Duas coleções perfeitas para os fãs da Factor 5 e da série Turrican, mas especialmente para os fãs que adoram gastar dinheiro em reedições desnecessárias.
Foram necessários 32 anos, várias edições, reedições e sugestões para finalmente descobrir que não sou fã de Turrican. A série da Factor 5 – um minuto de silêncio para o estúdio que nos trouxe Lair e disse “ok, já chega, isto é estar a abusar da sorte” – esteve sempre presente no meu imaginário, alimentado por primos e amigos mais velhos que utilizavam alguns dos seus títulos como provas para o poder de computadores como o Amiga. Turrican era um daqueles videojogos que vinham sempre acompanhados de “não vais encontrar nada semelhante nas consolas”, um crachá que os mais velhos utilizavam com o orgulho que só um adolescente com um Amiga poderia ter nos anos 90.
Como seria de esperar, Turrican não tardou a chegar às consolas, onde teve o descaramento de se multiplicar por sequelas e spin-offs na Mega Drive e Super Nintendo. A ironia não escapou aos adolescentes e aos seus Amiga, que ainda insistiam que as verdadeiras aventuras estavam no PC. Como não tinha acesso ao maravilhoso e stressante mundo do DOS ou de qualquer outro sistema operativo, nunca pude comprovar o que amigos e inimigos contavam nas ruas de Moscavide. Até agora!
Para me ajudar, a ININ Games teve a amabilidade de recuperar a série Turrican e relançar os vários jogos em duas coletâneas perfeitas para os fãs, com vários extras e até novas versões de alguns dos títulos – dois volumes bastante recheados para aqueles que apreciam a franquia e querem reler os seus manuais com as saudades de quem adora Turrican a este ponto.
No primeiro volume, podem contar com Turrican, Turrican 2, Super Turrican, Super Turrican Director’s Cut e Mega Turrican Score Attack. Já o segundo volume é maioritariamente mais focado nos exclusivos das consolas e conta com Turrican 3, Mega Turrican, Mega Turrican Director’s Cut, Super Turrican 2 e Super Turrican Score Attack. No fundo, são coletâneas bastante completas e penso que não ficaram jogos de fora, mas, se tal tivesse acontecido, presumo que a ININ Games teria lançado não duas, mas sim três coletâneas para se certificar que limpou as carteiras aos três fãs de Turrican ainda existentes no mundo.
A série Turrican é, no entanto, muito mais interessante do que o modelo de lançamento das suas coletâneas e é daquelas franquias que representam muito bem a sua época. O primeiro título, lançado em 1990, é a base para toda a série e uma fórmula muito forte para o que é essencialmente um jogo de ação e aventura. Em Turrican, o nosso cyborg é uma máquina destruidora, munido de um leque de armas devastadoras, que podemos melhorar e trocar ao longo dos níveis. Ele salta, ele dispara, ele até se agacha e utiliza um gancho! As mecânicas não são o grande destaque, na minha opinião, ainda que sejam muito limadas e até equilibradas para a época – ainda que a dificuldade e o posicionamento dos inimigos sejam tão injustos que a magia dos controlos se perca entre a frustração de jogar Turrican -, mas o foco tímido na exploração dos níveis, que quase podem ser navegados livremente e sem uma direção específica, revela o que tanto fascinou os jogadores durante o seu lançamento. Os níveis são extensos, cheios de segredos – como vidas e melhorias para o armamento do nosso cyborg – e uma panóplia esgotante de inimigos para eliminarmos.
A aposta em níveis mais extensos é algo completamente mitigado ao longo da série, com os dois primeiros jogos – claramente influenciados pelo poder e magnitude do Amiga – a apostarem mais em cenários expansivos e mais focados na curiosidade do jogador no que toca à sua exploração. Este foco tornou Turrican em algo mais intrigante, ainda que pouco inovador se tivermos em conta títulos como Commander Keen e até mesmo a duologia Duke Nukem (ou Nukum), mas a jogabilidade é tão rápida, com uma aposta em combates de proximidade – já que a câmara insiste em estar o mais próxima possível –, que é complementada pela tensão de explorar estes mundos extensos. Eu percebo o que levou tantos jogadores a vestirem a t-shirt de fãs, mas não consigo apreciar tanto o ritmo dos combates, o respawn de inimigos e até a repetição de design dos níveis 32 anos depois. Sou vítima do tempo, talvez até do mau gosto, mas não posso colocar de parte os meus sentimentos: Turrican frustra-me.
As coleções têm tudo para ser uma dádiva para os fãs, não fossem elas uma ressuscitação da franquia. Até para os mais curiosos, como eu, as duas coletâneas são uma montra eficaz para a série, com bons ports e uma viagem cronológica que nos deixa apreciar as evoluções tímidas desta série clássica. A fórmula é tão consistente que a Factor 5 não precisou de revolucionar as mecânicas para dar continuidade à franquia, ainda que exista, em especial nas sequelas, um foco no gancho que não apreciei. Mas quem sou eu para falar, nem um Amiga tive enquanto crescia, relegado à vida de pobreza e das consolas, longe de clássicos incontornáveis como Turrican. No entanto, não me considero parvo e sei ver para além do fanatismo. Consigo perceber, por exemplo, que é errado lançar duas coleções desta qualidade por 34.99€ cada, em vez de juntar tudo num só pacote para celebrar os 32 anos da série. Para mim, isto é inconcebível. Fica o aviso: isto é errado.
Cópia para análise (versão PlayStation) cedida pela PR Hound.