash e à sua sequela, mas esta opção assume-se como uma habilidade importante para reequilibrarmos alguns dos confrontos mais complexos. Ao enchermos a barra de energia, temos a possibilidade de atacar um adversário e invertermos a perspetiva do jogo. Os controlos mantêm-se iguais, mas as combinações são ainda mais simples e diretas, com Pseudo a disferir golpes rápidos para desgastar o seu adversário e eliminá-lo num último e devastador golpe. Estes momentos centram os combates em confrontos 1 para 1, sem mais distrações e nunca se tornam repetitivos ou sentem-se fora do lugar, com a ACE Team a fazer a escolha certa ao manter os controlos idênticos e as combinações fora da complexidade dos combates tradicionais.

A cola que une Clash: Artifacts of Chaos, que lhe dá um novo charme e aprofunda mecanicamente o seu mundo e os seus habitantes, é a possibilidade de invocarmos o Ritual em todos os combates que não sejam contra animais. Sempre que Pseudo for desafiado por alguns dos mercenários, guerreiros ou fanáticos que procuram recuperar Boy, este tem a habilidade de retribuir o gesto e invocar uma partida de dados. Este é o Ritual, um mini-jogo onde temos a possibilidade de determinar alguns padrões da batalha e definir penalizações para o derrotado. Para jogar, só precisamos de atirar os dados para o pano e atacar os dados do nosso adversário com pins que influenciam as suas faces, com o objetivo de terminarmos a partida com o maior número possível. Se ganharmos, o nosso artefacto é ativado e podemos fazer com que o mapa fique envolto em névoa, que abelhas ataquem o nosso adversário, que este seja envenenado, ganhar a vantagem de disferirmos o primeiro ataque e o espaço de combate seja limitado. Tudo isto pode ser utilizado contra nós e é isso que torna o Ritual numa adição tão peculiar, mas também tão representativa de Zenozoik.

O Ritual está presente ao longo da campanha e é preciso adquirirmos novos dados e pins se quisermos manter a nossa sorte. Os pins servem um propósito bastante claro e se não estivermos preparados, o nosso adversário pode inverter a direção do Ritual com as peças certas, diminuindo o número das faces dos nossos dados com bastante facilidade. Existe um fator de sorte que poderá ser enervante e até injusto, mas é tão intrínseco ao mundo de Zenozoik que facilmente desculpo qualquer transtorno que me provocou – e provocou, com alguns combates a ficarem muito mais complexos devido ao Ritual. Podemos sempre recusar o Ritual e simplesmente combater, mas é aliciante ter a vantagem e enganar os nossos adversários. É aqui que está a sua magia.

Apesar dos seus vários elementos, o sistema de combate poderá ser saturante para aqueles que procuram maior profundidade. Para mim, foi o equilíbrio perfeito entre ter uma jogabilidade mais desafiante, mas com poucas opções, obrigando-me a aprender intrinsecamente as mecânicas presentes, sem sentir que existem distrações ou que o sistema de combate é artificialmente inchado por combinações e habilidades especiais inúteis. A dificuldade está nos adversários que encontramos, cada um com um leque de ataques e poderes que requerem uma leitura atenta e uma aprendizagem constante. Há algo de visceral em Clash: Artifacts of Chaos e no impacto dos golpes, na facilidade com que realizamos todos os seus ataques intuitivamente, mas sempre desafiados pela imprevisibilidade dos nossos inimigos. Se Absolver e Sifu foram assustadores, talvez Clash: Artifacts of Chaos seja uma boa opção para vocês – e o inverso também merece ser dito e reforçado.

A ACE Team não conseguiu evitar, no entanto, beber da fonte dos soulsbornes e algumas das suas funcionalidades são um reflexo dessa aproximação ao género. Ao longo da campanha, podemos criar acampamentos, onde evoluímos Pseudo, criamos poções e repousamos. Quando decidimos terminar o dia, os inimigos voltam à vida e os combates ficam novamente disponíveis, menos aqueles que são contra adversários de destaque. É uma adição pouco entusiasmante, servindo mais para treino do que propriamente como barreira ao progresso, visto que nunca perdemos pontos de experiência quando somos derrotados. Nesses casos, quando Pseudo perde em combate, o que acontece é que temos acesso à sua versão em madeira e é necessário derrotar quem nos matou para recuperarmos o nosso corpo original.

Esta versão em madeira, quase como um esqueleto fora do corpo de Pseudo, retém as habilidades do protagonista e não apresenta grandes novidades no que toca ao combate. No entanto, o corpo de madeira é essencial para a exploração, dando acesso a áreas inacessíveis por Pseudo. Estas áreas são bloqueadas por barreiras de espinhos, que são ineficazes no corpo de madeira, apresentando novos baús e até técnicas e habilidades novas que seriam inacessíveis sem esta forma de Pseudo. Para termos acesso ao corpo de madeira, que também pode ser equipado com novas partes – espalhadas pelos cenários e apenas visíveis quando estamos fora do corpo original do nosso protagonista -, temos de adormecer e acordar de noite, quase como se fôssemos a manifestação dos sonhos de Pseudo. Um elemento estranho e que gostava que estivesse mais desenvolvido e presente na exploração, sendo quase descartável em alguns momentos, com algumas das zonas inacessíveis a oferecerem poucas recompensas para o esforço adicional.

Outro elemento que achei interessante e que acho que adiciona mais camadas ao mundo de Zenozoik é a forma como adquirimos itens e equipamentos. Não existe um sistema monetário em Clash: Artifacts of Chaos e são as trocas que regem o seu mundo. Se queremos um item precisamos dos recursos certos para fazermos a troca. Simples e acessível ao mesmo tempo que dá peso à exploração e a torna essencial. Nestes vendedores temos acesso a armas, dados, pins e equipamentos que adicionam novos atributos a Pseudo e ao seu companheiro de penas. Não é o sistema de troca mais profundo que poderão encontrar, mas é o suficiente para adicionar novas camadas à evolução da personagem, com alguns equipamentos a melhorarem até a resistência aos elementos.

Talvez lhe falte profundidade e algum equilíbrio nos combates, nomeadamente quando temos mais do que um adversário em campo, mas Clash: Artifacts of Chaos é um jogo que nunca deixa de ser divertido e muito menos cansativo. O mundo de Pseudo é vibrante, imaginativo e surreal devido às formas ondulares com que se constrói, quase como uma banda desenhada europeia, psicadélica e experimental. Até o corpo das personagens desafiam as normas, com membros longos, torsos extensos e feições quase alienígenas, mas que retêm humanidade quando reconhecemos os seus padrões. Há, acima de tudo, harmonia em Clash: Artifacts of Chaos, seja no seu combate, na sua arte e na forma como exploramos o seu mundo em busca de recursos, novas técnicas de combate e habilidades especiais para Pseudo, com Zenozoik a interligar-se através de novos atalhos e caminhos alternativos. Uma boa opção para quem procura um RPG de ação com fortes inspirações nos soulsbornes, mas com um sistema de combate corpo a corpo, quase sempre sem armas e distrações.

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Cópia para análise (versão PlayStation 5) cedida pela Upload Distribution.

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