Após uma passagem por Lisboa 24 horas antes, a sala de concertos do Hard Club abriu para receber a dupla de DJs australianos com entusiasmo.
Perto da hora estipulada e face a uma sala bem composta, embora confortável, no meio da neblina e ainda sem os The Avalanches em palco, o concerto na Invicta começou pelo fim. Não porque a primeira música fosse “The End” (original dos The Doors), mas porque a receção veio mais recheada de energia e apreço do que muitas saídas de palco.
Num set que respeitou de forma regrada um misto entre faixas do sensacional álbum mais recente da banda We Will Always Love You – que constou na minha seleção de melhores álbuns de 2020 – e algumas das faixas célebres com mais anos, o set foi bem composto na sua generalidade com passagens sãs e subtis, com muitos expoentes máximos de beleza, com algum méritos para ocasionais (mas eficazes) remisturas, que certamente marcaram a maioria dos presentes.
Com muitos abraços, danças e pulos, ao longo de mais de uma hora, Robbie Chater e Tony Di Blasi conseguiram o que pretendiam: intoxicar a audiência com uma energia infindável que colocou o Hard Club ora a bater palmas ao ritmo da batida, ora aos pulos, ora a entoar as letras de forma sucinta, ou ora os três em simultâneo.
Ao longo do set de músicas preparadas, houve muitos pontos altos, entre os quais durante músicas como “The Divine Chord” que abriu as hostes em grande; “Interstellar Love”, uma das primeiras cuja intro proveio da faixa “God Only Knows” dos The Beach Boys; “Music Makes High”, recheada de grove a meter toda a gente a dançar; e “Take Care in Your Dreaming”, uma das obras primas do último álbum que abrandou um bocado o ritmo, mas teve o efeito desejado graças aos versos desenhados por Denzel Curry, Tricky e Sampha The Great para esta faixa.
Já perto do encore, uma “Wherever You Go” remisturada com “Flight Tonight” voltou a acelerar os ânimos, e “We Go On”, com intro da “Hurting Each Other” dos The Carpenters e outro da “I Want To Break Free” dos Queen, teve um efeito sensacional e foi só ver telemóveis empunhados a gravar um momento célebre para mais tarde recordar. No regresso ao palco para o encore, os The Avalanches passaram mais três grandes faixas para selar um espetáculo que ofereceu mais do que se pedia: “Running Red Light”, “Because I’m Me” e “Since I Left You”, distiguindo-se pela quantidade de pessoas que tocaram e deixaram em apoteose.
Quem veio para ver estou certo que se tenha rendido e saído do Hard Club fã dos The Avalanches; já quem veio para se divertir teve um autêntico banquete musical. A pintura humana cheia de cor que compunha o salão de concertos com vista para a ribeira foi composta por uma espantosa diversidade etária, que deixou bem claro a influência da longevidade da parceria entre Robbie e Tony, cuja primeira produção musical já foi condecorada com as bodas de prata. Nota também para a multi-culturalidade, que teve influência dos imensos estrangeiros que estão de férias de verão pelo Porto.
Entre as 22 e as 23 horas da noite de quarta, exactamente a meio de mais uma semana de trabalho para muitos, o Hard Club sofreu uma metamorfose, transformando-se numa autêntica disco de “sexta à noite”. E o que aconteceu pouco após horário nobre bem que se podia estender pela noite dentro, pois estou certo que a maioria das pessoas presentes estava disposta a sacrificar horas de sono para isso.
Chegando ao fim, entre uma chuva de aplausos, surgia um misto entre vontade para dançar mais uma horita ou duas e satisfação plena pelo ótimo set dos The Avalanches. Robbie e Tony meteram a “Hammond Song” dos The Roches a tocar e, deslocando-se à fila da frente, retribuíram todo o carinho e apreço dos fãs, cumprimentando um a um dos que se foram chegando ao palco.
Esta foi a última prova fulcral que o que aconteceu no Hard Club foi uma simbiose bonita que gerou milhares de sorrisos e emoções bonitas ao longo do espetáculo, sorrisos esses que seguiram viagem para casa, satisfeitos pela decisão de sacrificar as tais horas de sono por um concerto mágico.