M3GAN não reinventa o subgénero respetivo de robots assassinos ou de AI que se vira contra os humanos, mas manteve-me entretido e investido o tempo todo.
Novo ano, novos filmes de horror em janeiro. “Reza a lenda” que o infame mês é apelidado de “caixote do lixo” dos estúdios de Hollywood, onde as obras que mais se arrependem de criarem são lançadas na esperança de que ninguém fale muito sobre as mesmas. Uma verdade mais acertada é que o primeiro mês de cada ano raramente entrega um filme com tal nível de excelência que, no fim do mesmo ano, continua a ser mencionado por espetadores e críticos pelo mundo fora. O género de horror é, sem dúvida, o que costuma sofrer mais nesta altura, mas a verdade é que, ocasionalmente, surgem algumas boas surpresas. Felizmente, M3GAN é uma delas.
A premissa é bastante simples e não foge às dezenas de fórmulas do subgénero “boneca assassina / AI consciente”. Não possui uma narrativa de deixar o público de queixo caído ou a coçar a cabeça. Não contém visuais assoberbantes e o seu tão debatido rating PG-13 limita os supostos momentos de maior choque. Os próprios temas e arcos de personagem seguem caminhos previsíveis e conclusões vistas e revistas em muitos outros filmes. Levanta-se a grande questão: porque está M3GAN a ser recebido de forma tão incrivelmente positiva pela vasta maioria de críticos e audiências?
Pessoalmente, encontro três razões principais. Primeiro, o argumento de Akela Cooper possui uma camada satírica bem-humorada e inteligente, criando um ambiente extremamente relacionável com mensagens importantes sobre a educação e o impacto da tecnologia na mudança cultural e geracional, seja na vida de adultos, jovens ou crianças, pais ou filhos. Segundo, apesar da falta do fator surpresa, o realizador Gerard Johnstone agarra nos clichés e nos pontos genéricos do enredo e executa tudo com uma eficiência tremenda, nunca forçando uma sequência de horror ou uma cena mais intimista “só porque sim”.
Finalmente, M3GAN oferece uma experiência de sala repleta do mais puro entretenimento. Peter McCaffrey, diretor de fotografia, não tem receio de aproveitar a luz do dia ou interiores bem iluminados, fugindo ao típico problema em obras deste estilo que se tornam obcecadas por jumpscares inúteis no escuro e uma câmara irrequieta. A montagem de Jeff McEvoy é igualmente essencial ao não cortar nem demasiado cedo nem demasiado tarde nas cenas visualmente mais intensas e sangrentas – a versão rated-R será uma loucura – mas é a banda sonora de Anthony Willis e a escolha espirituosa de determinadas músicas que se destaca do lado técnico.
Allison Williams regressa ao cinema passados três anos e ainda bem. Depois do notável Get Out e do subvalorizado The Perfection, a atriz volta a entregar uma prestação cativante, carregando algumas fases do tempo de execução aos ombros, apesar de ser complicado criar uma conexão com a sua personagem, Gemma. M3GAN não consegue colocar a protagonista ao mesmo nível de perceção que os espetadores, provocando alguns revirares de olhos devido à incapacidade propositada das personagens em não se aperceberem de algo bem evidente até ser tarde demais.
Independentemente disso, o elenco esforça-se e há que dar mérito às artistas mais jovens. Violet McGraw (11 anos) consegue surpreender e acrescentar mais emoção do que se esperava ao argumento. No entanto, são Amie Donald (12) e Jenna Davis (18) que sobressaem devido à representação física e vocal da robot M3GAN, respetivamente. Olhares, movimentos e gestos robóticos, assim como pequenas falhas na voz, todos os pormenores contam para gerar uma atmosfera gradualmente mais creepy e, nas alturas certas, bem divertida. O balanço tonal encontra-se impecável.
M3GAN não reinventa o subgénero respetivo de robots assassinos ou AI que se vira contra os humanos, mas manteve-me entretido e investido durante todo o seu tempo de execução. A premissa é levada ao limite – e até para lá disso – sendo elevada por excelentes prestações, um argumento satírico inteligente, mortes de fazer levantar as sobrancelhas e mensagens essenciais sobre educação familiar e o papel da tecnologia na mesma. Não se leva demasiado a sério nem tenta ser mais daquilo que realmente é.
Longe de ser uma obra-prima, mas quem nos dera que todos os filmes de horror de janeiro fossem assim…