A Massive Entertainment abre as portas de Pandora com uma aposta tecnicamente impressionante e imersiva, que seria incrível se a sua história e progressão fossem mais interessantes.
Correndo o risco de ser gozado pelos meus amigos, admito que gosto dos filmes de Avatar. Sim, as suas histórias não são nada de outro mundo. E é tão fácil tecer comparações do primeiro filme a outras histórias já contadas, como é fácil ficarmos irritados com a aventura redundante e das más decisões dos filhos de Jake Sully no segundo filme. Ainda assim, admiro com alguma paixão o trabalho de direção e da dedicação de James Cameron na criação deste Universo Cinemático e do seu insano world building até ao mais pequeno detalhe, que ganha vida no grande ecrã com um grau de realismo e de valores de produção através de tecnologias de ponta, que poucos se arriscam a tirar partido.
A mitologia e o mundo criado para Avatar, mais especificamente Pandora – o planeta satélite de Polyphemus em Alpha Centauri, onde estas histórias se passam -, é uma personagem por si só. Viva, complexa, misteriosa e rica em mitologias. É, por isso, o plano de fundo perfeito para contar mil e uma histórias, que podem ou não ser relacionadas à trama principal dos filmes. E é perfeito para ser a base de um videojogo. Por essa razão, aliado ao meu interesse neste universo, a minha curiosidade com Avatar: Frontiers of Pandora sempre foi estranhamente alta.
A minha viagem por Pandora foi, também ela, estranha. Cheia de altos e baixos, onde encontrei coisas que gostei bastante da forma com são executadas. Mas infelizmente, na soma das suas partes, os pontos menos positivos foram em maior quantidade, comigo a dizer “adeus” às tribos Na’vi bem mais cedo do que gostaria.
Desenvolvido pelo estúdio da Ubisoft, Massive Entertainment, que nos trouxe a série Tom Clancy’s The Division e que está prestes a ficar no espaço enquanto produz Star Wars Outlaws, Avatar: Frontiers of Pandora causa uma incrível primeira impressão – isto é, depois de uma introdução com cinemáticas narrativas de escrita duvidosa, que nos relembram que o jogo se passa mais ou menos na mesma altura de Avatar: The Way of Water, apesar de ser uma uma aventura standalone.
À semelhança dos mais recentes jogos de Star Wars, onde tudo parece autêntico e criado através de modelos e referências usados nos filmes, também Avatar: Frontiers of Pandora transporta o mesmo nível de detalhe e carinho, que até um não-fã é capaz de absorver. Um resultado conseguido graças à colaboração com a Lightstorm, a produtora fundada por James Cameron.
Toda a estética militar sci-fi grita “Cameron” e é palpável e realista o quanto baste e, tal como nos filmes, desempenha um papel muito interessante na justaposição ao ambiente em que se insere, a natureza selvagem de Pandora, que se apresenta aqui com cenários vivos e com uma densidade geométrica que ainda não assistimos muito nesta geração. E se tudo isto impressiona à pequena escala do seu início, rapidamente nos deixa de queixo caído ao percebermos a escala insana do jogo e do seu mapa, sendo este o primeiro claro indício de que se trata de um jogo da Ubisoft.
Tudo é apresentado com um nível de fidelidade incrível, graças aos avanços do motor da atual geração Snowdrop e à forma como trabalha a iluminação dinâmica, os detalhes geométricos, a vista a grandes distâncias e todos os elementos vivos no ecrã, proporcionando uma experiência gratificantemente imersiva, mesmo quando deambulamos e nos perdemos pelas selvas, céus e planícies de Pandora.
Também de gabar é a sua jogabilidade. A começar pela sensação de escala ao controlarmos um Na’vi com o dobro da altura dos humanos que nos rodeiam, passando pela fantástica mobilidade da nossa personagem que usa a vegetação e rochas como plataformas, ou até pelo seu combate reminiscente de jogos como Far Cry, incluindo a decisão de escolha entre ataque frontal às bases inimigas, ou infiltração através da furtividade. Algo que pode ser a chave para o sucesso quando estas áreas estão rodeadas por mechs com um enorme poder de fogo, que nos vão fazer suar ou obrigar a ganhar experiência.
E é a partir deste loop, de cumprir objetivos para ganhar experiência para continuar o caminho dourado da sua narrativa, que Avatar: Frontiers of Pandora começa a revelar as suas raízes sem vida e mecânicas familiares dos jogos da Ubisoft, quebrando com a sua filosofia de exploração espontânea e voluntária.
Apesar do seu sistema de mapa ser bastante leve em pontos de interesse e apresentar um interessante fog of war, que vai revelando novas geografias à medida do que exploramos, toda a gestão de inventário, idas ao códice e leitura atenta dos objetivos a seguir retiram a Avatar: Frontiers of Pandora toda a sua magia e potencial imersivo. Passando de um simulador de Avatar para um videojogo banal com listas de objetivos a cumprir, muitos deles obrigatórios, para garantir que estamos no nível recomendado para avançar nas missões principais.
Durante a sua história, a apresentação de Avatar: Frontiers of Pandora também se foi revelando genérica e pouco inventiva, sem sequências de ação, ou aquele sentimento cinemático com que associamos a filmes de grande escala. São quase todas interações com NPCs, saturadas de atuações teatrais e textos cheios de gírias Na’vi, que nunca ajudaram a compreender com clareza o quem, como, quando e onde das situações.
A aventura por Pandora começou, assim, a ficar saturada e desinteressante, sem qualquer motivo para avançar realmente na história, a não ser o desbloqueio de novas áreas belíssimas para explorar ou de novas formas de locomoção, como o uso das criaturas aladas Ikran, ou os cavalos gigantes de 6 patas, os Direhorses – cuja tradução é literalmente “cavalo gigante”.
Removendo todas estas componentes excessivas ou executadas de forma extremamente presunçosa, o que é que resta em Avatar: Frontiers of Pandora? Diria que o turismo virtual, pelos seus visuais incríveis, pelo nível de imersão e pelo seu sólido modo de fotografia para se registar aquele por do sol atrás das montanhas flutuantes ou brilho das selvas iluminadas por vegetação bioluminescente.
Avatar: Frontiers of Pandora está longe de ser um mau jogo. Antes pelo contrário, é extremamente sólido e robusto, faltando-lhe apenas alma e convicção em ser algo realmente especial e não um simples, mas caro, produto de tie-in aos filmes. No fundo, uma oportunidade falhada em convencer mais não-fãs a visitarem Pandora.
Cópia para análise (versão PC) cedida pela Ubisoft.