- Publicidade -

O catálogo da Devolver Digital continua a expandir-se com alguns dos melhores indies no mercado e Gunbrella é mais um exemplo do sucesso para a distribuidora.

O salto entre Gato Roboto e Gunbrella é inacreditável. Se o primeiro era uma desconstrução humorística do género metroidvania, com algumas adições interessantes e uma jogabilidade limada – ainda que um pouco linear em partes -, já o novo título da doinksoft é uma viagem mecanicamente mais desafiante num mundo negro e mais narrativo que nos traz um mundo mais vivido, emocional e humano. Gunbrella é um jogo ambicioso que se move sobre uma mecânica basilar que aperfeiçoa ao ponto de se tornar tão natural que sentiremos a sua falta noutros títulos do género. Quem diria que transformar uma arma num chapéu-de-chuva poderia ter resultados tão positivos, mas a doinksoft não só responde a esta pergunta que nunca ninguém fez da melhor maneira possível, como se destaca no género ao apresentar mecânicas tão limadas.

De facto, a narrativa e o foco num mundo interligado e bastante ativo foi uma surpresa. Pelas imagens e trailers, Gunbrella parecia ser muito mais clássico na sua abordagem, um híbrido entre jogo de plataformas e ação, com níveis fechados e uma progressão linear onde a dificuldade seria o seu destaque. Parte desta descrição aplica-se a Gunbrella, a dificuldade é uma presença constante e assume-se como um híbrido entre dois géneros basilares, mas a doinksoft expandiu a sua escala com uma abordagem mais narrativa através da demanda tradicional de um homem à procura de vingança. A sua família foi morta e o nosso protagonista quer descobrir quem foram os culpados, mas a única prova que tem é a arma que agora utiliza: a gunbrella, uma combinação entre espingarda e chapéu-de-chuva que foi deixada no local do crime. As reviravoltas são inesperadas e a profundidade narrativa dá alma a um jogo que poderia ser clássico em todos os seus parâmetros, mas que aqui ganha garra e consegue injetar maior urgência ao mundo que descortinamos ao longo da campanha.

gunbrella echo boomer 1

O que é igualmente fascinante é a forma como a nossa arma se comporta em ação. A gunbrella é a base para toda a jogabilidade e a doinksoft conseguiu equilibrar as suas mecânicas para que seja imprescindível dentro e fora de combate. Não se trata apenas de uma arma, a gunbrella é uma ferramenta omnipresente e a solução para quase todos os problemas que encontramos ao longo da campanha. Com a possibilidade de ser melhorada, através de recursos que descobrimos ao longo das nossas viagens, este chapéu-de-chuva mortífero multiplica-se nas suas abordagens. Pode ser utilizado enquanto arma, cuja mira de 360º é controlada pelo analógico direito, com vários tipos de tiro e acessórios que podemos comprar ou encontrar à medida que exploramos as zonas de combate. A gunbrella comporta-se inicialmente como uma espingarda, com tiros infinitos, mas lentos e com curto alcance. Desta forma, durante as primeiras horas, somos obrigados a movimentar-nos mais e a controlar melhor a distância entre nós e os nossos inimigos, algo que complementa perfeitamente as outras facetas desta arma.

Como se trata de um chapéu-de-chuva, a gunbrella pode ser aberta para criar um escudo à nossa frente, desviando e refletindo vários tipos de balas. Ficamos mais lentos quando deixamos o chapéu aberto e completamente indefesos nas costas, mas é uma proteção importante para evitar gun turrets e certos projéteis. Aprecio muito a falta de mobilidade com a gunbrella ativa porque obriga-nos a não depender totalmente da sua defesa, antes pelo contrário, o jogo quer que saibamos quando a devemos utilizar para contra-atacar eficazmente. São estas nuances na jogabilidade de Gunbrella que tornam a navegação e o combate tão interessantes.

Por falar na mobilidade da nossa personagem, o chapéu serve também de dash quando utilizado em conjunto com o salto. A personagem pode fazer um dash em seis direções e utilizar partes do cenário – através de ziplines e de wall jumps – para exponenciar ainda mais a sua mobilidade. Se deixarmos o chapéu aberto depois de um dash ou salto, podemos planar por alguns segundos e descer suavemente, uma habilidade imprescindível para evitarmos algumas sequências de plataformas que envolvem cenários repletos de picos e outros perigos ambientais. O combate é enaltecido pela mobilidade e a mobilidade é muito mais exigente e milimétrica devido ao tipo de inimigos que encontramos, o que dá a Gunbrella o seu foco na dificuldade e numa experiência mais clássica no que toca à progressão. Felizmente, Gunbrella não é injusto e muito menos mal equilibrado, seja pela jogabilidade responsiva e intuitiva, seja pelos pontos de gravação constantes e muito bem espaçados para que nunca fiquemos desnecessariamente frustrados com algum combate ou sequência de plataformas.

gunbrella echo boomer 3

O level design também é um ponto forte devido à interligação entre as várias zonas e a possibilidade de desbloquearmos atalhos, caminhos e zonas secretas ao longo dos níveis. No que toca à ação moment-to-moment, as zonas equilibram bem as arenas de combate com os momentos de plataformas, oferecendo várias opções de mobilidade para que possamos evitar inimigos e mantermo-nos em movimento durante os confrontos – e ajudando também no backtracking. O ritmo da ação também é interessante e a doinksoft soube adicionar momentos de pausa nos locais corretos, onde podemos simplesmente apreciar o design das zonas ou descobrir mais sobre a narrativa visual do mundo de Gunbrella. A campanha abre mais a verticalidade dos níveis após a primeira hora, que é passada em túneis e esgotos, e é aí que compreendemos melhor o que a doinksoft quis fazer com o level design de Gunbrella: a mobilidade como o centro da jogabilidade.

Um jogo de ação e plataformas muito forte que se destaca pela arte, a narrativa e a implementação de uma mecânica sólida e versátil, onde sentimos constantemente a dedicação da doinksoft em criar algo repleto de personalidade e estilo. Num panorama tão sobrelotado, com tantas opções idênticas, Gunbrella tem tudo para ser intemporal.

Recomendado

Este jogo (Nintendo Switch) foi cedido para análise pela Cosmocover.

João Canelo
João Canelo
Crítico de videojogos, Guionista, Professor e o responsável pelo melhor mortal nas aulas de Educação Física em 2002. Um aficionado por jogos peculiares.
- Publicidade -

Deixa uma resposta

Introduz o teu comentário!
Introduz o teu nome

Relacionados