A Insomniac Games revitaliza aquela que poderá ser a sua saga mais importante com um jogo seguro, ambicioso e apaixonante.
Apesar de ter seguido a evolução da saga Ratchet and Clank desde a sua origem, no lugar de pendura, através das experiências do meu irmão mais novo que consumiu todas as aventuras principais desta dupla de mascotes da PlayStation, não consigo descartar o meu entusiasmo ao jogar a mais recente entrada desta série, com Ratchet and Clank: Rift Apart (Uma Dimensão à Parte). Este é um sentimento que surge graças ao trabalho dos estúdios que nos trouxeram Sunset Overdrive, um dos jogos que me fez querer adquirir uma Xbox One na altura, e os dois Marvel’s Spider-Man, que re-acordaram aquele inocente sonho, em miúdo, de querer ser um super-herói.
Com uma nova geração, novos recursos, o potencial de criar uma nova aventura com liberdade criativa para contar uma nova história e também com base nas experiências mais recentes da Insomniac Games, a minha antecipação por Ratchet and Clank: Rift Apart estava um pouco acima do moderado. Agora, 26 horas depois de aventuras entre diferentes planetas e dimensões, faltam-me palavras para descrever o quão emocionante, adorável e bombástica foi esta jornada.
A PlayStation volta assim a trazer para as suas consolas uma experiência como só o seu grupo de estúdios é capaz. Uma aventura a solo, com início meio e fim, cheia de conteúdo, com uma história redondinha que, no fim, nos enche a barriga com a mesma satisfação de assistir a um belo blockbuster de verão numa sala de cinema, deixando ainda aquela vontade de a voltar a repetir logo a seguir.
O lado cinemático de Ratchet and Clank: Rift Apart foi a primeira coisa que me saltou à atenção, logo assim que comecei a controlar a dupla, num nível colorido e recheado de fan-service, revisitando replicas de níveis de jogos passados e servido de pequeno tutorial para as mecânicas mais simples. A sensibilidade fílmica e as transições entre o que é jogo e cinemáticas é altamente fluida, sem cortes e com uma qualidade desses momentos mais épicos que refletem bem o trabalho aprendido em Marvel’s Spider-Man, elevando expectativas e emoções para níveis bem altos, algo que o jogo mais recente da série, de 2016, ou o filme lançado em paralelo, pouco arriscaram.
Momentos “à la Uncharted” tornam-se comuns ao longo desta aventura intergaláctica e interdimensional que, além de puxar pelos limites visuais de que os jogos são capazes atualmente, muito graças à sua direção de arte animada, tira também partido das capacidades únicas da PlayStation 5 e do poder extra face à geração anterior.
A premissa de Ratchet and Clank: Rift Apart é simples e surpreendentemente mais linear do que se poderia esperar, levando-nos numa aventura entre dimensões paralelas, com portais e janelas que se abrem instantaneamente para outros mundos. A eliminação virtual de tempos de carregamento do disco da PlayStation 5 é utilizada de forma vantajosa constantemente, sem tempos de espera ou cortes estranhos entre cinemáticas e jogo, e com transformações dos níveis em tempo real.
Durante momentos de história linear viajamos rapidamente entre versões alternativas de um determinado nível e durante o combate podemos tirar partido de portais semelhantes ao jogo Portal, que nos permitem a navegação rápida de um ponto para o outro, aumentando rapidamente a estratégia de jogo ou para descobrir segredos em pequenos “bolsos” interdimensionais, com puzzles ambientais que nos abrigam a usar as habilidades adquiridas para desbloquear, por exemplo, peças de armadura.
Em termos de combate, este é um dos pormenores onde Ratchet and Clank: Rift Apart evolui drasticamente face aos jogos anteriores. Mecanicamente o jogo é bastante familiar, mas a fluidez de combate e das animações de todas as personagens e elementos dinâmicos no ecrã tornam cada encontro um autêntico bailado explosivo, fluido e divertido, aumentado com pequenas habilidades novas de desvio e deslocação e com o incrível arsenal de armas que pode ser trocado rapidamente para combos ou para encontrar aquela arma mais eficaz para um determinado inimigo. Os portais fixos nos níveis, que podem servir de atalhos na sua navegação durante o combate, adicionam uma camada estratégica, onde pudemos “puxar a realidade” e mudar de posição para pontos de vantagem, apanhando hordas de inimigo de surpresa com uma granada, um rocket ou uma armadilha.
Aliado ao frenesim mecânico de Ratchet and Clank: Rift Apart temos os incríveis visuais já mencionados, com partículas e efeitos que explodem no nosso ecrã, mas que também se deixam admirar em momentos mais calmos ou no modo de fotografia.
Com uma qualidade de imagem praticamente perfeita, Ratchet and Clank: Rift Apart é, provavelmente, o jogo com os melhores visuais que já tive a oportunidade de jogar, com um nível de detalhe e consistência que me lembra da primeira vez que joguei The Last of Us Part II, onde é necessário estar com muita atenção ou procurar ativamente por defeitos. E quando digo muita atenção, é ao ponto de se ter que usar o modo fotografia e aproximar a câmara bem perto dos pelos da cara de Ratchet para a ilusão realmente quebrar.
Com ambientes extremamente densos em detalhe, elementos dinâmicos, objetos realistas, cenários futuristas e fantásticos, Ratchet and Clank: Rift Apart aproxima-se facilmente de uma produção CGI de alta qualidade. A qualidade das texturas é extremamente rica e realista, a iluminação ajuda a criar uma atmosfera imersiva e por vezes fotorealista e o uso de Ray-Tracing parece estar um pouco por todo o lado, onde até as centenas de porcas, parafusos e roscas, que explodem pelo ar quando partimos caixas ou derrotamos inimigos, refletem todo o ambiente e personagens individualmente. É simplesmente de loucos e de ficar de queixo caído.
No departamento técnico e no que toca a capacidades da PlayStation 5, temos novamente uma excelente demonstração do DualSense. As capacidades hápticas destacam-se através dos passinhos das nossas personagens por diferentes tipos de terreno e através de impactos com objetos, elementos e explosões que se colocam pelo caminho. Já os gatilhos responsivos oferecem resistência dependendo do tipo de arma escolhida ou com a saída de som do comando, que serve de canal extra à experiência áudio do jogo, com indicadores e efeitos sonoros a saírem dele e a oferecerem uma nova camada de imersão surpreendentemente não disruptiva.
Para esta análise, Ratchet and Clank: Rift Apart foi jogado do início ao fim no modo de Fidelidade gráfica, que oferece a experiência de 4K a 30FPS com todos os efeitos visuais ativos e que é um de três modos que estarão disponíveis no dia de lançamento do jogo. Aliás, os modos adicionais, de Desempenho com Ray-Tracing e de Desempenho em alta resolução, foram desbloqueados mais cedo e já estão disponíveis no momento de escrita desta análise. Apesar de já ter podido experimentar um pouco dos três, pouco posso falar extensamente para além de que o sacrifício para obter os 60FPS com Ray-Tracing não parece ser muito grande, o que é ótimo. Mas seja como for, uma coisa é certa: a 30 ou 60FPS, Ratchet and Clank: Rift Apart mantém-se belo e corre na perfeição na mais recente consola da Sony.
Se tecnicamente Ratchet and Clank: Rift Apart é fantástico, a sua história e as suas personagens apertam o laço neste belo embrulho. Vou evitar falar muito desta parte, porque surpresas ao longo desta aventura não vão faltar, mas aqui Ratchet e Clank não estão sós e vão encontrar-se com uma nova personagem, Rivet, uma Lombax de uma dimensão paralela que passou a vida a lutar contra as forças da sua versão do Dr Nefarious, um grande Imperador na sua dimensão.
Juntando as suas forças, Ratchet and Clank: Rift Apart coloca-nos também na pele de Rivet ao longo de metade do jogo, mas deixando que sejamos nós a controlar, de alguma forma, o tempo de antena entre os dois lados da história com objetivos paralelos, quebrando assim a sensação de linearidade desta aventura.
Com uma personalidade forte e bastante alegre e com uma pitada de mistério e sentimentos reprimidos, Rivet tem o potencial de se tornar numa fan-favorite e numa nova representante do já extenso elenco de personagens femininas da PlayStation. Ao longo do jogo, Ratchet passa facilmente para segundo plano e é uma nova relação entre Rivet e Clank que nasce e onde ambos crescem e aprendem a aceitar-se pelo que são.
Apesar do lado mais infantil e simplista do jogo, ou não fosse ele feito para os mais novos, dá para sentir um elevado nível de maturidade nos temas desenvolvidos ao longo da sua história, com interações adoráveis e algumas reviravoltas potencialmente cliché, mas que fazem o essencial para ensinar bons valores sobre amizade, aceitação e até sobre o combate à solidão.
No fim, depois de muito espetáculo e aventura, é difícil de ficar indiferente aos pequenos momentos ternurentos e cheios de emoções ou de não ficar com saudades destas personagens, razão pela qual corri para um novo jogo mesmo com a primeira experiência nos 99%.
Numa nota adicional, sobre algo que não costumo dar muita atenção, é que a dobragem em Português de Portugal de Ratchet and Clank: Rift Apart é bastante melhor do que a maioria das apostas da PlayStation no nosso território. Não só as vozes transpiram charme e refletem bem a personalidade das personagens, mas nos diálogos e no à-vontade com que o texto é trabalhado nota-se uma liberdade surpreendente, algo que encaixa na perfeição no tom leve, animado e descontraído desta aventura.
Ratchet and Clank: Rift Apart conta também com diferentes níveis de acessibilidade para jogadores com problemas de visão, auditivos ou mecânicos que, tal como outros jogos modernos, ajudam também a moldar a jogabilidade e a experiência de jogo. Há modos de disparo mais fáceis, fixações de alvo, modos de câmara lenta, ajudas de controlo em sequências de voo, opções visuais de alto contraste e cor, entre muitos outros.
E adicionalmente, para os fãs de modos de fotografia, Ratchet and Clank: Rift Apart oferece aquele que poderá ser o melhor modo de fotografia até à data. Tecnicamente é o mesmo modo encontrado em Marvel’s Spider-Man: Miles Morales, mas que, graças aos pequenos avanços no motor de jogo e à direção artística, pode ser um autêntico poço de horas para os mais criativos.
Ratchet and Clank: Rift Apart era o jogo que não sabia que precisava neste momento, sendo altamente emocionante e apaixonante até para quem não é fã da saga. Um jogo perfeito para explorar as capacidades da PlayStation 5, que volta a estabelecer a plataforma da Sony como um dos melhores lugares para ter experiências e aventuras cinemáticas, grandiosas e satisfatórias. E é, por extensão, também mais um home-run para a Insomniac Games, que eleva aqui as suas ambições com um culminar de anos de experiências nesta e noutras séries. Ratchet and Clank: Rift Apart é, sem dúvida alguma, um jogo a não perder.
Disponível para: PlayStation 5
Jogado na PlayStation 5
Cópia para análise cedida pela PlayStation Portugal.