Twinless – Review: James Sweeney e Dylan O’Brien transformam a dor em arte

- Publicidade -
- Publicidade -

Twinless é uma obra que não tem medo de mergulhar nas zonas mais ambíguas do sofrimento, transformando a dor em cinema impactante e inspirador.

Não era familiar com o trabalho de James Sweeney (Straight Up), mas há sempre algo de fascinante quando um cineasta decide acumular tantas funções num mesmo projeto: escrever, realizar, produzir e, ainda por cima, interpretar uma das personagens principais. Esse risco de exposição total desperta imensa curiosidade, sobretudo quando o elenco conta também com Dylan O’Brien (Maze Runner) e Aisling Franciosi (The Nightingale). Que mais poderia pedir?

Em Twinless, Sweeney dá vida a Dennis, um jovem que, tal como Roman (O’Brien), perdeu o seu irmão gémeo. Os dois conhecem-se num grupo de apoio para gémeos em luto e rapidamente constroem uma amizade peculiar, marcada tanto por momentos de ternura como por dinâmicas de substituição que vão crescendo à medida que a narrativa avança. Marcie (Franciosi), a rececionista sempre doce e disponível, entra como elemento externo à bolha de dor partilhada pelos protagonistas, trazendo um contraponto de normalidade e esperança, mesmo sem possuir um arco tão desenvolvido como os restantes.

O primeiro destaque de Twinless vai naturalmente para O’Brien. É surpreendente como continua a ser um ator tão subvalorizado em Hollywood – quase chocante como ainda não lidera uma grande franquia – quando demonstra aqui uma versatilidade impressionante. As suas linhas cómicas até fazem lembrar Liam Neeson no recente The Naked Gun, aquela comédia slapstick em que a personagem interpreta erradamente situações óbvias, arrancando risos genuínos pelo absurdo da cena. No entanto, O’Brien vai muito além do humor básico: é capaz de sustentar monólogos de profunda carga emocional, nos quais transmite a dor incomparável de perder um irmão, questionando a sua identidade e expondo fragilidades íntimas. Essa capacidade de alternar entre riso e melancolia torna a sua prestação memorável, a par do melhor trabalho da sua carreira.

Franciosi, mesmo com uma personagem mais secundária, encontra o tom certo em Twinless. Marcie é uma mulher simples de bom coração, que anseia por alguém a quem dar amor e cuidado. Pode parecer um papel banal, mas Franciosi injeta-lhe humanidade e autenticidade, funcionando como uma âncora emocional numa obra em que tudo o resto é instabilidade e perda. Por seu lado, o próprio Sweeney mostra-se competente como Dennis, encarnando a timidez e a insegurança de alguém que apenas deseja ser aceite. Não posso revelar muito sobre o arco da personagem sem estragar potenciais surpresas, mas basta dizer que algumas das revelações mais trágicas da narrativa estão ligadas a ele, elevando o impacto dramático da história.

Contudo, por mais sólido que seja o seu trabalho enquanto ator, fiquei ainda mais impressionado com Sweeney atrás das câmaras. A colaboração com o seu diretor de fotografia, Greg Cotten, revela um grande domínio da linguagem cinematográfica. Desde a decisão de prolongar planos sobre os rostos dos intérpretes – permitindo-lhes trabalhar as emoções em tempo real – até às transições visuais criativas, como o uso de ecrãs divididos em composições lado a lado, existe uma frescura e uma ousadia na constituição de cada cena que capturam imediatamente a atenção. Uma sequência em que o ecrã se divide em dois, sobrepondo diferentes momentos num só fluxo visual, é particularmente fascinante. O trabalho de montagem de Nikola Boyanov complementa a imaginação do cineasta, garantindo ritmo mas também folgas necessárias para que as emoções não se percam.

Mas talvez o aspeto mais surpreendente de Twinless seja o equilíbrio entre humor e temas sombrios. Raramente senti dissonância: as piadas e observações cómicas fluem naturalmente, sem quebrar a seriedade das questões abordadas. Twinless consegue falar de luto, solidão, amizade, amor, medo, arrependimento e muito mais com uma delicadeza invulgar, explorando todas estas dimensões através de uma lente genuína. Nunca cai em sentimentalismos fáceis, mas também não se refugia em distanciamentos frios. A vida, aqui, é apresentada como ela é: ridícula num instante, devastadora no seguinte.

É precisamente essa recusa em simplificar a experiência do luto que distingue Twinless de tantas outras histórias centradas na perda. A obra não procura oferecer uma cura milagrosa aos seus protagonistas nem os encaminhar para um final redentor. Pelo contrário, aceita a instabilidade como parte inevitável do processo, permitindo que o público sinta as oscilações entre humor, ternura e tragédia. Roman não lamenta apenas a morte do seu irmão, Rocky, mas tenta recompor uma identidade que perdeu metade do seu reflexo. Dennis não é apenas um companheiro de infortúnio, mas também a materialização do risco de projetar no outro aquilo que já não existe. A relação entre os dois é simultaneamente um gesto de sobrevivência e uma ameaça de autodestruição.

O papel de Marcie reforça essa tensão. Ao surgir como alguém que pertence ao “mundo real”, funciona como uma lembrança de que a vida continua, de que é possível criar vínculos baseados na verdade e na reciprocidade, e não apenas na substituição. No entanto, a sua presença acaba por expor as fragilidades dessa amizade construída sobre a dor, mostrando que a tentativa de replicar uma ligação perdida nunca pode ser totalmente autêntica.

Por fim, a escolha de O’Brien interpretar tanto Roman como Rocky aprofunda ainda mais os temas centrais de Twinless. É impossível não sentir que Roman vive em constante comparação com a ausência do irmão, procurando desesperadamente preencher esse vazio através da relação com Dennis. A dualidade interpretação/ausência espelha na perfeição a sensação de incompletude que atravessa todo o filme, enfatizando a ideia de que o luto raramente é apenas sobre a pessoa perdida, mas também sobre a versão de nós que desaparece com ela.

VEREDITO

Twinless é uma obra que não tem medo de mergulhar nas zonas mais ambíguas do sofrimento, transformando a dor em cinema impactante e inspirador. James Sweeney demonstra uma voz autoral distinta, Dylan O’Brien assina uma das melhores interpretações da sua carreira e o resultado é uma reflexão poderosa sobre identidade, memória e sobrevivência. É um daqueles raros filmes que lembram que o verdadeiro mistério do luto não se encontra em resolvê-lo, mas em aprender a viver com o mesmo. Sussurrando, por vezes gritando, que não é sobre encerramentos, mas sobre descoberta.

- Publicidade -
Manuel São Bento
Manuel São Bentohttps://linktr.ee/msbreviews
Crítico português com uma enorme paixão pelo cinema, televisão e a arte de filmmaking. Uma perspetiva imparcial de alguém que parou de assistir a trailers desde 2017. Individualmente aprovado no Rotten Tomatoes. Membro de associações como OFCS, IFSC, OFTA. Portfolio: https://linktr.ee/msbreviews
- Publicidade -

Deixa uma resposta

Introduz o teu comentário!
Introduz o teu nome

Relacionados