O maior Halo de sempre é também o mais seguro, com maior foco nas suas personagens e não tanto em aventuras épicas e grandiosas como os seus antecessores.
Há um desafio em abraçar novas entradas de sagas pelas quais temos imenso carinho. Independentemente dos seus pontos fortes e fracos, é fácil cair em dois campos: no de fã cego que adora tudo, ou no de fã (mesmo casual) com imensas expectativas pessoais e subjetivas que vai criticar todas as decisões tomadas. Tentar moderar a opinião é possível, claro, mas ao encontrar um meio-termo, entre o lógico e o emocional, ao terminar o jogo, não consegui afastar a uma sensação imediata de vazio e que me fez levantar questões dúbias como: “será que gostei disto?”
Não vos quero meter medo com esta introdução. Posso já revelar que considero Halo Infinite um excelente jogo. No entanto, a dúvida pessoal pairou na minha cabeça durante mais tempo do que seria ideal, impedindo-me de atingir aquele sentimento fantástico de finalidade que outros jogos já me despoletaram e que esperava voltar aqui a ter. Feitas as contas, adorei o que Halo Infinite trouxe para cima da mesa, mas, mesmo com todas as suas “ambições”, eu queria ainda mais.
Halo Infinite é claramente um soft-reboot da franquia, onde comparações à mudança da saga God of War e ao seu novo formato – ou de forma muito superficial à expansividade e lado de sandbox de The Legend of Zelda: Breath of the Wild –, são impossíveis de ignorar. É um sonho concretizado para os fãs da trilogia original e do primeiro jogo em particular, ao mesmo tempo que se marca como um início de uma nova, emocionante e misteriosa aventura para todo os jogadores, possivelmente até para aqueles que nunca tocaram num único jogo da franquia, ainda que sinta que há muita mitologia espalhada ao longo do jogo, algo que poderá confundir ou passar ao lado dos estreantes.
No entanto, não serei a melhor pessoa para confirmar o quão bom será Halo Infinite para novos jogadores (poderão encontrar esse ângulo através dos nossos colegas da Future Behind), porque entrei em Halo Infinite atento a referências ou menções de elementos passados e com uma bagagem cheia de questões e dúvidas em relação ao seu ponto de partida. O jogo começa algum tempo depois dos eventos de Halo 5: Guardians, com a Cortana desaparecida e Master Chief perdido no espaço. Como e porquê é algo que iremos descobrir ao longo do fio condutor narrativo que, para bem ou para o mal, pouco parece interessar em reconhecer a entrada mais recente produzida pela 343 Industries.
Para mim, é difícil fazer uma boa sinopse do que acontece ao longo das mais de 20 horas de campanha (dependendo do que exploram de Zeta Halo e da dificuldade escolhida), uma vez que a história assume uma estrutura ligeiramente diferente dos anteriores. Arrisco-me a dizer que Infinite é mais sobre Master Chief, na sua versão mais humana até à data – que aqui surge com dúvidas e algumas questões sobre a sua missão –, do que sobre o combate contra as forças de Escharum, um dos líderes dos Banished, pelo controlo de Zeta Halo.
Ao longo da nossa jornada vamos conhecendo detalhes e justificações para a situação em que nos encontramos: presos e encalhados em Zeta Halo, juntamente com membros da UNSC espalhados pelo anel e raptados pelas forças de Escharum. Vamos também descobrindo mais detalhes sobre o lado humano de Master Chief e da sua antiga relação com Cortana, e vamos ainda aprender as motivações trágicas de Escharum que o tornam um inimigo à altura das habilidades da Lenda de Guerra que é Master Chief.
Apesar de sermos Master Chief, o jogador é colocado quase na perspetiva da adorável e estranhamente familiar Weapon, a nova companheira holográfica do nosso herói, ignorante à maioria dos eventos passados. E assim é Halo – questões, mistérios e novas ameaças que são apresentadas e raramente esclarecidas porque, lá está, este é o início. Aparentemente o primeiro episódio de uma saga “Infinita”.
São escolhas e uma forma de contar a história que serve o propósito do jogo, reminiscente da Mystery Box de J.J. Abrams, que influenciou toda uma geração de conteúdos de ficção científica após o sucesso de LOST. Neste conceito, um mistério é desdobrado incontrolavelmente em novas ameaças e questões que nos deixam tão envolvidos, como a questionar se o final “será satisfatório?” Este é um problema, pois criam-se expetativas altíssimas. Se tivermos em conta os problemas de Halo 5: Guardians, a bagagem e as novidades para o universo desta nova aventura de Master Chief são ainda maiores e nem sempre com as respostas que tanto queríamos.
Acrescentando a isto, como fã casual, Halo Infinite expande a sua mitologia e dá presença aos Banished, uma nova fação de inimigos renegados dos antigos Covenant, apresentada na saga Halo Wars, mas sente-se a falta ou reconhecimento de personagens e eventos importantes para o legado da saga. Elementos que existem de alguma forma e que são referidos (alguns), mas apenas de forma indireta através de dezenas de logs áudio que, honestamente, são uma delícia de se ouvir. Bem escritos e produzidos, encaixam na perfeição no tom de sobrevivência que Halo Infinite quer apresentar.
Saindo um pouco da construção narrativa de Halo Infinite, uma forma muito rápida de descrever a experiência de o jogar é recordar os dois primeiros níveis de Halo: Combat Evolved – “Pillar of Autumn” e Arriving on Halo” –, e fazer o exercício de imaginar estes dois níveis como um jogo inteiro. E não há outra forma de dizer isto: Halo Infinite é um open-world, mais aberto do que, por exemplo, Halo 3: ODST. Zeta Halo apresenta-se através de uma porção fragmentada em “ilhas” que vão ficando acessíveis à medida que desbloqueamos novas missões da história. Existe, portanto, alguma estrutura neste mundo aberto.
É um belo mundo, verdejante e rochoso, onde estruturas metálicas e pilares hexagonais revelam a natureza sintética daquela estrutura que alberga fauna e flora. Montes, vales, lagos, ruínas misteriosas e complexos tecnológicos recheiam o mundo de objetivos e pontos e interesse, assim como os acampamentos dos Banished com soldados para salvar, mas sem nunca parecerem sobrelotar o mapa com atividades redundantes ou aborrecidas como é tendência no género.
Já todos vimos as previews e os trailers lançados pela 343 Industries que revelam na perfeição aquilo que nos espera no que toca a mundo aberto, mas, mais uma vez, as expetativas traíram-me, mesmo sabendo na perfeição aquilo que me aguardava. Completei Zeta Halo em 20 e poucas horas e estou pronto para o fazer de novo, pois explorá-lo e confrontar alguns inimigos que nos dão acesso a armas melhores é uma delícia e, se o fizermos com calma antes de avançarmos na história, podem ser uma mais valia. Contudo, não consigo afastar o sentimento de que Halo Inifinite podia ser mais variado. Variado na vida no anel (mais vida selvagem) como em biomas, pois Zeta apresenta-se praticamente através do mesmo ambiente verdejante.
Olhando para o legado da série, com níveis únicos em diferentes ambientes, desde naves altamente alienígenas, a desertos com tanques e Scarabs, zonas urbanas, ruínas ancestrais e muitos outros locais, Halo Infinite pode ser o maior, mas é o jogo menos variado da saga. Algo que se explica bastante bem pela sua natureza, pela falta de linearidade e pelo foco muito específico jornada nas personagens e nos momentos que atravessam, colocando de parte o aspeto “space opera” galáctico.
Esta direção tem também impacto na variedade de inimigos e na sua apresentação. Se, por um lado, temos uma espécie de “best-of” com membros da antiga Covenant, aqui representados com traços de toda a saga – com destaque para os Grunts e Jackals de Halo CE a Halo 5: Guardians, passado pela estética de Halo Reach –, o jogo deixa-se absorver pelo registo visual dos Banished, com uma apresentação mais industrial e genérica do que estranha e exótica. Um bom exemplo disso é olhar para as naves Phantom, que se assemelham mais a blocos metálicos do que a veículos orgânicos e vibrantes do passado.
Felizmente, a direção visual acerta na mouche, como é o exemplo da nova armadura de Master Chief ou o ambiente com as estruturas Forerunner e os seus espaços interiores, vastos e atmosféricos que, apesar de vazios, estão ricos graças à sua beleza e ao acompanhamento sonoro de uma única nota musical. Esta camada musical ecoa na perfeição o sentimento de explorar Halo CE pela primeira vez, o que é um enorme elogio a Infinite.
Halo Infinite é um colosso técnico e audiovisual. O facto de ser um jogo cross-gen e não tirar partido de “ray tracings” não impede esta aposta da 343 Industries de se colocar no panteão de jogos mais bonitos do momento, com um nível de polimento e de valores de produção que várias vezes me lembraram do padrão de qualidade esperado pelos exclusivos da PlayStation. E digo-o da forma mais positiva possível para ambas as casas.
Apesar de pouco variado, Zeta Halo é deslumbrante e tem os seus momentos quando o sol se esconde ao longe por detrás do outro lado do anel, ou quando nasce no horizonte, deixando o ambiente dourado revelar nevoeiro nas zonas baixas. As estruturas metálicas dos Forerunner são ricas em detalhe e belas pela sua presença intimidante e grandiosa. Os modelos das personagens são também altamente detalhados e acompanhados por animações variadas e naturais, aumentadas pela excelente inteligência artificial do jogo. E, por fim, temos a excelente sonoplastia, com destaque para os incríveis sons das armas e os hilariantes gritos desesperantes dos pobres Grunts. A fenomenal banda sonora, a cargo de uma equipa liderada por Gareth Coker (da saga Ori), apresenta-se autêntica, crua, familiar e épica, com os melhores temas da saga original e algumas melodias reminiscentes dos sintetizadores de Halo 4 ou do tom hollywoodesco de Halo 5: Guardians.
Tudo isto adiciona uma camada de diversão e satisfação extra à excelente jogabilidade de Halo Infinite, que já tivemos oportunidade de experimentar no multijogador. Na campanha, não é muito diferente, o que muda são as oportunidades que temos para trocar de armas e os tipos de habilidades, assim como as usar dentro do combate e na exploração.
À medida que vamos desbloqueando as habilidades, aqui reduzidas apenas a quatro – Grappleshot, Threat Sensor, Drop Wall e Thruster, sem contar com passivo Shield Core –, estas vão estando sempre presentes e ao nosso alcance com apenas um período de espera para reativação, que pode ser diminuído através de upgrades com Spartan Cores, espalhados pelo mundo do jogo. A sua utilização depende do estilo de jogo de cada um e da forma como os usarem durante os confrontos. Por exemplo, só usei ativamente a Drop Wall durante algumas batalhas de boss, a Threat Sensor numa batalha e a Thruster, honestamente, foi completamente descartada. Porquê? Porque a Grappleshot é das melhores coisas que aconteceram neste jogo.
Se, por um lado, Halo Infinite é o jogo da saga com a melhor jogabilidade e a mais aberta a fantásticas oportunidades de jogo, onde a rapidez de pensamento, destreza e pontaria podem resultar em situações altamente satisfatórias e badass, a forma como podemos trocar de habilidades, que propõem combos espetaculares, é, infelizmente (na minha opinião), pouco intuitiva. Esta troca requer uma memória muscular e um acesso estranho ao d-pad à distância de dois cliques. Não é propriamente o meu aspeto favorito, mas funciona à sua maneira.
O Grappleshot não foi o mais utilizado apenas por preferência, mas também por ser ele que permite a melhor exploração do mapa e dos níveis, acedendo a zonas secretas e aos pontos mais altos que são impossíveis de alcançar de outra forma: sem recurso a veículos voadores, claro. Durante o combate, pegar em itens para atirar aos inimigos, roubar armas à distância quando ficamos sem munições, saltar em direção a inimigos e muito mais, é uma delícia que não encontrava desde Titanfall 2 e que nos permite viver essa fantasia de ser O Master Chief como a lenda reza. É simplesmente excelente.
No fim do dia, quando mais penso em Halo Infinite, mais gosto dele e mais vontade tenho de voltar a revisitá-lo. Muito na linha do que acontece com jogos anteriores, em que pego no comando e quando dou por mim já passei metade de uma campanha. Sim, tenho as minhas queixas pessoais e as expectativas de um fã, que vê a série de uma determinada maneira, que me impedem de ficar em êxtase ou a sentir que tive a experiência mais revolucionária da saga. No entanto, não tenham receio: Halo Infinite é um jogo bem seguro do que quer fazer. Seguro naquilo que quis contar e seguramente uma fantástica ode à saga que precisava urgentemente de evoluir de alguma maneira. E a 343 Industries conseguiu.
Resta saber agora o que o futuro da saga nos reserva, seja com DLCs, expansões ou futuros jogos, pois este é apenas o início de algo muito especial, quase caso para dizer: “Para o Infinito e mais além”.
Cópia para análise (versão Xbox Series X) cedida pela Xbox Portugal.