Por vezes interessante e desafiante, o primeiro título da dupla Jasper Oprel e Indiana-Jonas é pensado apenas para os mais resistentes e para quem gosta de aventuras cooperativas.
Escalar uma montanha é como um enorme puzzle de resiliência em Surmount: A Mountain Climbing Adventure. Esta foi a fórmula que Jasper Oprel e Indiana-Jonas decidiram aplicar nesta adaptação da prática ao mundo dos videojogos, onde as montanhas e os inúmeros perigos foram transformados num puzzle físico que leva os jogadores a lutar contra os elementos e a tentar descobrir o melhor caminho para chegar ao topo. Ao contrário de outros títulos deste género restrito, como Jusant da DON’T NOD, a narrativa não é tão linear ou assente na sobrevivência, assumindo um estilo propositadamente mais descontraído e acessível. Em Surmount, a sobrevivência não é uma preocupação, antes uma consequência leve de um salto mal planeado ou então vítima da falta de força e stamina necessários para chegar ao fim de uma longa escalada. E eu não adorei o meu tempo com Surmount.
O ato de escalar montanhas não é para mim. Se o verbo for aplicado a jogos que utilizam a mecânica de escalar, mas que não se focam inteiramente na experiência de escalar montanhas, considero que é um extra interessante à jogabilidade, injetando profundidade suficiente para acrescentar novas abordagens aos desafios ou então para intercalar sequências de puzzles ou ação com a tensão e perigo de uma subida desafiante; mas quando passamos para o domínio da prática em si, onde escalar é a alma e propósito de um videojogo, seja com uma jogabilidade mais realista ou não, a minha paciência desvanece e não se ergue mais. Gosto da opção, não gosto da obrigatoriedade. Surmount, no entanto, parecia ter tudo para se tornar numa exceção à regra com o seu tom mais humorístico, arte colorida e uma aposta numa vertente social através do seu hub, onde podemos conviver com outras personagens e até aceitar novas missões.
A jogabilidade de Surmount é bastante coesa e acreditem que a minha reação à sua jogabilidade é puramente pessoal. O que está presente funciona muito bem para um videojogo que se propõe a dar aos jogadores mecânicas mais acessíveis e imediatas para escalar montanhas. Na cidade, estamos limitados a um plano 2D, onde navegamos através da rua principal e alguns cenários interiores, interagimos com personagens e pequenos placards que nos permitem aceder às missões adicionais ou então definir o nosso próximo trajeto. Mas quando chegamos à montanha, o leque de mecânicas expande-se, mas sem nunca sobrelotar a jogabilidade ou a paciência dos jogadores. Existe uma certa harmonia mecânica que aprecio, onde é suposto aprendermos imediatamente com o jogo sem existir espaço para erros. Talvez seja uma escolha que reflete a natureza cooperativa de Surmount, já que podemos escalar a montanha com amigos. O caos que nasce da cooperação é o suficiente para dificultar a nossa missão principal e as mecânicas são o ponto de equilíbrio.
Como alpinistas destemidos, nós temos a possibilidade de utilizar os dois braços em separado, um para cada trigger. Se precisarmos o “ZL” ou “ZR” próximos a uma parede, a nossa personagem fica agarrada e só largará a superfície quando deixarmos de pressionar o botão. Com uma mão agarrada, podemos rodar o corpo da personagem e direcioná-la de forma a atingirmos um ponto mais alto. Esta é a base de Surmount: agarrar, rodar e reposicionar até chegarmos ao local que queremos. Depois começamos a descobrir mais táticas dentro desta base aparentemente simples, como a possibilidade de rodarmos completamente a personagem para ganharmos balanço e alcançarmos plataformas superiores; os acenders, onde podemos prender a corda através do arnês; as ferramentas que encontramos ao longo da montanha, como ganchos, escadas temporárias e até casacos que ajudam a proteger-nos do frio.
O desafio não está apenas na mobilidade e no design da montanha, mas também dos elementos que a dupla conseguiu adicionar a cada percurso. A disposição da montanha, as suas zonas de conforto e trechos mais desafiantes são construídos em torno de elementos naturais que adicionam verdadeiros momentos de tensão. Não só temos vários tipos de rochas, que determinam a nossa aderência ou se são escaláveis, mas também plataformas que caem de acordo com a nossa pressão, veias rochosas, túneis de vento e rajadas intensas de vento, gelo, entre outros. Estes elementos impactam de tal forma a escalada que determinam até a dificuldade inerente de um percurso e servem para refletirmos se queremos ou não passar uma tormenta ao longo da viagem.
O ato de escalar está associado, como seria de esperar, a uma barra de stamina. Cada ação consome energia e só recuperamos energia quando chegamos a uma plataforma plana ou ficamos seguros nos ascenders. Quando a energia chega ao fim, a nossa personagem deixa de conseguir agarrar as rochas e cai livremente pelo cenário. Nós podemos estar já no topo e cair até ao início se não tivermos cuidado com os saltos e a resistência da personagem. Podemos, no entanto, comer frutos espalhados pela montanha que aumentam a nossa resistência – pensem em The Legend of Zelda: Breath of the Wild –, mas é importante não esquecer que qualquer ação, até um simples salto, consome esta energia residual. Um estado de derrota surge quando caímos de uma altura demasiado elevada e a barra de stamina parte-se completamente, levando-nos a refazer o nível do início.
Esta é a experiência de Surmount, seja a solo ou com amigos. Temos uma montanha para escalar, às vezes encontramos uma missão associada à escalada, e temos de encontrar o melhor caminho para chegar à próxima fase. Apesar de admirar a harmonia mecânica do jogo, o loop da jogabilidade não foi agradável para mim. Se leram até aqui e gostaram não só da descrição, como apreciam o estilo visual de Surmount, ou então estão à procura de uma nova aventura cooperativa na Nintendo Switch, então não tenham receio em dar o salto. Mas se procuram algo mais variado, com maior foco na componente social ou então numa campanha que aposte numa navegação ainda mais descontraída e até arcade, fica o aviso. A jogabilidade torna-se exasperante se não tiverem paciência, com a personagem a cair facilmente e o jogo a exigir saltos cada vez mais arriscados, com a punição a ser demasiado elevada devido à repetição a cada salto mal realizado. A falta de uma seta de direção quando impulsionamos a personagem, numa tentativa de sabermos se estamos na direção correta, quebrou o ritmo de muitas das escaladas que fiz.
Independentemente da minha experiência com Surmount, sinto que existe uma aposta crescente na escalada enquanto veículo mecânico para o género de aventura e simulação. Depois de Jusant e Surmount, temos títulos mais intensivos, como Insurmountable, ou então narrativos, como o recentemente anunciado Cairn. As montanhas não vão a lado nenhum, nem que seja por se tratarem de alguns dos monumentos visuais mais marcantes dos videojogos – que o diga Journey -, mas sinto que ainda não encontrei um título deste género que me enchesse as medidas.
Cópia para análise (versão Nintendo Switch) cedida pela popagenda PR.