Nobody Saves the World – Tudo e todos ao mesmo tempo

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A Drinkbox Studios volta a acertar em cheio com um jogo divertido, repleto de humor e profundidade que promete ocupar-vos durante horas sem fim.

É hábito confundirmos inovação com genialidade. Parece que é algo inerente ao ser humano, como se fizesse parte de nós procurar sempre o que é novo e atual, e não o que é mais correto para uma determinada situação. O mesmo pode ser aplicado aos videojogos, onde temos constantemente uma busca pela inovação, pela novidade e o incomum em prol da experiência mais tradicional e segura, como se esta última opção fosse uma derrota.

No entanto, o contrário acaba por prevalecer mais vezes. A novidade é substituída pelo domínio das mecânicas, do design e do género, onde o foco não está na inovação ou na surpresa, mas sim na qualidade da experiência e no que um estúdio (ou criador) é capaz de criar com um conjunto de regras bem estabelecidas. Nobody Saves the World é um desses casos.

Depois de surpreender com Guacamelee e Severed, a Drinkbox Studios continua a sua demanda pelos mais variados géneros de videojogos, desta vez focando-se nos RPG de ação, nas masmorras e em cenários top-down para criar um dos títulos mais divertidos deste início de ano. Fora a arte caraterística da produtora canadiana, seria difícil reconhecer Nobody Saves the World se o colocássemos ao lado de títulos semelhantes. Não há nada de inovador na forma como utiliza a perspetiva top-down, não existe um cuidado surpreendente na sua construção de níveis ou no design do seu mundo – apostando em masmorras aleatórias, onde atualmente é costume encontrarmos mecânicas roguelite em qualquer jogo deste género – e muito menos destacamos sistemas incomuns no combate e na forma como evoluímos a nossa personagem. Se separarmos os seus elementos, Nobody Saves the World é, ao olhar da lupa, um RPG de ação no meio de tantos outros, mas, defendo – e arrisco-me numa enorme contradição – que é exatamente isso que o torna incrível.

Nobody Saves the World é divertido, honesto e muito mais profundo do que poderia imaginar. Esta profundidade nasce de um controlo absoluto do género e das mecânicas principais que compõem a sua experiência RPG, ao ponto de reconhecer as inspirações e os sistemas que ajudaram a criar este monstro agrafado. O combate não é o elemento mais fascinante, nem tão pouco são as suas masmorras aleatórias – repletas das tradicionais armadilhas e dos inevitáveis grupos de criaturas -, mas a progressão de Nobody Saves the World é um perigo para os fãs do género. No seu cerne temos a nossa personagem principal, um ser esbranquiçado, sem quaisquer caraterísticas que o destaquem, cujo poder de ataque resume-se a chapadas tímidas que pouco ou nada fazem aos seus adversário. No entanto, esta personagem aborrecida tem na sua posse uma varinha mágica e a habilidade de se transformar num leque impressionante de heróis. Sejam soldados, arqueiros, cavalos, tartarugas e até um ovo, as ramificações desta habilidade são tremendas e criam um loop interessante entre exploração, combate e personalização.

Claro que temos a tradicional evolução por níveis, que se divide entre o nosso protagonista e os seus alter-egos, tal como a melhoria de habilidades e poderes únicos, mas a possibilidade de desbloquearmos novas classes e heróis através da utilização dos anteriores leva-nos a repetir fases e a apostar progressivamente nos desafios adicionais que o jogo nos dá. Isto porque só acedemos a novas personagens se melhorarmos o ranking dos heróis e isso só acontece se terminarmos as missões secundárias únicas a cada uma delas. O ciclo é tão simples, tão lógico e intuitivo que partimos rapidamente para o combate para terminarmos todos os desafios que o jogo atira na nossa direção – isto sem falar nas habilidades secretas de cada personagem, que dão a Nobody Saves the World uma camada de metroidvania ao permitirem que exploremos novas zonas à medida que desbloqueamos novos heróis.

A dicotomia entre desbloqueio de personagens e a sucessão rápida de missões cria um cocktail explosivo. É tão simples, mas tão perfeito. São as duas melhores motivações possíveis para um jogo como Nobody Saves the World, cuja filosofia vive desta necessidade de trocarmos constantemente entre personagens – seja para conhecermos novas formas de combate, já que todos apresentam habilidades distintas, ou porque existem três tipos de ataques que temos de utilizar para atacarmos os pontos fracos de certos inimigos. Podemos aliar esta experiência ao facto dos poderes especiais adicionarem constantemente novas camadas aos combates ao permitirem que causemos danos elementais e debuffs, táticas que se tornam ainda mais imprescindíveis se estivermos a jogar cooperativamente.

O facto do mundo ser tão animado e povoado por personagens peculiares só ajuda a criar uma aura de surpresa em Nobody Saves the World. Há sempre algo para descobrirmos, uma nova personagem, diálogo, item, poção ou bizarria neste mundo de magos e monstros. A narrativa é completamente previsível, mas o humor carrega os clichés nas suas costas e dá-lhes um novo contexto que ajuda-nos a seguir em frente. É uma desconstrução muito inocente do género de fantasia e agradeço a tentativa, que não é, como seria de esperar, sempre a mais eficaz, mas sinto que é mais um efeito negativo do seu foco em masmorras aleatórias e combates rápidos do que propriamente um problema único à narrativa. Como está, é agradável, a arte é sólida e as animações podiam ser menos robóticas, mas é um mundo interessante de explorar com muitos segredos e personagens para combinar.

Nobody Saves the World é absolutamente viciante e se perderam a sua estreia no PC e consolas Xbox, não o deixem escapar agora. A Drinkbox Studios está de parabéns por trazer-nos um dos melhores jogos independentes deste início de ano e que é capaz comprovar que o sucesso não está na inovação, mas sim na forma como utilizamos os sistemas do nosso videojogo. No fundo, comprova que a diversão continua a ser o objetivo principal desta indústria interativa, mesmo que seja um conceito tão subjetivo e moldável como é.

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Cópia para análise (versão PlayStation 5) cedida pela Popagenda PR.

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