The Amateur revela-se uma desilusão moderada tendo em conta as expetativas legítimas criadas pelo talento envolvido, tanto à frente como atrás das câmaras.
Considero a estreia em longas-metragens do realizador James Hawes, One Life, um dos filmes mais marcantes do ano de lançamento respetivo. Apenas e só pelo cineasta, as expetativas para a sua segunda longa-metragem já seriam elevadas. Sendo The Amateur um thriller de espionagem protagonizado por Rami Malek – cujo melhor papel da carreira foi precisamente em Mr. Robot onde interpreta um personagem com várias semelhanças ao deste filme – eis que os meus níveis de interesse sobem de tal maneira que esta é, pessoalmente, uma das obras mais antecipadas desta primeira metade de 2025.
Baseado no livro homónimo de Robert Littell, The Amateur conta com um argumento de Ken Nolan (Black Hawk Down) e Gary Spinelli (American Made) e segue Charles Heller (Rami Malek), um criptógrafo da CIA que, após perder a mulher num ataque terrorista, decide usar as suas capacidades para levar a cabo a sua própria missão de vingança. Sem treino de campo e num mundo onde todos parecem esconder a sua própria agenda, Heller tenta navegar por uma teia de corrupção, segredos e moralidade ambígua. Esta é a sinopse oficial de uma adaptação que promete uma narrativa mais cerebral, mas acaba por enredar por um caminho bastante mais linear e contido.
Começando por Malek, o ator volta a encarnar um tipo de papel que já parece fazer parte do seu ADN artístico – o introvertido atormentado, socialmente deslocado (se bem que não tanto como na série que o atirou para o estrelato) mas com uma inteligência superior a todos os que o rodeiam. A experiência marcante em Mr. Robot é uma clara referência, não só na postura e olhar inquieto, como também na forma como interage com uma realidade que lhe parece sempre um pouco distorcida. Malek enche o ecrã com um equilíbrio entre fragilidade emocional e uma determinação fria, mesmo quando o guião raramente o desafia de verdade.
A banda sonora de Volker Bertelmann (Conclave) é um dos elementos atmosféricos mais eficazes do filme, contribuindo significativamente para um ritmo consistente, especialmente quando a narrativa entra em ciclos de repetição estrutural. Infelizmente, The Amateur falha precisamente onde deveria brilhar, na ausência de um argumento verdadeiramente envolvente e surpreendente torna a experiência geral… com pouco entusiasmo em fazer algo e simples. Para um thriller que supostamente se transforma num quebra-cabeças moral e até político, tudo acontece com uma previsibilidade quase frustrante. Os desafios vão surgindo, mas raramente se sentem ameaçadores, sendo que o caminho que Heller percorre parece sempre demasiado facilitado. Mesmo com a suspensão de descrença habitual e algumas conveniências narrativas, o problema maior é mesmo a falta de tensão dramática e de verdadeiro choque.
Em termos temáticos, The Amateur toca em tópicos relevantes como luto, justiça pessoal e o colapso moral de instituições – mas apenas à superfície. A dor de Heller é mais apresentada do que explorada, presente em alguns planos próximos e momentos de introspeção, mas nunca desenvolvida com a profundidade necessária para realmente compreender o seu estado psicológico. A busca por vingança raramente é posta em causa, quer pelo protagonista, quer pela narrativa. E quando se chega ao final, a forma como tudo é resolvido transmite uma mensagem desconcertante, como se a violência fosse não só necessária, mas suficiente para apaziguar o sofrimento emocional. Esta abordagem simplista compromete a dimensão emocional do filme, esvaziando-o de impacto reflexivo.
O filme toma várias liberdades narrativas que tornam a experiência mais direta e acessível, mas também menos densa que na obra original. Esta última é muito mais complexa no que toca às motivações das personagens e à teia política em que tudo se desenrola, mas como o conhecimento pessoal sobre a mesma não é propriamente extenso, prefiro evitar grandes comparações – até porque uma adaptação ao grande ecrã deve sempre depender apenas de si própria. Menção final para Laurence Fishburne (The Matrix) e a sua presença absolutamente magnética e carismática. Nunca desilude.
VEREDITO
The Amateur revela-se uma desilusão moderada tendo em conta as expetativas legítimas criadas pelo talento envolvido, tanto à frente como atrás das câmaras. Apesar de contar com uma performance sólida de Rami Malek, a adaptação de James Hawes não consegue escapar a uma narrativa formulaica, pouco ousada e emocionalmente limitada, sendo a sua simplicidade e falta de surpresas os maiores problemas. Existem momentos de sensibilidade, mas o argumento raramente se aventura por terrenos mais complexos ou tematicamente desafiantes, resultando numa experiência que entretém de maneira demasiado simples. Para um thriller de espionagem com ambições mais introspetivas, o seu maior erro foi contentar-se com o superficial.