Crítica – “The Florida Project” – A vida é como ela é

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A primeira coisa a dizer sobre The Florida Project é que é difícil não nos apaixonarmos por Brooklynn Prince, que brilhantemente dá vida à Moonee, uma menina esperta de 6 anos. A segunda informação importante é que não se trata de uma história leve, daquelas que fazem toda a gente sair do cinema a sentir-se bem. Pelo contrário, a longa-metragem do americano Sean Baker é do tipo que causa desconforto por ser tão próxima da vida como ela é. E nem sempre é doce.

Moonie vive com a mãe Halley (Bria Vinaite) num hotel barato à beira de estrada a caminho da Disney World. Enquanto crianças do mundo inteiro passam por lá para realizar um sonho, a menina faz da zona o seu próprio parque de diversões. As duas estão à margem do reino da fantasia americana, mas não só. Também estão à parte da sociedade. Halley perdeu o emprego como stripper e passa os seus dias ora a drogar-se, ora à procura de uma maneira de ganhar o dinheiro para pagar a renda da semana. Não tem a mínima perspetiva de sair da pobreza. Mãe, filha e vizinhos são americanos que pouco se veem no grande ecrã.

Um universo, contudo, que parece interessar muito a Sean Baker. No seu filme anterior, Tangerine, o realizador contou a história de uma prostituta transsexual que circula por Los Angeles atrás do namorado que a traiu. Tanto nesta longa-metragem como em The Florida Project, estão lá outsiders de sítios icónicos dos Estados Unidos, as cores berrantes nas imagens, décors reais e pessoas de verdade, a interagir com personagens que os representam. Em ambas, Baker utiliza enquadramentos que remetem a documentários, sendo que “Tangerine” foi filmado inteiramente com iPhone e o novo filme em 35 mm.

Outro mérito dos dois trabalhos são as atuações. A estreante Bria Vinaite, descoberta por Sean Baker no Instagram, transmite todas as nuances da rebelde Halley, que vai desde a agressividade e a falta de respeito pelas pessoas até à ternura com a filha. No comando do hotel e do elenco está Willem Dafoe. O gerente Bobby é o responsável não só pela ordem no sítio como pela dignidade dos seus hóspedes. É o zelo de pai que tem tanto com os adultos desnorteados quanto pelas crianças sem controlo que dá humanidade aos personagens. Impecável no papel – como é habitual – Dafoe é tido como favorito para Óscar de Melhor Ator Secundário.

O que Bobby e Sean Baker têm em comum é que não tratam crianças como miniadultos, o que resultaria num guião chato e pouco credível. Embora este seja um mundo em que meninos e meninas de 6 anos atravessam estradas, brincam em prédios abandonados e passam dias inteiros sem a supervisão de um adulto, Moonee e os seus amigos são crianças de verdade. Líder da malta, a jovem adora brincar, correr, pregar partidas, gritar e tem uma imensa facilidade de transformar tudo à sua volta em objeto de diversão. Muito inteligente, replica os (maus) modos da mãe. Exatamente como fazem todas as crianças.

The Florida Project pode dececionar quem crê que o cinema tem a obrigação de dar lições de vida e receitas de como as pessoas podem tornar-se melhores. Mas ao apresentar um ponto de vista sem julgamentos e sem o objetivo de fazer dos seus personagens heróis de superação, Sean Baker dá voz a pessoas que raramente contam com tal espaço. Ao mesmo tempo, fortalece a sua própria voz como realizador.

Uma das marcas dessa personalidade está na cena final do filme. É delicioso saber que a sequência foi filmada com um iPhone porque Baker não tinha autorização para captar imagens no sítio escolhido. Uma travessura bem ao estilo de Moonee, para encerrar a sua história. Muito coerente.

The Florida Project estreia nos cinemas nacionais a 15 de fevereiro.

Texto de: Hérica Marmo

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Sou o "bot" de serviço do Echo Boomer e dedico-me ao conteúdo mais generalista e artigos de convidados, bem como de autores que não colaboram regularmente com o projeto.
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