Bounty Star Review: Cowboys & Mechas

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Apesar das suas boas ideias e de um leque de sistemas que procuram dar maior profundidade à jogabilidade, Bounty Star não convence através do seu combate e direção estática.

Lanço-vos um desafio. Abram uma lista dos melhores westerns, não importa o país de origem, e verifiquem qual é a percentagem de filmes que se centram numa busca por vingança ou então redenção. Aposto que a percentagem é alta, confortavelmente acima dos 50%, onde filhos veem os pais a serem assassinados por bandidos, as suas terras roubadas ou então rivais que foram longe de mais. Isto não é uma tentativa de desvalorizar as qualidades do género western, antes evidenciar como a vingança é um tema que move muitos dos seus protagonistas, não só porque serve como motivação perfeita para o cenário violento e implacável do faroeste norte-americano, mas também porque o caminho da vingança é feito de sacrifícios. Antes de embarcares numa vingança, cava duas campas, já dizia Confúcio.

Não é de estranhar que Bounty Star, da DINOGOD, seja também uma história de vingança, ainda que longe do tom nihilista e estilizado de Red Dead Revolver ou Gun. Numa realidade alternativa, onde o Oeste foi ganho com robots gigantescos, Clem era uma veterana de guerra, responsável pela proteção da sua terra natal e do seu irmão, o seu último familiar. Clem, como tantos outros protagonistas neste género, só procurou fazer o que era mais correto, encontrar lei onde a lei supostamente não existia e dar ordem àqueles que procuravam apenas um escape para a violência dos terrenos áridos do deserto e dos bandidos que buscavam fama e glória através do crime. Uma má decisão, uma tentativa de fazer o que era mais correto e honesto bastou para Clem perder tudo o que lhe era mais sagrado. A aldeia foi dizimada, o seu irmão assassinado e a sua honra quebrada. Agora Clem é uma caçadora de prémios, uma sombra do que era, mas disposta a recomeçar enquanto procura aqueles que destruíram a sua vida.

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Bounty Star (Annapurna Interactive)

Entre sequências de diálogos e cinemáticas limitadas, cuja direção deixa a desejar devido à utilização de uma planificação mais estática, encontramos uma história de redenção. Enquanto Clem reconstrói a sua vida em busca de vingança, o mundo à sua volta transforma-se e há um crescimento positivo na forma como a caçadora de prémios cria novas relações e amizades. Este crescimento é simbolizado pela quinta que ela herda com a ajuda de Jake e ao iniciar a sua carreira como caçadora de prémios. Ao instalar-se na quinta e ao terminar missões, Clem tem a oportunidade de expandir o seu funcionamento e adicionar novos sistemas a um jogo que precisa urgentemente de motivos para continuarmos a jogar. Então temos a possibilidade de cozinhar, plantar sementes, personalizar o nosso mecha, construir novas armas e ferramentas, até temos acesso a um galinheiro e a um inseto gigante que quase funciona como um animal de estimação. Estes elementos são espaçados com eficácia e introduzidos a um ritmo positivo para sentirmos o crescimento de Clem e o seu sucesso enquanto caçadora de prémios. Há também a tentativa de dar maior profundidade à jogabilidade de Bounty Star e apesar de apreciar a intenção, estes sistemas são muito mais minimalistas e com impacto mais reduzido do que esperava. Não estamos perante um jogo de sobrevivência, com foco num robusto sistema de crafting, mas antes um jogo de ação e aventura que tenta constantemente suplantar as suas próprias expetativas.

Enquanto a campanha se expande por vários capítulos, novas personagens e a introdução de sistemas que expandem o funcionamento da quinta, o grande foco de Bounty Star é o seu combate. Como caçadora de prémios, Clem não procura fazer amizade com bandidos, ladrões ou assassinos. Os capítulos são compostos por um punhado de missões principais e uma variedade (demasiado) limitada de tarefas secundárias que podemos concluir para ganhar mais dinheiro e recursos. Com os prémios, podemos comprar alimentos, sedentes, armas e esquemas que são imprescindíveis ao progresso da campanha. Sem combate, sem bandidos eliminados ou então apreendidos – é possível capturar inimigos e algumas missões recompensam-nos por conseguirmos prender os alvos ainda vivos –, não há progressão em Bounty Star. Isto não é propriamente uma surpresa, já que os mechas são um dos destaques do jogo. Se existissem mechas e eles não tivessem qualquer funcionalidade mecânica, isto seria o equivalente a uma má aplicação da Arma de Chekov.

Os capítulos variam em longevidade, mas as missões são quase sempre curtas, procurando aquele equilíbrio harmonioso entre o “fácil de começar” e o “terminar só mais uma”. Os cenários são maioritariamente desinteressantes, campos áridos, quintas abandonadas, minas desativadas ou até um campo de baseball, mas oferecem algumas oportunidades de exploração se tivermos as habilidades corretas – como a possibilidade de saltarmos, que não se encontra disponível durante as primeiras missões. Os limites são sempre visíveis e não estamos perante arenas extensas, mas encontramos algumas plataformas que podemos navegar e até colecionáveis para encontrarmos. A dimensão dos cenários, a duração curta das missões e o foco quase exclusivo nos confrontos dão origem a objetivos igualmente simples, resumindo-se à eliminação ou captura do líder do gangue em questão ou então ao controlo de hordas.

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Bounty Star (Annapurna Interactive)

Apesar da simplicidade mecânica e do foco em objetivos análogos ao género de ação, até os sub-objetivos não trazem consigo novidades ou desafios excecionais – quase sempre centrados em torno de loadouts específicos que devemos utilizar ou então garantir que não sofremos dano –, Bounty Star não é propriamente fácil. As primeiras missões são muito acessíveis e fazem um bom trabalho ao introduzir as mecânicas principais do sistema de combate e as várias funcionalidades e particularidades do nosso mecha, mas a dificuldade não demora a aumentar. Isto acontece, em parte, devido às exigências da personalização do mecha e das variantes que surgem através do equipamento de certas partes. Podemos comprar ou criar novos acessórios, armas e ferramentas que melhoram a propulsão do mecha, o sistema de cura ou até a sua refrigeração. Não estamos perante um Armored Core em termos de complexidade, mas acredito que a série da From Software foi uma influência para a DINOGOD porque temos um enorme foco na temperatura do mecha. Semelhante a Armored Core 2, o nosso robot aquece sempre que disparamos ou realizamos alguma ação mais arrojada que não seja movimentar-nos e se não tivermos cuidado, a máquina pode sobreaquecer e deixar-nos indefesos. Isto pode levar a situações intensas onde um mecha inimigo pode destruir-nos em poucos ataques, aumentando a frustração enquanto tentamos compreender quais são as variantes do sistema de aquecimento – diferenças essas que nem sempre compreendi a 100% devido, em parte, à presença de alguns bugs.

Bounty Star respeita a viagem emocional da sua protagonista e procura dar-nos uma campanha repleta de altos e baixos, com um elenco secundário divertido que contrasta com a demanda violenta de Clem. O problema é que a direção e os valores de produção condicionam esta história de vingança e amordaçam-na ao longo de vários capítulos repletos de missões repetitivas e com pouco sumo. O combate é funcional e as melhorias são significativas à medida que equipamos o nosso mecha com melhores acessórios e armas, mas a movimentação mantém-se rígida, o sistema de mira não está polido e a draw distance é muito limitadora, ao ponto de estarmos a ver um inimigo em campo que não conseguimos acertar. A falta de profundidade nas mecânicas de crafting e farming também condiciona a qualidade geral da campanha, onde sentimos que estamos sempre próximos de encontrar um ponto de equilíbrio e que esse ponto nos escapa constantemente por milímetros. O potencial é visível e aprecio a determinação da DINOGOD em dar tanto destaque à narrativa, apesar dos seus problemas, mas tal como os inúmeros westerns produzidos entre os 1960 e 1970, não basta aceitar os clichés do género para funcionar. É uma história de vingança sem garra, mas com boas intenções.

Cópia para análise (versão PlayStation 5) cedida pela Annapurna Interactive.

João Canelo
João Canelo
Crítico de videojogos, Guionista, Professor e o responsável pelo melhor mortal nas aulas de Educação Física em 2002. Um aficionado por jogos peculiares.
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