O Jameson Urban Routes tem-se tornado, ao longo dos anos, um dos esteios mais firmes da programação outonal da movida musical em Lisboa, conseguindo trazer regularmente artistas com créditos firmados a preços democráticos, bem como novos nomes a explorar.
Para abrir a saison de 2019, grupo de boa memória, mas que cuja história recente é desconhecida de muitos: Battles. O épico concerto em 2011 em Paredes de Coura – edição de tão boa memória – foi marcante e continua presente na nossa cabeça, mas os passos mais recentes do que é hoje um duo, constituído por John Stanier e Ian Williams, nem tanto. Desde logo, pelo mistério de qual o impacto da saída de Tyondai Braxton e, acima de tudo, de Dave Konopka, antigo responsável pela guitarra e baixo.
E é concerto marcante, este, com o seu quê de história. Na verdade, o primeiro ao vivo desde que saiu o novíssimo Juice B Crypts, com data de nascimento a 18 de outubro, apenas quatro dias antes do concerto no Musicbox. Nome grande, nada de primeira parte, hora convidativa: 21h30. Na verdade, houve atraso de 15 minutos, ainda bem dentro da boa educação, quando a há muito esgotada sala dos arcos do Cais do Sodré recebeu os norte-americanos.
Com o disco saído do prelo há poucos dias a mostrar uma tendência para o sample maior do que era o estilo mais clássico dos Battles, compreensível até pelo emagrecimento do elenco, depressa se percebeu que não seria por isso que existiria uma quebra de forma na intensidade da atuação ao vivo dos titulares atuais.
“Loops So Nice” mostrou logo que estes meninos, apesar de já confortavelmente instalados na faixa etária dos 45-54, vieram aqui para dar o litro.
Stanier, homem que já trabalhou nos Tomahawk de Mike Patton, continua com o seu prato bem alto na bateria e a fúria controlada no estilo, mas Williams, agora trocando teclas e guitarra ao invés dos dois keyboards com que deu show no habitat natural da música, planam acima de tudo e continuam a garantir uma assinatura bem distintiva ao grupo.
A apresentar-se no seu melhor estilo de imitador de Rui Veloso na sua fase Ar de Rock, blusão de ganga e ar franzino incluído, enche a sala sem dificuldades nenhumas, fazendo depressa esquecer que antigamente eram mais muchachos. A verdade é que sabem muito, e o som bem misturado garante que mesmo ao fundo da sala, enquanto se pede a bebida de oferta gentilmente oferecida pelos senhores irlandeses, a coisa se ouça bem e alto. Muito alto, aliás.
A meio a célebre “Ice Cream”, colaboração com Matias Aguayo e êxito de Gloss Drop, álbum de maior exposição, foi momento de festa e momento raro de vocais numa hora e pouco em que o nível de entusiasmo nunca desceu muito, com os efeitos de luzes a certa altura a fazer lembrar um chuva púrpura virtual em cima dos nova-iorquinos.
Homenagem a Prince ou nem por isso, o facto é que o efeito cénico resultou bem, destacando os rostos e mãos tão trabalhadores de Staner e Williams. De relação esporádica mas feliz com o povo – estavam aqui para tocar e não para engonhar – a certa altura dizem que é a primeira que tocam em Lisboa. Pouco depois alguém chama a atenção que já tocaram no Super Bock Super Rock, mas Williams responde que, na verdade, isso não tinha sido mesmo em Lisboa.
É verdade – essa edição foi no Meco, nos idos de 2012 – e tem graça, pelo representativo do rigor bem disposto que bem o rigor dos Battles nesta seu momento mais eletrónico, sem no entanto esquecer as harmonias e progressões nas guitarras.
“Ambulance”, belo exemplo deste trabalho mais recente com a sua mistura de som de consola com baixos fortes a progredir constantemente, ajuda a fechar a celebração sempre com volume bem alto. Os Battles estão vivos e em boa forma, e continuam a ter uma impressão digital que é genuinamente só deles. Bela forma para dar início ao Jameson Urban Routes.
Fotos de: Carlos Mendes
