Uma homenagem com potencial que acaba por se perder em piadas fáceis e numa estrutura demasiado dependente da repetição.
A IntiCreate é uma máquina bem oleada. De ano para ano, a produtora japonesa, composta por ex-membros da Capcom, continua a revisitar géneros clássicos e a criar algumas das melhores sequelas espirituais para séries icónicas da história dos videojogos. De Mega Man a Azure Strike Gunvolt, de Guardian Heroes a Dragon Marked for Death, e agora de Castlevania para Grim Guardians: Demon Purge. Esta nova aposta, que chega ao PC e consolas, é um redescobrir de Castlevania, desde as suas origens como um jogo de ação e plataformas, até às suas aventuras pelos RPG e metroidvania, ainda que longe de atingir os picos da popular série da Konami.
Grim Guardians constrói-se em torno das suas heroínas, as irmãs Shinobu e Maya, duas caçadoras de monstros que se veem transportadas para um castelo amaldiçoado que absorveu a escola de ambas. Com as suas colegas desaparecidas e perdidas pelas entranhas do castelo, as irmãs têm de salvar a escola e colocar um ponto final à mestre do castelo através de vários níveis, bosses e uma estrutura híbrida no que toca ao seu progresso.
Shinobu e Maya são um dos grandes focos de Grim Guardians, ambas controladas pelos jogadores, com a jogabilidade a focar-se na combinação entre as suas habilidades. Shibonu é a nossa atiradora, munida de uma arma automática, que utiliza para atacar à distância. Já Maya é experiente no combate corpo a corpo e coloca os seus golpes poderosos à prova quando é necessário uma resposta rápida aos obstáculos. As irmãs não apresentam apenas métodos de ataque diferentes e funcionam quase como o seu oposto em combate. Shinobu é menos eficiente em combate, relegada a ataques mais fracos, mas rápidos e Maya é muito mais poderosa, ainda que apresente uma barra de energia mais curta. As duas personagens complementam-se perfeitamente em momentos de combate, mas também de exploração, com as irmãs a apresentarem também habilidades secundárias que adicionam novas opções de ataque e movimentação à medida que eliminamos os grandes vilões de Grim Guardians.
A troca entre personagens é rápida e basta carregarmos num botão (L2 ou R2 na versão PlayStation 5) para escolhermos a nossa heroína. Esta mecânica é muito importante porque Shinobu e Maya têm barras de energia individuais, o que significa que é necessário gerir ambas as personagens de formas diferentes. Se uma morrer, a outra terá a oportunidade de salvá-la, com Grim Guardians a colocar-nos no início de uma sala ou de volta ao último checkpoint para podermos ter a oportunidade de resgatar a irmã ferida. Se formos derrotados antes de salvarmos a personagem caída, perdemos uma vida e retomamos obrigatoriamente ao último checkpoint, perdendo todo o progresso conquistado. Eu aprecio o desafio, mas nunca deixei de sentir que estava apenas a perder tempo ao voltar tantas vezes atrás e a repetir as mesmas sequências apenas para salvar uma personagem. É uma escolha onde consigo compreender o que queriam fazer – dar uma segunda oportunidade aos jogadores sem lhes retirar uma vida -, mas que não aprecio enquanto jogador devido à falta de profundidade e foco na repetição até de linhas inteiras de diálogo.
Felizmente, Grim Guardians apresenta uma jogabilidade sólida e intuitiva, mantendo-se próxima aos clássicos do género com controlos simples e focados. As personagens conseguem atacar, saltar, trocar entre elas e utilizar habilidades secundárias entre elas, bem como ativar um ataque especial que combina os poder das duas irmãs. Este é o limite de Grim Guardians e ainda bem. Não são necessárias mais mecânicas e controlos modernos para criar um videojogo que procura ser, acima de tudo, clássico e assente na dificuldade e na destreza dos jogadores. O problema de Grim Guardians não é a sua simplicidade mecânica, mas sim o seu level design, com níveis mais vazios e estéreis do que deviam ser. Os sprites das personagens são detalhados e apresentam pormenores interessantes no design das criaturas, mas os cenários flutuam muito de qualidade. Alguns fundos são detalhados quando outros pouco adicionam aos corredores pouco decorados e às plataformas básicas em tons de castanho.
Esta falta de personalidade visual torna-se ainda mais problemática quando Grim Guardians espera que queiramos repetir os seus níveis em busca de segredos e das colegas desaparecidas das irmãs. Apesar de não ser propriamente um metroidvania, com a campanha a estar dividida por níveis, Grim Guardians apresenta vários caminhos alternativos que são inacessíveis sem as habilidades corretas. Entre níveis, temos a possibilidade de escolher voltar atrás, completar novamente uma das zonas e encontrar os seus caminhos alternativos para melhorarmos as nossas personagens. Quando temos um level design tão aborrecido, onde os desafios são previsíveis e a navegação é muito passiva – fora alguns desafios ocasionais, como o nível na livraria, que apresenta uma zona central com vários caminhos para explorarmos em busca de interruptores -, a repetição torna-se dolorosa até quando sabemos que existem recompensas no final. Esta foi uma lição que os metroidvanias aprenderam rapidamente e que a IntiCreate podia ter levado mais a sério.
A falta de criatividade podia ser posta de parte se não fosse pela segunda parte da campanha. Depois de derrotarmos aquela que promete ser a vilã final, Grim Guardians atira-nos de regresso ao primeiro nível. Com novos objetivos para completarmos, a campanha exige que revisitemos as zonas em busca de itens e novos inimigos, agora munidos das habilidades que conquistámos anteriormente. Se o level design já era cansativo à primeira, este torna-se ainda mais irritante à segunda e à terceira vez que somos obrigados a terminar os seus níveis – especialmente se quisermos encontrar todas as colegas desaparecidas e itens de melhoria. Poderá ser uma interpretação do cliché do castelo invertido, que Symphony of the Night utilizou para justificar a segunda metade da sua campanha, mas é uma escolha que podia muito bem ter ficado fora do jogo.
A longevidade de Grim Guardians: Demon Purge irá depender da vossa paciência, mas a campanha apresenta a duração de um jogo clássico de ação e plataformas se não voltarem a repetir os níveis. Existem motivos para voltar atrás, claro, mas os desafios não são suficientemente entusiasmantes e os níveis sofrem imenso com o design banal. Os bosses também não são pontos altos, com bons designs, mas batalhas pouco entusiasmantes que terminam rapidamente. No entanto, Grim Guardians esforça-se para agradar a todos e apresenta não só um modo cooperativo, onde cada jogador controla uma das irmãs, como três estilos de jogo que permitem aos jogadores escolher a sua dificuldade: Casual, Veteran e Legend.
Muitas opções, algumas distrações, boa jogabilidade, mas uma experiência pouco memorável. É o que podemos retirar de Grim Guardians.
Cópia para análise (versão PlayStation 5) cedida pela PQube.