Como sequela, The Outer Worlds 2 tem ideias superficialmente refrescantes, com grandes ambições enquanto RPG, mas fica refém de um formato que já merecia alguma modernização.
Para quem me lê aqui com regularidade, já deve ter percebido como gosto da ideia de remakes, remasters, reboots e sequelas, sejam elas stand-alone ou não. Neste tipo de projetos encontro aquilo que considero como uma oportunidade única de atrair novos jogadores a séries bem conceituadas e a géneros inteiros. Ao longo dos meus anos enquanto jogador, já perdi a conta das vezes que me apaixonei por um género ou por uma série, não pelo contacto direto com os jogos originais, mas precisamente através dos remakes, remasters, reboots e sequelas. Dito isto, The Outer Worlds 2 chegou-me às mãos com esse nível de potencial, o de me tentar, novamente, tornar fã dos jogos da Obsidian Entertainment, que ainda não clicaram comigo, apesar de pertencerem ao género de RPG de aventura e ação na primeira pessoa, de que tanto gosto e admiro.
Na minha mente, a série The Outer Worlds é a concretização daquilo que imagino como um Fallout no espaço, muito mais do que o que o fantástico Starfield nos trouxe. Ao contrário da Bethesda, as séries da Obsidian costumam ser mais focadas, despindo-se de mecânicas obtusas e desnecessárias que por vezes prejudicam a exploração e a fluidez narrativa, como a criação, construção e gestão de bases, postos ou, no caso de Starfield, naves. E isso, para mim, é maravilhoso. Ao mesmo tempo, com a experiência adquirida em Fallout: New Vegas, The Outer Worlds adota um tom e uma direção muito semelhantes a esse influente spin-off, numa paródia exagerada e com humor seco e crítico à sociedade, pintado por uma direção artística bem vincada e uma base mecânica familiar aos fãs do género.
The Outer Worlds 2 encapsula tudo isto numa sequela que serve perfeitamente de porta de entrada para novos jogadores. Passa-se no mesmo mundo do primeiro jogo, mas com um novo conjunto de protagonistas e histórias. É o cenário ideal para construir uma experiência completamente nova sem desvirtuar a essência da série. Mas a questão que fica no ar é até onde é que a Obsidian Entertainment consegue ir para responder a essas expectativas. O jogo leva-nos até um novo sistema solar, Arcadia, sob a jurisdição da Earth Directorate, a entidade a que o jogador pertence e que se apresenta como força dominante da ordem e do progresso na região, agora em conflito com a presença de outras fações e megacorporações. The Outer Worlds 2 constrói assim uma distopia fragmentada e frágil que serve de inspiração ao tom satírico e crítico, semelhante ao do primeiro jogo. Enquanto agentes da Earth Directorate e comandantes a bordo da nave Incognito, os jogadores partem numa jornada de investigação e vingança, constroem uma crew de amigos bastante eclética, tentando ao mesmo tempo travar uma anomalia espacial que ameaça devorar o sistema. Não é uma premissa particularmente original, está recheada de clichés narrativos já conhecidos do género e que até se aproxima bastante de Avowed, outro RPG lançado este ano pela Obsidian.

Talvez seja pelo tom ou pelo setting mais quasi-sci-fi, com uma boa dose de steampunk, mas o primeiro contacto e as primeiras impressões com The Outer Worlds 2 foram ótimas. A apresentação do seu world-building é interessante, com um excelente equilíbrio entre humor e seriedade, tem uma direção artística fantástica suportada pelo Unreal Engine 5 com um nível de polimento surpreendente para jogos deste calibre, e claro, não faltam elementos familiares ao género dos RPGs que rapidamente nos deixam confortáveis, ao mesmo tempo que representam um enorme potencial para levar avante a visão da Obsidian: um jogo envolvente, divertido, cheio de escolhas e preparado para ser jogado de “mil e uma” maneiras diferentes, como um bom RPG pede. No entanto, essa visão confiante começou, ao longo do tempo, a diluir-se com muita coisa que já merecia alguma modernização e que teima em não evoluir, causando frustrações por vezes desnecessárias.
Mas antes disso, “a César o que é de César”, porque há de facto muito para gabar em The Outer Worlds 2, nomeadamente num dos seus aspetos centrais: as conversas e os diálogos. Se em Avowed me queixei de um certo amadorismo ou falta de dedicação nas interações com NPCs, aqui há quase um salto geracional, mantendo ainda assim a essência e o registo do género, com um protagonista mudo frente a frente, quase olhos nos olhos, com os NPCs. O que The Outer Worlds 2 faz tão bem é dar a ilusão de interações mais dinâmicas e envolventes, com personagens sempre bem compostas no enquadramento da câmara, extremamente bem iluminadas e animadas de forma natural e realista. O jogo prima ainda por uma variedade impressionante de NPCs visualmente distintos, com designs e identidades próprias, algo que incentiva à exploração e à investigação de situações e objetivos. Aliado a esta excelente apresentação, temos também os diálogos e as escolhas. A escrita é fantástica, divertida, muitas vezes inesperada, mas quase sempre natural. Somos inundados com opções que alteram a resolução e o sucesso das missões, com efeitos que podem afetar a narrativa de outras, e é raro encontrarmos opções boas ou más, pois há um constante sentimento de ambiguidade moral e ética que enriquece todas as interações.
Essa ideia de escolhas que nunca são completamente boas ou más é aplicada também a um sistema de perks negativas que o jogo vai apresentando. Com base nas nossas ações fora dos diálogos, o tipo de equipamento que levamos, as armas mais usadas, a frequência com que escolhemos os mesmos aliados, com quem mais falamos ou não, se estamos mais ou menos preparados para as batalhas, The Outer Worlds 2 apresenta pop-ups com decisões únicas e permanentes. Lembro-me, por exemplo, de o jogo me chamar “cabeça de vento” por estar a distribuir pontos de habilidade em áreas diferentes, propondo-me então o seguinte: com essa perk podia ganhar pontos mais depressa, mas deixava de conseguir atingir o nível máximo em qualquer uma habilidade. Noutro exemplo, ofereceu-me mais munições, mas em troca todas as armas faziam menos dano. Ou, mais cómico ainda, acusou-me de olhar demasiado para o céu, oferecendo-me melhor pontaria com armas de longo alcance e regeneração de vida progressiva quando exposto ao sol, à custa de um efeito de bloom exagerado durante o resto do jogo, que afetaria, obviamente a nossa visão.
Esta análise às nossas ações é, sem dúvida, das mais interessantes e divertidas de explorar, e algo que gostava de ver refletido noutros elementos do jogo. A forma como a jornada se molda às nossas escolhas é constante, com vários caminhos para a resolução de missões, mas não consigo afastar o sentimento de que já não há nada de particularmente novo aqui. E se a ideia de rejogar The Outer Worlds 2 à procura de caminhos alternativos pode ser apelativa para quem gostar muito do jogo e pretende repeti-lo, é menos clara para quem o jogar apenas uma vez. Ao fim de muitas missões, foram raras as vezes em que me questionei “e se tivesse feito isto de outra maneira?”.
Um desses casos aconteceu logo no primeiro mundo, onde, na última missão, fui confrontado com um aparente bloqueio que exigia três pontos de habilidade em hacking, algo que na altura não tinha. Depois de repetir essa secção, já preparado, um colega que também estava a jogar The Outer Worlds 2, partilhou a mesma frustração, mas avisou-me de que havia outra forma muito menos evidente de concluir a missão. E foi mais ou menos a partir daí, dessa pequena frustração, que a ilusão positiva de The Outer Worlds 2 começou a desmoronar. Quanto mais avançava na história, mais se tornavam evidentes aqueles hábitos que nunca morrem no género. Coisas como inventários, códices, jornais e mapas com uma linguagem visual diegética de leitura difícil, objetivos que nos enviam para zonas longínquas sem preparação ou nível adequado para as ameaças encontradas pelo caminho, uma inteligência artificial de companheiros e inimigos que deixa muito a desejar, ou um feedback de combate pouco sólido aliado a picos de dificuldade que nos fazem pousar o comando rapidamente.
Explorar zonas mais fechadas e específicas até é envolvente, mas os mundos abertos não o são. A fórmula parece a mesma desde Fallout 3. Sinto que já joguei este jogo dezenas de vezes e quase sempre com a mesma sensação de tédio e desorientação assim que o mapa se abre. É uma apreciação pessoal, claro, mas já vi esta estrutura concretizada de forma mais focada e interessante. Por mais bonitos que sejam os mundos de The Outer Worlds 2, o design estrutural dos seus caminhos e pontos de referência, e a constante necessidade de locomoção a pé pelos ambientes, sempre agrestes, prejudicam bastante o ritmo da aventura.
Já os combates também se sentem arcaicos. A jogabilidade é moderna e a mobilidade do personagem é ótima, por vezes até semelhante à de Cyberpunk 2077 – com as habilidades certas, como o duplo salto ou o slow motion, entre outras mais passivas e orientadas para as stats. Para além da perspetiva na primeira pessoa, The Outer Worlds 2 permite ver a personagem na terceira pessoa e até jogar assim, mas a camara é demasiado fixa para ser efetiva ou ajudar de alguma forma nos combates de tiro, mas ideal para usar em combate corpo a corpo com espadas e martelos. O jogo ainda faz um ótimo trabalho com uma variedade de armas interessantes que só começam realmente a surgir mais tarde no jogo. Estas relembram um pouco a filosofia de um Ratchet and Clank, com designs únicos, formas de ação dinâmicas e efeitos visualmente apelativos, no entanto, tirando o sound desing das mesmas, a sensação de feedback e de dano destruidor da maioria não se faz sentir de forma desejada ou satisfatória. Adicionalmente, os picos de dificuldade com inimigos que são autênticas esponjas, tornam muitas destas armas relativamente ineficazes. Por fim, temos os nossos companheiros, sempre um par, com perfis e habilidades únicas de ofensa ou defesa, que só são mesmo úteis para nos reviver, porque durante o combate o seu controlo é mínimo e a sua inteligência artificial não é das melhores.
Missão após missão, The Outer Worlds 2 parece cumprir as suas ambições e a visão do estúdio em oferecer um RPG de ação sólido e confiante, com algumas mecânicas legitimamente interessantes. E admito que há muito para gostar nesta aposta, e admiro sempre produções assim, sejam elas diferentes do que veio antes ou mais tímidas e interativas. Mas perde-me quando a cada coisa boa ou interessante, há duas ou três que parecem agarradas demasiado ao passado do género e impedem a Obsidian de chegar mais alto.
Cópia para análise (versão PC) cedida pela Xbox.