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The Chant apresenta-se com uma enorme dedicação em homenagear filmes de horror, mas está desprovido dos atributos necessários para oferecer uma experiência à altura do seu potencial.

Texto por: André Pereira

Como autor, sempre me ensinaram que devemos começar uma história com um bom engodo. Pode ser uma situação ou uma simples frase – “The man in black fled across the desert and the gunslinger followed” (The Dark Tower), que faça o leitor investir o seu tempo até ao final da obra. Se acabará recompensado, essa será outra história…

Em The Chant, temos o oposto de um engodo ou de uma boa introdução. Temos até três introduções atabalhoadas e todas falham em estabelecer o ambiente do jogo. Os trailers iniciais chamaram-me à atenção com a premissa de um jogo de terror sobre cultos e a minha desconfortável experiência com o catálogo da A24 dizia-me que não ia correr bem para ninguém envolvido. Infelizmente, a linha que separa a excitação da desilusão é ténue e tão rápido se passa de um espetro para outro numa questão de minutos.

Recuperando a minha própria introdução, há lições de narrativa a ter em conta na hora de estabelecer um cenário ou criar um ambiente de falsa segurança neste género de terror. Por decorrer num retiro espiritual, onde a nossa protagonista Jessica se instala para recuperar de um trauma do passado, esperava-se um assentar de alicerces daquela sensação de falsa segurança até tudo descambar. Ao invés disso, fomos apressados para uma ilha e apresentados aos outros indivíduos com clichés atrás de clichés, desde as vestimentas brancas, ao líder com diálogos tolos e ares de Jared Leto. Apesar de tentar suster a credibilidade, senti zero empatia na hora da tragédia ou rancor para torcer pelos seus fins. O fraco desenvolvimento que existe dá-se atrás de documentos ou fitas de vídeos espalhadas pela ilha que nunca ninguém pensou em investigar. Não existe pior cliché no género do terror do que aquela família que compra uma casa, com uma divisão que nunca abre e que ninguém se importa até ser realmente importante… Rapidamente, somos empurrados para um ritual (claro), onde tudo corre mal só porque estamos presentes e a personagem que mais insistiu e defendeu o retiro, é a primeira a ceder e a quebrar. Às tantas, senti que estava a aprender a andar de bicicleta e que me empurraram sem as rodinhas ribanceira abaixo. Enfim, se demasiada exposição é má, pouca exposição é ainda pior.

Zero investido nos acontecimentos e no elenco, restou-me desfrutar da jogabilidade. Terá de haver um arco de redenção, certo? Mais ou menos. Este jogo não é um walking simulator nem uma experiência interativa, mas um survival horror puro que se afasta do combate tradicional com armas de fogo ou brancas para optar por algo diferente. Aqui recolhemos ervas, sais, óleos e cristais para criar e gerir mezinhas que podemos arremessar ou combinar em molhos de caruma para açoitar as avantesmas saídas de Stranger Things ou de  The Day of the Triffids, com aquele toque Lovecraftiano. Já os cristais permitem-nos aceder a um leque de outros poderes psíquicos. E porque estes recursos são escassos, a melhor defesa será sempre a fuga e aqui consegui apreciar os movimentos trapalhões e reais da nossa personagem que tropeça enquanto se esquiva. Eu não faria melhor numa situação semelhante!

Tendo saído de um Eternal Darkness que brincava com a sanidade, também este emprega mecânicas semelhantes através de uma gestão de Saúde Mental, Física e Psíquica. Ao passo que podíamos consumir outras ervas ou cristais para recuperar a saúde, também podíamos consumir a energia psíquica para recarregar a saúde mental. Uma má gestão de um destes atributos impedia-nos de atacar ou debilitava-nos. Em suma, ideias originais q.b. que sinto que poderiam ser mais bem implementadas noutro género de jogo ou se o ambiente fosse mais imersivo.

Vejo-me naquela situação de não querer malhar tanto num jogo de estreia de um estúdio independente, até porque não conhecemos orçamentos nem competências, mas notava-se a dedicação e as influências de outros filmes, especialmente nos cenários e nas paletas de cores naqueles momentos mais psicadélicos que me fizeram lembrar um Mandy ou Color Out of Space. Aliás, foi mesmo isto que me atraiu até ao jogo tal como alguém é atraído para um retiro espiritual em busca de uma recuperação qualquer. Infelizmente, caí no cliché de as coisas não serem bem o que aparentavam. Apesar de não ter gostado da narrativa e do elenco, reconheço as boas ideias da jogabilidade e as influências; apreciei a estética e até o trabalho sonoro envolvente.

Não vou nem quero dizer para evitarem The Chant, mas esperem até ao próximo Halloween quando já estiver em promoção ou com algumas melhorias. Continuo curioso com o futuro deste estúdio porque o caminho será sempre para melhorar.

Cópia para análise (PlayStation 5) cedida pela Ecoplay.

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