DOOM: The Dark Ages – Review: Um novo sabor, para os fãs de sempre

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DOOM: The Dark Ages não reinventa o género, mas distancia-se o suficiente dos seus antecessores para deixar a sua marca na saga.

Enquanto começava a organizar ideias e pensamentos sobre o que achei de DOOM: The Dark Ages após os créditos rolarem, só me lembrava de um atual e popular meme chamado AiScReam”, também conhecido como “Ruby-chan Hai Song. Eu sei, parece uma ligação estranha e exagerada, mas não é a primeira vez que confrontamos coisas fofas com o universo de DOOM – basta recordar o fenómeno de 2020, com o lançamento simultâneo de DOOM: Eternal com Animal Crossing: New Horizons, que resultou numa adorável e inspiradora celebração coletiva na comunidade dos videojogos.

Mas voltando ao meme do AiScReam: qual é a sua relevância nesta estranha e bizarra comparação? Para isso, teremos de entrar numa breve tangente para perceber o que significa, na sua essência, esta sensação que percorre as redes sociais. Trata-se de uma música eletrónica adorável, cantada por três personagens de um anime – Ruby, Ayumu e Shiki – que, durante a canção, partilham entre si qual o seu sabor de gelado favorito. Para Ruby é chocolate com menta, para Ayumu é morango e para Shiki é bolacha com creme. Ao longo da canção, cada uma responde ainda às amigas que, na verdade, gosta mais delas, e no fim, as três, em conjunto, questionam a audiência e assumem de imediato que esta está a adorar a canção.

A versão ao vivo desta música começou a ganhar tração nas redes sociais pela apresentação alegre das três amigas em palco, protagonizadas pelas atrizes que dão a voz ao anime, com uma coreografia hipnotizante e pela forma efusiva como o público reage à canção. Existe uma certa inocência e felicidade contagiantes, e a música revela-se extremamente catchy e bem produzida, digna de montagens onde se substituem a menção dos sabores de gelado por… tudo e mais alguma coisa. Dando assim início ao seu movimento memético.

DOOM: The Dark Ages entra na conversa como um excelente candidato à adaptação deste meme, juntamente com os seus antecessores, DOOM (2016) e DOOM: Eternal, que apesar de pertencerem à mesma trilogia de revitalização da saga e de apelarem aos mesmos jogadores, a natureza de cada um – técnica, visual e mecânica – não poderiam ser mais diferentes. No fundo, são um novo sabor para os mesmos fãs, mas que encontrarão públicos bem distintos dentro da sua própria bolha.

Se tivesse de comparar os três jogos mais recentes da saga DOOM a cada um dos sabores da Ruby-chan Hai Song, fá-lo-ia da seguinte forma: DOOM (2016) seria bolacha com creme, pelo contraste da sua textura crocante, que pode representar o som constante das glory kills, com a satisfação cremosa reminiscente da fluidez linear da experiência deste reboot. DOOM: Eternal seria morango – não só pela sua cor vermelha viva, que evoca a paleta de cores desta sequela, mas também porque o morango doce pode ser fonte de energia, representando assim o frenesim e o caos de um jogo com uma jogabilidade mais caótica, energética e vertical. Por fim, DOOM: The Dark Ages seria chocolate com menta – novamente, as cores associadas ao sabor ajustam-se ao tom mais negro e sombrio desta nova aposta, sendo também um sabor mais maduro, sofisticado e, claro, fresco. Pode não agradar a todos, mas representa um contraste marcante face aos seus antecessores.

DOOM: The Dark Ages
DOOM: The Dark Ages (Bethesda/id Software)

O importante a retirar destas comparações é que não há, propriamente, um elo mais fraco, mas sim um novo elemento na saga, com identidade própria, excelentes ideias, execuções discutíveis e muitos detalhes e decisões dignos de análise. Entre os mais relevantes está claramente a jogabilidade, que se revela um dos – senão o – aspetos mais diferenciadores face aos jogos anteriores. As descrições feitas por jogadores e outros críticos fazem justiça à experiência e DOOM: The Dark Ages é, de facto, mais lento e mais pesado, mas não é, de todo, inferior ao que a série já ofereceu – é, simplesmente, diferente, e abre espaço para uma abordagem mais estratégica ao combate, até porque o jogo está claramente desenhado para esse ritmo.

Por exemplo, e ao contrário de DOOM: Eternal, que apostou numa mobilidade extrema com duplos saltos, desvios e outros movimentos que ofereciam mais verticalidade e várias opções de ataque e defesa rápida, DOOM: The Dark Ages transforma o nosso Slayer num verdadeiro tanque, capaz de levar tudo à frente. Uma sensação que se alinha com a ideia de que o Slayer é mesmo temível, com uma presença imponente e poderosa. Este Slayer é, aliás, aquilo que eu imaginava que o Master Chief de Halo seria com a sua armadura – antes da 343 Industries e do lore expandido o tornarem num autêntico acrobata.

Esta lentidão – que, diga-se, é enganadora, pois o jogo mantém um ritmo bastante acelerado – está também ajustada ao arsenal inicial, composto por uma shotgun, punhos e escudo, que incentivam confrontos corpo a corpo, onde destruímos defesas inimigas, lançamos o escudo como o Capitão América e saltamos sobre os adversários para aplicar o golpe final. Em resposta, a maioria dos inimigos não lida bem com a invasão do seu espaço pessoal, criando ondas de choque, empurrando o jogador e lançando projéteis – muitos projéteis.

Ainda que nunca atinja o nível de um verdadeiro bullet hell, como faz tão bem Returnal em ambiente 3D, DOOM: The Dark Ages inspira-se nesse género para nos manter em movimento, tanto em confrontos individuais como nos momentos de maior caos quando as arenas se enchem de inimigos. O escudo também é bem aproveitado neste aspeto, servindo como defesa contra todo o tipo de projéteis, mas brilha sobretudo por introduzir uma mecânica de parry, que permite contra-atacar agressivamente ataques especiais e projéteis destacados com um efeito verde.

O parry não é obrigatório para vencer, mas é uma ferramenta essencial para maximizar a eficácia no combate, especialmente útil para retirar grandes porções de vida aos inimigos. Como seria de esperar, esta mecânica está também presente na exploração, permitindo empurrar caixas ou partir paredes – nalguns casos, como via obrigatória para avançar.

DOOM: The Dark Ages
DOOM: The Dark Ages (Bethesda/id Software)

Tal como nos jogos anteriores, a dança entre identificar pontos fracos, estudar padrões inimigos e procurar constantemente escudo, munições e vida mantém-se intacta. Este ciclo alimenta o lado estratégico do loop, que culmina em momentos explosivos cheios de partículas verdes, azuis e amarelas a encher o ecrã.

Dentro desta nova forma de jogar, apenas desilude a escassez de animações finalizadoras (as glory kills), aparentemente reduzidas a duas variantes: uma para inimigos especiais, e outra mais dinâmica que só se ativa quando saltamos ou caímos sobre inimigos atordoados. Esta redução pode ter sido deliberada para manter a fluidez do combate, mas a limitação sente-se.

DOOM: The Dark Ages recua noutros aspetos face a DOOM: Eternal, mas no geral de forma positiva – pelo menos para mim. Quando joguei DOOM: Eternal em 2020, adorei o que o jogo tinha para oferecer, mas acabei por me sentir algo saturado, ao ponto de não ter grande vontade de o revisitar, ou de terminar as suas expansões. O mesmo não aconteceu com o DOOM de 2016, que durante muito tempo foi um jogo de conforto, daqueles em que entro, jogo um nível e simplesmente me divirto sem pensar muito no que estou a fazer. Ainda é cedo para tirar conclusões definitivas sobre DOOM: The Dark Ages, mas sinto que poderá ter esse mesmo efeito, muito graças à sua estrutura mais linear e ao design de alguns níveis mais abertos, que roçam o espírito de um metroidvania, incentivando a descoberta de segredos e colecionáveis através de atalhos e novos caminhos.

Correndo o risco de se tornar demasiado linear e estagnado, a id Software abraça os teasers do passado e aposta em elementos extremamente “metal”, coerentes com a direção artística do jogo – como mechs e dragões controláveis. Ao longo da campanha de 22 níveis, são vários o que nos colocam no controlo de máquinas gigantes e destas criaturas. Os níveis com mechs são os mais lineares, limitados em habilidades e focados em combate corpo a corpo e destruição ambiental – servem como momentos de catarse. Já os níveis com dragão, por outro lado, são mais abertos e híbridos, nos quais voamos em grandes espaços e invadimos naves para cumprir objetivos.

Estes segmentos ajudam a quebrar o ritmo da ação do jogo, mas perdem rapidamente o fator novidade e acabam, por extensão, também quebrar a fluidez narrativa, parecendo “mini-jogos” obrigatórios. A jogabilidade destes segmentos é distinta, e como há longos intervalos entre cada um, dei por mim a esquecer controlos básicos como o desvio ou ataque sempre que voltava a usá-los. Apesar de divertidos, estes níveis são demasiado simplistas e fáceis – mesmo em dificuldades mais altas -, o que é desapontante tendo em conta todo o hype criado à volta do controlo de mechs nos jogos anteriores ou ao potencial de controlar dragões, por exemplo num campo de batalha – algo que nunca aconteceu.

DOOM: The Dark Ages
DOOM: The Dark Ages (Bethesda/id Software)

Com uma filosofia de “menos é mais” – mas com espaço para crescer no pós-lançamento -, DOOM: The Dark Ages apresenta-se como um jogo direto, focado apenas na sua campanha de história, mais linear que anteriormente, sem modos adicionais nem hub entre missões. Abandona alguns elementos tradicionais e apenas possíveis num videojogo e aposta numa narrativa com direção mais cinemática, com progressão contínua e pouco espaço para escolhas. Mesmo os níveis mais abertos pouco exploram o seu potencial de sandbox. O foco narrativo está mais presente, com cinemáticas entre missões que introduzem personagens principais e secundárias, tornando este o jogo da série mais próximo de um “filme interativo”.

É uma direção interessante, mas honestamente apenas satisfatória, quase ao nível de um “Call of Duty genérico”. As cinemáticas, apesar de bem produzidas, terminam por vezes de forma anti-climática, com o Slayer a surgir noutro local sem sensação de transição real; o elenco de suporte pouco se destaca com exceção do vilão; e a história tenta ser mais séria do que o necessário ou justo, no contexto das informações que nos são dadas. É pouco emocionante, com exceção de um outro momento mais radical, e no fim, parece que estamos a ver excertos do códice materializados em clipes de vídeo. DOOM: The Dark Ages tenta explorar a mitologia da série, mas será sobretudo interessante para fãs mais dedicados, capazes de reconhecer os easter eggs e as referências escondidas um pouco por todo o lado através de narrativa visual e ambiental. Como prequela de DOOM (2016), e enquanto jogador casual, não fiquei com uma ideia clara de como se ligam as histórias, parecendo até mais uma lenda contada dentro daquele universo, do que propriamente um novo capítulo na sua cronologia.

A nível técnico e artístico, DOOM: The Dark Ages tem muito de positivo. Os visuais beneficiam do motor id Tech atualizado, com grandes avanços em iluminação via ray-tracing, mantendo leveza e otimização exemplares – crucial para um jogo onde o desempenho é tudo. Joguei num PC com uma GeForce RTX 4090 da NVIDIA, com desempenho irrepreensível, na melhor qualidade, sem sentir qualquer sacrifício em desempenho, atingindo altas taxas FPS, sem soluços, quebras ou problemas que afetam a maioria dos grandes lançamentos modernos.

Já numa máquina menos potente, como a Steam Deck OLED, consegui configurar o jogo para correr a cerca de 30 FPS com as definições mais baixas e um resultado visual satisfatório, mas não o recomendo para esta plataforma ou dispositivos semelhantes, pelo menos de forma nativa.

Estes avanços refletem-se no look geral do jogo, com ambientes bem decorados, densos e, diga-se, vivos, com ação a decorrer nas paisagens e ambientes altamente destrutíveis. As estrelas do espetáculo são os inimigos, extremamente bem detalhados e também eles destrutíveis, uma vez que reagem de forma bastante convincente aos nossos ataques, com carne a saltar por todo o lado – DOOM: The Dark Ages faz mesmo justiça à premissa de “Rip and Tear”. Os visuais do jogo também exploram muito bem esta nova direção de arte, numa mistura de fantasia medieval e sombria com sci-fi, algo que já tínhamos visto um pouco nas expansões de DOOM: Eternal. É extremamente “metal”, brutal e, por vezes, adequadamente um jogo mais escuro a nível de iluminação. Tudo isto é aplicado de forma semelhante nas cinemáticas que, apesar de não resultarem tão bem a nível de história – como já comentei – são bem realizadas e cheias de momentos que puxam pela nossa adrenalina.

DOOM: The Dark Ages
DOOM: The Dark Ages (Bethesda/id Software)

No entanto, se tivesse de fazer uma crítica mais séria e dura ao jogo inteiro, seria no departamento áudio – nomeadamente, na música. Não pela sua qualidade, mas pela forma como foi implementada no jogo. Mick Gordon não está de regresso, nem Andrew Hulshult e David Levy, que trabalharam nas expansões de DOOM: Eternal, mas isso não significa que não possamos ter boa música em DOOM. E admitidamente, o trabalho do grupo Finishing Move é espetacular: cheio de tons pesados e adequados ao tom de metal medieval do jogo, com uma sonoridade bastante distinta dos seus antecessores, ao mesmo tempo que se ouvem alguns tributos a Gordon e, surpreendentemente, aos jogos originais da saga – especialmente com algumas instrumentações inesperadas. Resumidamente, a banda sonora é fantástica. O problema é que, se antes podíamos olhar para DOOM como “uma banda sonora que tem um jogo como extra”, em DOOM: The Dark Ages questionei-me imensas vezes por onde andava a banda sonora.

Por defeito, a mistura de som é má – algo que pode ser logo observado quando se vai ao menu de opções e se encontra o volume da banda sonora bem mais baixo do que os restantes parâmetros. E, mesmo colocado no máximo, algo não funciona de forma ideal, pois os efeitos sonoros do jogo e a música não se complementam.

A banda sonora também não parece ter sido adaptada de forma ideal aos momentos recorrentes do jogo; parece pouco dinâmica e pouco responsiva às ações do jogador e aos combates apresentados. Definitivamente, não é tão “viva” como em jogos passados, onde as sequências de ação pareciam musicais de ação. Em DOOM: The Dark Ages, as músicas entram e saem de forma abrupta e, por muito boas que sejam, é fácil identificar loops melódicos a tocar repetidamente durante a extensão dos combates. Definitivamente não abanei o capacete a jogar DOOM: The Dark Ages.

Ao longo do jogo também me deparei com momentos em que simplesmente não havia música – e, devido à forma como o jogo a injeta, questionei-me se teria sido uma decisão consciente, se foi algo que passou despercebido pela produção ou se era simplesmente um bug do jogo. E é pena que a música de DOOM: The Dark Ages não tenha a presença devida. Não só é um desserviço à equipa da Finishing Move, como também faz com que o jogo perca alguma da sua prometida essência.

Apesar dos meus breves queixumes, DOOM: The Dark Ages é uma entrada sólida e marcante na série, com identidade própria e elementos únicos que lhe conferem um lugar especial dentro da saga. A ausência de algumas peças fundamentais – como a força sonora que sempre definiu a experiência – não impede que se destaque pelo design, pelo combate brutal e pela ambição artística. Talvez não atinja o mesmo impacto que os títulos anteriores, numa altura em que a série já perdeu o efeito de surpresa do seu reboot em 2016, mas é inegável que traz um novo sabor ao legado de DOOM, e que será certamente lembrado por isso. Resta agora saber que sabor é esse e quão popular será no futuro – certamente terá uma validade maior na nossa memória do que um meme viral nas redes sociais.

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Cópia para análise (PC) cedida pela Bethesda.

David Fialho
David Fialhohttps://echoboomer.pt/
Licenciado em Comunicação e Multimédia, considero-me um apaixonado por tecnologias e novas formas de entretenimento. Sou editor de tecnologia e entretenimento no Echo Boomer, com um foco especial na área dos videojogos.
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