Dominado por sons particulares, com duas estreias acima da média, fevereiro foi um mês calminho, mas relevante.
Crawlers e The Last Dinner Party saltaram do anonimato para a excelência do rock atual. IDLES continuam a pavimentar caminho para o estatuto de lendas, entregando mais um álbum de qualidade exímia. Kanye West voltou para a boca do mundo por bons motivos e os MGMT encontraram um bom porto, ao fim de tantos anos à deriva. Ainda houve tempo para Hurray For The Riff Raff mostrar que é mais do que uma reflexão do passado e das (G)I-DLE provarem que estão longe do fim do momento de estrela.
Podem conferir todas as situações acima e outras tantas, nesta seleção de música essencial lançada em fevereiro.
Crawlers – The Mess We Seem To Make
Género: Alternative Rock
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O álbum de estreia dos Crawlers é uma exposição artística abstrata de destreza musical e riqueza sónica. Somadas guitarradas rasgadas e intensas, às vozes despreocupadas e melancólicas, é confecionado um sabor de rock alternativo que não é de hoje, mas sabe sempre tão bem revisitá-lo.
Composto por 12 músicas, The Mess We Seem To Make tem nos instrumentais estonteantes a força para captar a nossa atenção de imediato, mas é a voz sensacional de Holly Minto que lhe dá o toque essencial de personalidade e nos faz ficar e investir tempo neste trabalho da banda.
Tudo bem que este é apenas o primeiro álbum da banda, mas a sua composição dotada de segurança, confiança e certeza, dando a entender que quem o produziu sabia muito bem o que estava a fazer, passa a sensação de os Crawlers têm estofo para brilhar em palcos maiores. Posto isto, este é apenas o ponto de partida ideal para a banda britânica, que se posiciona muito bem dentro do género, deixando-me não só com vontade de os ver ao vivo, como de ouvir mais.
Classificação do álbum: ★★★★½
Músicas a ouvir:
> Kiss Me
> Better If I Just Pretend
> Golden Bridge
> Kills Me To Be Kind
> I End Up Alone
Ducks Ltd. – Harm’s Way
Género: Indie Rock
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Saudades de um revival aos sons mais icónicos da era de ouro do Indie Rock – vulgo, 2008-2014? Harm’s Way é a resposta para os vossos males.
Com este novo álbum dos Ducks Ltd., não vão ter nada menos do que um banho de melodias dotadas de uma sonoridade aguerrida, que vos transportará a um passado cada vez mais distante e que vos transmitirá a energia vibrante de um género que pouco ou nenhum espaço tem no panorama atual da indústria musical.
Com arranjos de guitarra brilhantes e agudos a um ritmo estonteante, a sensação é de improviso, semelhante a uma viagem de carro com amigos, sem destino em mente. Ainda que a viagem seja apenas de 28 minutos, nunca falha em providenciar uma experiência sonora intensa e com razão de ser.
As camadas instrumentais não ficam por aqui, dado que as guitarradas só ficam completas e sãs devido à existência das camadas dos sintetizadores, permitindo à banda manter-se fiel ao género, mas sobretudo fiel a si mesma.
Quero também aproveitar para ressalvar que, comparando Harm’s Way com o álbum de estreia, Modern Fiction (2021), este foi um passo seguro e cativante na direção certa.
Caso tenham curiosidade, os Ducks Ltd. vão estar no Musicbox, em Lisboa, no dia 15 de maio.
Classificação do álbum: ★★★★
Músicas a ouvir:
> The Main Thing
> Train Full of Gasoline
> On Our Way To The Rave
Hurray For The Riff Raff – The Past Is Still Alive
Género: Americana
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Depois de um regresso triunfante com Life on Earth (2022), Alynda Segarra lança o seu décimo álbum, The Past Is Still Alive, com vista a capitalizar o sucesso de há dois anos.
Ao contrário do álbum anterior, o conceito é mais vincado, mas menos original, visto que se volta a aproximar daquilo que foi apresentado em álbuns mais antigos, nos quais o género Americana é rei. Uma coisa que Segarra faz diferente (e na minha opinião, melhor) é a forma observante como escreve. Forma essa que captura um determinado conjunto de sentimentos, emoções e estados de espírito, funcionando muito bem com o género e refletindo o estado de uma nação (a sua, portanto).
The Past Is Still Alive nunca seria a minha aposta de onde Segarra iria a seguir (tendo em conta o álbum anterior), o que causa algum sentimento de estranheza, mas não consigo negar a sua qualidade. Este álbum parece uma compilação de carreira da artista de Nova Orleães, mas nem por isso parece um cópia descarada de nada do que foi feito por ela, até hoje.
Classificação do álbum: ★★★★½
Músicas a ouvir:
> Alibi
> Hawkmoon
> Vetiver
> The World Is Dangerous
IDLES – TANGK
Género: Post Punk
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Os IDLES já se podem considerar uma das minhas “bandas de estimação”, tais foram as vezes que já escrevi sobre álbuns deles. Depois de Ultra Mono (2020) e Crawler (2021), cá estou eu novamente, desta vez para vibrar com TANGK.
Este já é o 5.º álbum da banda em apenas oito anos e, se por esta altura já deveriam haver sinais de fadiga, ainda não os foi possível identificar. É verdade que, de álbum para álbum, são visíveis as mudanças na abordagem musical, que se vai refinando. No entanto, alegra-me apontar que não houve qualquer perda de qualidade.
TANGK é, talvez, o álbum menos inquieto da banda, mas é também o mais irreverente, tal é a sua imprevisibilidade e inventividade sonora. Quando desconhecemos a fonte do fator diferenciador dele, é complicado ter certezas, mas quando sabemos quem é o génio por detrás dessa irreverência, parece óbvio. Falo, pois, de Nigel Godrich, o famoso produtor que esteve por detrás de álbuns como OK Computer (1997), Kid A (2000) e Amnesiac (2001) de Radiohead (entre muitos outros). Como estava a dizer, é fácil perceber de onde veio a tal imprevisibilidade e inventividade quando sabemos da colaboração com Godrich, pois a expansividade das sonoridades é típica e os momentos contemplativos parecem ter sempre uma maior dimensão do que tinham em álbuns anteriores. Somos, assim, absorvidos com uma facilidade muito natural.
No fim de contas, TANGK é, de longe, o álbum mais arriscado da banda. No entanto, a banda sabe muito bem o que está a fazer e parece não haver limites para o bom senso criativo. A máquina está a ser bem oleada e, enquanto assim for, vai ser difícil termos com um álbum menos bom dos IDLES. Deixem os britânicos cozinhar!
Classificação do álbum: ★★★★★
Músicas a ouvir:
> IDEA 01
> Gift Horse
> Roy
> Dancer (ft. LCD Soundsystem)
> Grace
> Hall & Oates
Kanye West & Ty Dolla $ign – Vultures 1
Género: Rap/Trap
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Kanye West deve ser o artista mais fácil de descartar ou até odiar (já de há alguns anos para cá), porém continua a ser difícil encontrar lacunas artísticas no seu mau génio. Isto porque é um mau génio cheio de criatividade, com uma visão que não conhece limites.
Os problemas do foro psicológico que tanto o descredibilizam, nomeadamente na hora de cumprir com prazos de lançamento musical anunciados/prometidos, parecem continuar sem afetar a o valor da sua música.
Desta vez, em parceria com Ty Dolla $ign, nasceu Vultures 1, o suposto primeiro álbum de uma trilogia a ser lançada (na íntegra) este ano. Fica também a dúvida se vamos ter a mesma facilidade de acesso às outras duas partes como tivemos a esta.
Sobre o álbum em si, ainda que a mensagem não seja constante ou clara e este não prime pela qualidade de escrita, é inegável que, a nível batidas e melodias, bem como todo o trabalho de produção baseada em sons sónicos, joviais e refrescantes, há poucos a conseguirem igualar o rapper norte americano.
Para a maioria dos críticos que escolhem colocar o valor da pessoa por detrás do artista, acima da música que produz, nunca irão voltar a encontrar valor numa produção de West.
Eu escolho separar a arte do artista e mergulhar na viagem sonora pela mente atribulada de um artista que revolucionou a forma como consumimos música – mais do que uma vez.
Vultures 1 não é, nem de perto, o melhor álbum da já longa carreira de West, mas é o álbum mais consciente e com tino desde Life of Pablo (2016).
Classificação do álbum: ★★★★
Músicas a ouvir:
> STARS
> TALKING
> BACK TO ME
> BURN
> CARNIVAL
Madi Diaz – Weird Faith
Género: Indie Folk/Indie Pop
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Weird Faith é um álbum deveras interessante, que mergulha nas complexidades dos relacionamentos novos, onde é tão comum encontrar experiências de confusão e felicidade misturadas numa amalgama de emoções. Madi Diaz, que mais uma vez mergulha na vulnerabilidade do seu ser para nos trazer o melhor dela, navega por arranjos estruturados de uma forma maravilhosa, garantindo ordem no meio ao caos.
Não conheço extremamente bem os trabalhos anteriores da artista, mas do que ouvi, diria que este álbum representa um salto significativo para a mesma. Desde as melodias sinceras ou a narrativa comovente, a voz de Diaz ressoa com riqueza emocional, sugando-nos para o seu mundo, a cada faixa. Músicas como “God Person” e “Don’t Do Me Good” capturam a essência do amor e da saudade com melodias envolventes e letras poderosas. Em contrapartida, temos “KFM” e “Obsessive Thoughts” que não pecam na honestidade e, ao mesmo tempo, mostram um lado mais dinâmico de Diaz, deixando uma promessa de um potencial ainda por descobrir.
Como referido anteriormente, a capacidade de Diaz de criar músicas honestas e bem escritas é evidente, fazendo de Weird Faith uma adição bem vinda ao universo de música pop underground, e solidificando a posição de Madi Diaz como uma artista empática e talentosa.
Classificação do álbum: ★★★★
Músicas a ouvir:
> Kiss The Wall
> Don’t Do Me Good (ft. Kacey Musgraves)
> For Months Now
> KFM
> Obsessive Thoughts
MGMT – Loss Of Life
Género: Neo-Psychedelia/Psychedelia Pop
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A esperança de um álbum revolucionário como Oracular Spetacular (2007) já pereceu há mais de uma década. Não tanto pela inconstância de MGMT (que é fatual), mas mais por saber que existem produções aliadas a um tempo que não podem ser replicadas, por muito que os artistas tentem. E mais do que a própria banda, temos de ser nós a aceitar isso. Feliz por me ter sentado na fila da frente para a estreia estrelar de MGMT – na hora de comprar o álbum e vê-los ao vivo (pouco depois do lançamento de Congratulations (2010)).
Desde então, os MGMT têm navegado em busca da sua identidade criativa. Falharam mais vezes do que eu gostaria, mas foram acertando aqui e ali. “Ali” com Little Dark Age (2018) e “aqui” com Loss Of Life.
Loss of Life marca outra nova fase na carreira da banda, como se de uma aula moderna de pop psicodélico se tratasse. Este álbum revela também uma banda mais confiante do que nunca, a explorar temas díspares como mortalidade e amor, quase que de uma forma cinematográfica e introspetiva.
Embora não hajam mudanças radicais em relação a álbuns recentes, os MGMT continuam a sua jornada de exploração musical, trazendo-nos letras cativantes e sonoridades novas. Este álbum marca por oferecer uma experiência envolvente e vibrante, que reflete o resultado de um amadurecimento contínuo de uma banda que nunca parou de lutar por se reinventar.
Classificação do álbum: ★★★★
Músicas a ouvir:
> Mother Nature
> Dancing In Babylon (ft. Christine and the Queens)
> Bubblegum Dog
> Nothing To Declare
Mk.gee – Two Star & The Dream Police
Género: Alternative R&B/Bedroom Pop
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Two Star & The Dream Police, a produção mais recente de Mk.gee, é uma jornada hipnotizante por uma paisagem sonora difícil de categorizar, mas bastante cativante. Ao longo de 12 faixas, Mk.gee demonstra uma habilidade notável muito própria para mesclar elementos de dream pop com uma produção experimental e uma escrita sincera.
A cada música que passa, é natural o ato involuntário de comparações com inúmeros artistas dentro do mesmo espectro musical, mostrando o engenho de Mk.gee. Seja nos vocais sintetizados de Frank Ocean, na produção distorcida reminiscente de Bon Iver ou até a sedução etérea de Jai Paul, este álbum pega leva-nos num passeio noturno, na tranquilidade de uma cidade despida pela hora de jantar.
O meu conselho é começarem a ouvir este álbum quando tiverem certezas que têm tempo, paz e vagar para o finalizar, pois este é um produto que exige ser ouvido de uma assentada. Two Star & The Dream Police é um testemunho da mestria de Mk.gee dentro do seu mundo musical, oferecendo uma jornada sem grande estrutura, mas redentora, diferente de tudo o que já ouviram.
Classificação do álbum: ★★★★
Músicas a ouvir:
> How many miles
> Are You Looking Up
> DNM
> Candy
> Alesis
Nadine Shah – Filthy Underneath
Género: Folk Rock
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Filthy Underneath é um exemplo ilustrativo de algo que defendo: Há álbuns que fazem mais ou menos sentido ouvir mediante a altura do dia. Este é um ótimo álbum para ouvir no silêncio da noite e, em contrapartida, péssimo para ouvir em simultâneo com os ruídos típicos das manhãs/tardes. Principalmente pelos sons contidos nele, mas também devido ao estado de espírito de determinada altura do dia.
Mais do que um álbum, Filthy Underneath é uma afirmação de poder artístico e emocional. Visceral e meticulosamente construído, traz-nos uma diversidade sonora admirável.
Com uma produção detalhada e uma narrativa emotiva e honesta, este álbum reflete um período conturbado da vida de Nadine Shah. Nele são explorados temas de luta interior e crescimento pessoal, fruto da perda da sua mãe, o fim do seu casamento e a luta contra o abuso de substâncias.
Para além da escrita muito pessoal, onde se denota uma clara capacidade em transmitir uma ampla gama de emoções de maneira autêntica e cativante, destaque também para a impressionante habilidade de Shah como compositora. Filthy Underneath não é apenas uma coleção de músicas, mas também uma experiência dura e recompensadora.
Classificação do álbum: ★★★★
Músicas a ouvir:
> Topless Mother
> Sad Lads Anonymous
> Greatest Dancer
> See My Girl
> French Exit
The Last Dinner Party – Prelude To Ecstasy
Género: Baroque Pop/Orchestral Rock
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O melhor ficou para o fim, com a estreia mais espetacular de 2024 (até à data de escrita deste artigo). De Londres para o mundo, com Prelude To Ecstasy, as The Last Dinner Party trazem-nos um álbum audaz e exuberante, sem receios ou dúvidas.
Com a faixa de abertura, em tom orquestral, somos remetidos para um mundo encantado, no qual ficamos expectantes sem saber muito bem o que esperar. A verdade é que rapidamente somos surpreendidos por “Burn Alive”, faixa que acende o rastilho para um álbum de explosão teatral melódica.
Há toda uma mistura de influências que vão desde o indie rock até a um pop mais “maximalista”. E é nessa mistura de influências que o álbum mergulha, enquanto são expostas letras indulgentes e composições ricas, proporcionando uma experiência auditiva hedonista (quando ouvido de uma assentada, pelo menos). Já quando o ouvimos repartido, cada faixa tem estofo de mini obra-prima, dando certezas que não existem momentos fracos ao longo das 11 músicas presentes no álbum.
Após ver alguns vídeos de atuações ao vivo, digo com certezas que Prelude to Ecstasy captura a essência vibrante de uma banda com grande presença em palco, que de certo vai ajudar em muito a uma ascensão meteórica. Não sei o que virá a seguir, mas sei que fiquei fã da energia extravagante, da confiança ousada e do talento inegável das The Last Dinner Party, que se estabelecem como uma das bandas mais promissoras do ano.
Classificação do álbum: ★★★★★
Músicas a ouvir:
> Burn Alive
> The Feminine Urge
> Sinner
> My Lady Mercy
> Nothing Matters
Outros álbuns a ouvir:
> Allie X – Girl With No Face
> Britanny Howard – What Now
> Declan McKenna – What Happened To The Beach
> Helado Negro – Phasor
> P1Harmony – Killin’ It
> serpentwithfeet – Grip
> Shygirl – Club Shy [EP]
Extended Play do mês: (G)I-dle – 2
Género: K-Pop
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Engraçado que, quando pouco ou nada esperamos das (G)I-DLE, acabamos surpreendidos – voltou a acontecer. Com este segundo “álbum”, Soyeon e companhia fazem mais uma das suas e acrescentam outra mão cheia de músicas ao seu já rico e diverso repertório. Como “álbum” é difícil encontrar uma linha condutora, mas, a nível de individualidades, dá para todos os gostos e satisfaz bem.
Classificação do álbum: ★★★★
Músicas a ouvir: Super Lady // Vision // Fate // Wife