Sensible Soccers na Culturgest – Imagem, Palavra e Música para Manoel de Oliveira

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Venham mais destas.

Há encontros felizes. A Culturgest foi feita de encomenda para uma cine-concerto e os Sensible Soccers nasceram para tocá-lo. Conforme diz a folha de sala, “Em 2021, assinalando os 90 anos da estreia de Douro, Faina Fluvial em sala, os Sensible Soccers concretizaram um desejo antigo de criarem uma banda sonora para este filme, a estreia cinematográfica de Manoel de Oliveira em 1931”. Obra muitíssimo influenciada pela estética vanguardista soviética, onde o labor dos trabalhadores da faina do Douro é destacado e o estilo de Dziga Vertov e da sua obra de panteão da sétima arte, O Homem da Câmara de Filmar (o qual já foi alvo de acompanhamento musical por parte do ajuntamento composto por André Simão, Hugo Gomes, Manuel Justo, Jorge Carvalho, Sérgio Freitas, João Coutada e José Carlos.

Em cima desta experiência, foi acrescida a curta-metragem O Pintor e a Cidade, de 1956, onde o genial aguarelista António Cruz surge a ilustrar imagens da Invicta em cenários capturados em bem colorida fita Agfa, oriunda do Leste, da Alemanha Oriental. Cenários que em muitos casos seriam repetíveis de filmar hoje em dia – basta trazer os transportes do museu do carro elétrico e os automóveis das coleções de clássicos. Nasce assim Manoel (curiosamente nos créditos de abertura dos filmes, a onomástica do mítico realizador aparece como Manuel), onde se juntam as duas obras supra mencionadas que têm em comum o realizador e a sua pátria espiritual, a cidade do Porto. Daqui viria também a nascer um disco, que faz de acompanhamento ao cine-concerto mas que naturalmente tem vida própria autónoma e merece auscultação independente.

Para ver isto ao vivo, os mais de 600 confortáveis lugares do grande auditório da Culturgest pareciam cheios, ou quase. Cá fora, na meia laranja, amigos encontram-se em amena cavaqueira num ambiente a fazer lembrar anos anteriores a 2020. Sinal de carinho, de fastio por este tipo de espetáculo e de gosto por assistir a este tipo de espetáculo. O concerto começa uns minutos depois das 21h, quando os Sensible Soccers entram no pequeno fosso de orquestra levemente rebaixado para que não haja obstáculo à visualização das obras cinematográficas.

No intervalo das duas fitas, declarações de mestre Oliveira passam, onde a necessidade da convivência entre imagem, palavra e música como partes de uma convivência de construção de uma obra, mas valendo por si próprias são valorizadas.

Se as imagens são mais dramáticas em Douro, Faina Fluvial, com a dureza da pobreza de quem trabalha de pés descalços para alimentar os filhos que brincam na rua, em O Pintor e a Cidade reina um ambiente mais etéreo, quase de sonho. O pintor sai do atelier e desloca-se de ponto em ponto do Porto, por vezes instalando o cavalete e juntando uma pequena aglomeração à sua volta enquanto cria com uma facilidade assombrada uma nova imagem na tela. Em particular, as cenas de atravessamento pedonal da ponte enquanto António Cruz se desloca para o cais de Gaia para ter uma vista privilegiada para a outra banda e se instala de forma rápida e eficiente para mais uma criação.

Os cerca de 60 minutos passam depressa e, após o fim da última projeção, os membros sobem ao palco e agradecem os aplausos com um sorriso de quem gostou de ter feito esta experiência. Em seguida vão-se embora e o público vai abandonando a sala ordenadamente, sem pedidos de encores ou coisa do género. Esta noite não é para essas coisas, foi bonito assistir àquela simbiose e ter ido naquelas viagens. Cá fora vende-se o disco e metem-se mais uns dedos de conversa em dia. Venham mais destas.

Foto de destaque: Culturgest/Vera Marmelo

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